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Jairo Bouer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Encontros amorosos: que tal abrir o jogo e dizer logo o que você quer?

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Imagem: iStock

Colunista do VivaBem

25/02/2022 04h00

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Cada vez mais gente conhece novos parceiros pelos aplicativos e pelas redes sociais e, como consequência, frustrações e decepções têm se tornado mais frequentes. Não seria melhor ser objetivo logo de cara e esclarecer o que cada um espera do encontro?

A tendência de abrir logo o jogo, algumas vezes até mesmo antes de conhecer o outro pessoalmente, tem sido chamada lá fora de hardballing (algo como "jogar pesado"). O termo foca em uma abordagem mais direta e realista sobre os encontros amorosos.

Uma matéria da BBC discutiu o tema e trouxe depoimentos de pessoas que têm enfrentado mais dificuldade em construir relacionamentos nos tempos atuais.

A Geração Z, a primeira que nasceu em um ambiente completamente digital, entre o final da década de 1990 e 2010, tem sido a mais impactada por esse cenário, já que para esses jovens conhecer alguém pelos aplicativos e redes sociais é tão usual quanto o primeiro encontro rolar em uma festa ou no olho no olho das ruas.

O que esperar de um encontro?

É claro que quem entra em um aplicativo ou site de relacionamento quer conhecer alguém, mas o que a pessoa espera desse encontro? Só alguém para conversar e matar o tempo? Sexo casual? Checar a "química" e decidir depois? Um relacionamento amoroso? Como as expectativas iniciais dos dois podem não "casar", abre-se espaço para decepções, raiva e tristeza, entre outros sentimentos.

A proposta do hardballing seria ir direto ao ponto e esclarecer as intenções logo de cara. Quem quer seguir em frente, mesmo sabendo que as pretensões do outro não são as mesmas que as suas, encara essa realidade. Quem não se sente à vontade com os objetivos díspares, simplesmente avisa o outro que não vai rolar. Simples assim? Mais ou menos

Em primeiro lugar, nem sempre a gente sabe logo de cara o que esperar de um encontro. Além de que as impressões e intenções podem mudar depois que a gente conhece, de fato, o outro. Quem nunca imaginou uma princesa ou príncipe encantado e deu de cara com um sapo? Ou vice-versa?

A dinâmica das descobertas

As pessoas, para o bem e para o mal, podem nos surpreender e essas novas descobertas acrescentam camadas interessantes de imprevisibilidade e de complexidade aos relacionamentos humanos, que já não são tão simples assim. Tudo isso dá sempre um sabor especial aos novos encontros. Será que tem como a gente prever o que vai acontecer de antemão? Não estaríamos colocando a carroça na frente dos bois ao tentar definir objetivos antes mesmo de poder enxergar quem é o outro?

Outro fantasma dos encontros que nascem no mundo virtual é o ghosting, que é o desaparecimento após um encontro sexual ou amoroso, inclusive com direito a exclusões e bloqueios sumários nas redes sociais. Enquanto um espera que a relação siga adiante, o outro simplesmente some do mapa, gerando mágoa e frustação em quem acreditava em um futuro a dois. Será que ser direto e objetivo reduziria o risco desses sumiços e da consequente decepção?

Se, de um lado, o hardballing pode, em teoria, reduzir o risco de frustrações e mágoas, alinhando expectativas iniciais, do outro ângulo, ele pode engessar sonhos e desejos e tornar os encontros mais superficiais, quase anestesiando as emoções e expectativas dos envolvidos, o que no longo prazo também pode ser frustrante. É como se a pessoa passasse a viver uma espécie de defesa antecipada para tentar não sofrer, como se isso fosse possível.

Não existe relação sem risco

Todo relacionamento (novo ou antigo) envolve algum grau de risco. As pessoas mudam o tempo todo, o que pode impactar a vida a dois. A intimidade, a experiência, a empatia e a maturidade nos auxiliam a promover ajustes que podem ser necessários para facilitar a convivência e alinhar as expectativas, de forma sempre dinâmica.

Quando a gente mal conhece o outro é mais complicado calcular esses riscos e aprender a gerenciar expectativas. Mas "cancelar" as chances logo de cara com medo de que as coisas podem não dar certo, ou ainda, tentar calcular cada passo de um encontro para evitar sofrimento pode não ser a melhor solução.

Ainda aposto na experiência, na coragem de mergulhar de cabeça (quando há espaço, claro), na descoberta do outro e no diálogo para poder viver um grande encontro. E um encontro fantástico (com afeto, prazer, intensidade) pode durar apenas o tempo dele mesmo. Se ele se transformar em uma relação, desde que os dois estejam a fim, ótimo! Se for único e isolado, tudo bem também.

E se o final de qualquer forma de encontro envolver algum grau de sofrimento, paciência. É dessa forma, também, que a gente amadurece. Agora tentar evitar em 100% os riscos de uma decepção e viver na sucessão de encontros esvaziados de expectativas e de afetos me parece limitante do ponto de vista das experiências emocionais. Se hardballing focar em diálogo e respeito mútuo, acho bacana. Se for apenas uma anestesia geral, eu evitaria. O que você pensa a esse respeito?