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Paola Machado

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Álcool, cafeína, ultraprocessados: os alimentos que pioram seu estresse

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Imagem: iStock

Colunista do VivaBem

24/06/2021 04h00

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Você acordou, treinou (ou não), tomou seu café da manhã, trabalhou, almoçou direitinho, voltou para o trabalho, bateu o ponto e foi embora. Até o horário de saída conseguiu cumprir minimamente uma rotina, mas quando chegou em casa, abriu a geladeira e nem sabe o que comeu. Ou, durante o estresse do seu trabalho, nem notou comer bolo e chocolate? Por que isso acontece?

Estamos vivendo uma fase totalmente diferente em que nossos níveis de estresse aumentaram absurdamente. Para vocês terem uma ideia, de acordo com o Conselho Federal de Farmácias, em 2020, cerca de 100 milhões de caixas de medicamentos controlados foram vendidos em todo o ano de 2020 (um aumento de 17% comparado a 2019). De acordo com o IQVIA (Quintiles and IMS Health), no Rio de Janeiro e Espírito Santo, no mês de maio de 2020 os ansiolíticos tiveram alta de 15% e os medicamentos contra insônia, 40%.

Já descrevi aqui que estratégias como dormir bem, realizar exercícios, evitar pensamentos estressantes, relaxar e até se alimentar bem são pontos cruciais para controlar o cortisol ("hormônio do estresse"). Mas como, se agora todos esses pontos estão desajustados na vida de muitas pessoas pelo mundo todo?

Relembrando: qual a ação do estresse sobre seu corpo

Você pode não perceber em princípio, mas o estresse pode ter um efeito perceptível em seu corpo. Já notou que quando fica nervoso a cabeça dói, os músculos ficam mais tensos, você pode ficar mais irritado e até descontrolado? O estresse afeta a sua saúde física e emocional.

Em muitos casos, você sentirá os efeitos do estresse imediatamente, mas existem outras maneiras pelas quais seu corpo responde ao estresse, como com o ganho de peso. Uma das respostas do organismo ao estresse é o aumento dos níveis de cortisol, hormônio que —junto com a adrenalina— prepara o corpo para reações de "luta ou fuga".

O cortisol é liberado pelas glândulas suprarrenais. Sua produção aumenta em resposta a situações de alerta e, ao cessar o momento de tensão, os níveis de cortisol retornam ao normal. Mas, se o estresse estiver sempre presente no organismo em nível elevado —que é o que acontece com uma grande parte de pessoas que vivem nervosas e estressadas o dia todo no trabalho, por exemplo—, pode acontecer uma superexposição ao cortisol. Daí você me diz? "Como certinho o dia inteiro, mas quando chego em casa quero atacar a geladeira". Essa é uma típica ação do resultado da superexposição ao cortisol.

Um estudo publicado em 2015 mostrou que nosso corpo metaboliza mais lentamente sob ação do estresse. O estudo descobriu que mulheres que relataram um ou mais estressores durante as 24 horas anteriores queimaram 104 calorias a menos do que as mulheres "não estressadas". Para chegar a esse valor, os pesquisadores entrevistaram as mulheres sobre eventos estressantes antes de lhes dar uma refeição rica em gordura. Depois de terminar a refeição, as mulheres usavam máscaras que mediam seu metabolismo, calculando o fluxo de ar inalado e expirado de oxigênio e dióxido de carbono, respectivamente (calorimetria).

O estudo não apenas demonstrou uma desaceleração no metabolismo, mas os resultados também mostraram que mulheres estressadas tinham níveis mais altos de insulina —hormônio que incentiva o estoque de gordura corporal. Os pesquisadores concluíram, então, que as 104 calorias a menos queimadas poderiam adicionar quase 5 kg por ano.

O papel da alimentação no seu estresse

Pesquisas sugerem que o que comemos tem o poder de acalmar ou alimentar ainda mais o seu estresse. A ideia tem suas raízes na psiquiatria nutricional e nutrição comportamental, um campo que examina o papel da dieta na saúde mental e no bem-estar.

O alimento que ingerimos é transformado em "blocos" de construção de proteínas, enzimas, neurônios e neurotransmissores que transferem informações e sinais ao redor de nosso corpo. Nesse sentido, somos o que comemos, e nossos padrões dietéticos influenciam o funcionamento de nosso cérebro e corpo.

Uma pesquisa publicada pelo BMC Medicine mostra a conexão entre comida e humor, em que a alimentação saudável pode reduzir significativamente os sintomas de depressão em pessoas clinicamente deprimidas. Obviamente, a comida tem o poder de afetar a forma como nos sentimos e, se certos alimentos podem nos fazer sentir melhor, então alguns alimentos podem ter o efeito oposto.

Por exemplo, a ingestão de açúcar é um dos gatilhos clássicos para a liberação de cortisol. Assim, o consumo de açúcar está especialmente ligado a maior quantidade de cortisol em indivíduos obesos. Em contraste, o açúcar também pode reduzir a quantidade de cortisol liberado em resposta a eventos estressantes específicos, quando em conjunto com outros alimentos —esses efeitos explicam por que sobremesas doces causam sensação de conforto, porém a ingestão constante ou excessiva de açúcar aumenta o cortisol ao longo do tempo.

Além disso, alguns alimentos específicos podem ajudar a controlar os níveis de cortisol, como chocolate amargo, frutas variadas, chá preto ou verde, probióticos e prebióticos, além de manter-se bem hidratado (com água).

Alimentos que pioram o seu estresse

Alimentos ultraprocessados Não é novidade que esse tipo de alimentação traz malefícios para o nosso organismo. É muito comum quando estamos ansiosos, com medo ou estressado por qualquer razão, ingerirmos, sem perceber, uma grande quantidade de alimentos calóricos e longe de serem saudáveis. Estudos mostram que há uma ligação entre esses alimentos e a problemas psiquiátricos e de saúde mental, isto é, pessoas que ingerem maiores quantidades de alimentos pró-inflamatórios ultraprocessados têm um risco 23% maior de desenvolver depressão em comparação com as pessoas que comem menores quantidades de alimentos pró-inflamatórios. Além disso, esses alimentos são associados a níveis mais elevados de um potente biomarcador inflamatório (proteína C reativa ou PCR), que tende a estar elevada em pessoas com diagnóstico de depressão clínica.

Cafeína Você com certeza conhece alguém do seu trabalho que faz várias pausas para um cafezinho no momento de estresse, não é mesmo? O café de fato é uma delícia (eu amo!), mas é necessário prestar bem atenção na quantidade. A cafeína é estruturalmente semelhante à adenosina, um composto que se acumula no corpo ao longo do dia. Quando ingerimos cafeína, ela se liga aos receptores de adenosina em nosso cérebro e bloqueia seus efeitos, permitindo que a dopamina flua, trazendo uma sensação de intenso estado de alerta. Para algumas pessoas, isso pode se manifestar como nervosismo, irritabilidade e desconforto gástrico. Para pessoas com tendência a ataques de pânico, os efeitos da cafeína são ainda mais sérios, pois o estimulante pode causar frequência cardíaca elevada, pressão alta, insônia e ansiedade elevada. Embora a tolerância à cafeína seja altamente individual, é necessário manter sua ingestão sob controle para um humor estável (cerca de duas xícaras por dia). Se o estresse ou a ansiedade de alguém aparecer como um distúrbio gastrointestinal, reduza significativamente bebidas com cafeína.

Álcool "Estou estressado, vou beber um pouco para relaxar!" Quem nunca? Afinal, o álcool atua como um depressor do sistema nervoso central, o que significa que retarda a atividade cerebral. É fato que (em maiores de 18 e com moderação) uma bebida pode acalmar por um momento, mas é um efeito totalmente passageiro e que, na verdade, intensifica seu estresse ao longo do tempo.

Estudos em animais mostraram que roedores forçados a um estado de abstinência do álcool mostravam maiores níveis de estresse e ansiedade em comparação com os outros que continuam bebendo. Depender do álcool em momentos de estresse também pode atrapalhar o seu metabolismo, já que o álcool é uma toxina para seu organismo e, quando consumido, torna-se a principal prioridade do corpo metabolizá-lo e excretá-lo. Essencialmente, o corpo interrompe a digestão de outras substâncias e, em vez disso, se concentra em tirar o álcool do sistema, criando uma sobrecarga de trabalho para o fígado.

Por isso, opte por alimentos saudáveis, como:

  • Fontes de gorduras "boas" Os ácidos graxos poliinsaturados, ou PUFAs, desempenham papel anti-inflamatório, atuam na sinalização dos neurotransmissores e no desenvolvimento e função do cérebro. Os PUFAs incluem aqueles ácidos graxos ômega-3 essenciais sobre os quais ouvimos falar com frequência. Um tipo, chamado ácido alfa-linolênico, ou ALA, pode ser encontrado em alimentos como nozes, semente de linhaça, EPA e DHA (encontrados em frutos do mar como salmão, camarão, tilápia, atum etc).
  • Alimentos prebióticos As bactérias do intestino auxiliam na produção de neurotransmissores reguladores do humor, como a serotonina e a dopamina. Os prebióticos são fibras não digeríveis que fornecem combustível para as bactérias benéficas no intestino, trazendo benefícios à saúde intestinal e, por extensão, um possível aumento do humor. Dentre esses alimentos estão a cebola, alho, aveia, banana, maçã, alho-poró.
  • Vegetais Ingerir mais do que as cinco porções diárias de frutas, legumes e verduras está associado a maior satisfação com a vida e diminuição dos sintomas depressivos. Para se ter uma ideia, apenas uma porção extra de frutas e verduras por dia pode levar a melhorias no bem-estar mental. Verduras como couve, rúcula, espinafre e mostarda são fontes poderosas de folato, que ajuda a auxiliar na produção de dopamina; frutas verdes como abacate (ricas em potássio, vitamina B6 e vitamina E, que atua como antioxidante e ajuda a combater a inflamação) também podem ser superalimentos que melhoram o estresse.

Referências:

- Referências complementares no texto "Como reduzir naturalmente o cortisol". Disponível em: https://paolamachado.blogosfera.uol.com.br/2019/12/04/como-reduzir-naturalmente-seu-cortisol-o-hormonio-do-estresse/

- G??bska D, Guzek D, Groele B, Gutkowska K. Fruit and Vegetable Intake and Mental Health in Adults: A Systematic Review. Nutrients. 2020;12(1):115. Published 2020 Jan 1. doi:10.3390/nu12010115

- Parletta N, Zarnowiecki D, Cho J, Wilson A, Bogomolova S, Villani A, Itsiopoulos C, Niyonsenga T, Blunden S, Meyer B, Segal L, Baune BT, O'Dea K. A Mediterranean-style dietary intervention supplemented with fish oil improves diet quality and mental health in people with depression: A randomized controlled trial (HELFIMED). Nutr Neurosci. 2019 Jul;22(7):474-487. doi: 10.1080/1028415X.2017.1411320. Epub 2017 Dec 7. PMID: 29215971.

- Jacka FN, O'Neil A, Opie R, et al. A randomised controlled trial of dietary improvement for adults with major depression (the 'SMILES' trial) [published correction appears in BMC Med. 2018 Dec 28;16(1):236]. BMC Med. 2017;15(1):23. Published 2017 Jan 30. doi:10.1186/s12916-017-0791-y

- Wang J, Zhou Y, Chen K, Jing Y, He J, Sun H, Hu X. Dietary inflammatory index and depression: a meta-analysis. Public Health Nutr. 2018 Oct 15:1-7. doi: 10.1017/S1368980018002628. Epub ahead of print. PMID: 30319085.

- van Calker, D., Biber, K., Domschke, K. and Serchov, T. (2019), The role of adenosine receptors in mood and anxiety disorders. J. Neurochem., 151: 11-27. https://doi.org/10.1111/jnc.14841

- Santos VA, Hoirisch-Clapauch S, Nardi AE, Freire RC. Panic Disorder and Chronic Caffeine Use: A Case-control Study. Clin Pract Epidemiol Ment Health. 2019;15:120-125. Published 2019 Sep 30. doi:10.2174/1745017901915010120

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- NIH. Omega-3 Fatty Acids. Disponível em: https://ods.od.nih.gov/factsheets/Omega3FattyAcids-Consumer/