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Famílias contam como mantêm a harmonia em um lar cheio de gente

Carmen Júlia Almansa, o marido José Carlos, as duas filhas e os cinco netos vivem juntos em São Paulo - Arquivo Pessoal
Carmen Júlia Almansa, o marido José Carlos, as duas filhas e os cinco netos vivem juntos em São Paulo Imagem: Arquivo Pessoal

Thais Carvalho Diniz

Do UOL, em São Paulo

29/11/2013 15h59

Mesmo unida por laços de sangue ou amor, a família nem sempre é um grupo de fácil convivência. Ainda mais quando seus membros moram sob o mesmo teto, na mesma comunidade e seguem as mesmas regras. Isso porque, apesar de tudo que une os parentes, cada ser humano tem suas particularidades.

Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados nesta sexta-feira (29), há cada vez mais jovens de 25 a 34 anos, a chamada "geração canguru", morando com os pais. Em dez anos, houve aumento de quase 4% --de 20,5% para 24,3% entre 2002 e 2012.

E quando falamos de uma família de seis, nove ou onze pessoas morando juntas? É possível conviver em harmonia? "Sim, mas muitas regras são necessárias para uma grande família funcionar. Mesmo que alguns integrantes já sejam independentes, tudo tem de ser conversado e negociado previamente para evitar os pequenos conflitos", afirma Marina Vasconcellos, psicóloga, psicodramatista e terapeuta familiar pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

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No bairro do Ipiranga, na Zona Sul de São Paulo, Carmen Júlia Almansa, 64, mora com o marido, José Carlos, 65; as filhas, Mariah, 36, e Nara, 35. Também vivem na casa os cinco netos de Carmen e José, que têm idades entre três e 17 anos. No total, são nove pessoas que dividem uma casa com três quartos e três banheiros.

Carmen e seu marido ocupam um dormitório. As filhas dormem em um quarto cada uma, espaço que dividem com suas respectivas crianças. Cada um desses pequenos núcleos têm um banheiro para compartilhar.

Para a aposentada, a fórmula para tudo funcionar como em uma engrenagem é existir um eixo central, um ponto de referência para todos. Essa figura é representada por ela mesma.

"As explosões em momentos de ira estragam os relacionamentos. Carinho, respeito e intenção de estar junto são fundamentais. Aqui, eu sou esse eixo. Sempre apazíguo e dou carinho a todos. Os problemas sempre vão existir, e é necessário, para viver em família, saber que, às vezes, é preciso se calar e abrir mão de algumas coisas em benefício do outro", afirma.


Divisão de tarefas

Para Miriam Barros, psicoterapeuta pela PUC-SP, quando se trata de família muito numerosa, a divisão de tarefas é imprescindível. "A tarefa deve ser proporcional à idade das pessoas, mas flexível, para que até os mais ocupados possam participar", diz.. "Quando há uma divisão, todos os membros da família terão suas responsabilidades na manutenção da casa e ficará mais fácil reconhecer o que cada um faz de bom", explica.

No lar de Carmen é assim que acontece e, tirando as funções gerais, cada um cuida das suas próprias coisas. "As tarefas são divididas. Como eu já estou aposentada e a Nara trabalha em casa, nós duas cuidamos dos afazeres domésticos. Enquanto isso, meu marido, que também é aposentado, é ‘o babá’ do João Marcos [neto mais novo]", conta.

De acordo a filha mais velha, Mariah, a família é considerada um exemplo pelos amigos. "Todos sempre falam sobre a nossa união, amor e a convivência que conseguimos estabelecer. A nossa casa é sempre muito movimentada, e minha mãe ama que tenhamos essas raízes. Eu me sinto feliz com essa ‘bagunça’, e não fico constrangida de estar aqui ainda, pois estou porque quero e amo estar aqui.  Sempre vivemos todos juntos e resolvemos os problemas juntos. Isso é família", afirma.

Três casas, um quintal

A união matrimonial de José Medeiros, 45, e Alice Reis, 44, durou cerca de 23 anos. Eles têm cinco filhos: Estefani, 26; Cauê, 24; Matheus, 18; Marjorie, 16 e Nicholas, 14. Há três anos o casal está divorciado, mas, apesar de morarem em casas separadas, dividem o mesmo quintal, pois o terreno reúne três casas. Em uma delas, Alice mora com os filhos. José vive em outra com a mãe Joana, 76; a irmã Eliane, 38, e o sobrinho Pedro, 3. Já a tia dele, Judite, 76, habita a terceira moradia. 

Para que a relação entre ex-casais dê certo, ainda mais morando no mesmo quintal e com mais gente envolvida, é preciso que existam limites e ainda mais regras. "O maior segredo é sempre o respeito pelo espaço do outro e, claro, o bom senso tem que estar presente em toda e qualquer negociação de espaço, que continua sendo familiar, apesar da separação do casal", afirma Marina Vasconcellos.

Segundo Alice, a condição que deveria ser provisória após o divórcio foi se estendendo e, diante disso, ela e o ex-marido foram se adaptando e adotaram a paciência e o respeito como maiores aliados para resolverem os problemas.

"Eu me dou muito bem com todo mundo. Existem os conflitos e logo quando nos separamos eu ficava muito nervosa com essa proximidade toda, mas não conseguimos ficar sem nos falar por muito tempo. Ajudamos um com o outro, inclusive quando se trata da educação dos nossos filhos", conta.

Mesmo que para os filhos a harmonia dos pais após a separação seja de vital importância, Marina Vasconcellos afirma que essa condição de morar no mesmo quintal alguém pode alimentar a esperança de que um dia o casal retome a relação. Por isso, é preciso agir com franqueza.

"Ter os pais tão próximos um do outro desperta nos filhos o desejo de que eles voltem. É fundamental deixar claro que a nova condição é definitiva, até para o amadurecimento emocional e para o caso de uma nova pessoa surgir na vida de um dos dois", explica.

Para José, o maior segredo para viverem em harmonia é o carinho que um tem pelo outro e a vontade de estar junto. "Quando você gosta de verdade daquelas pessoas, por mais dificuldades que passem juntos, é bom estar ali", diz ele. "Aqui é assim: estamos sempre juntos. Vou à casa da Alice, cozinho para eles de vez em quando, fazemos churrasco com todo mundo reunido. Para mim é muito bom ter os filhos por perto. Eu e a Alice temos uma cabeça muito boa para lidar com essa situação e vivemos muito bem assim. Quando existe amor e respeito, tudo dá certo", declara.

A paciência oriental da família Nakazato

  • Haruko, Claudia e Bianca (de roxo na foto) são parte da família Nakazato, composta ainda pelo pai Tsuneo e os outros dois filhos Brenda e Ricardo

Na Zona Norte de São Paulo, Tsuneo Nakazato, 63, e Haruko, 62, vivem com os quatro filhos: Brenda Mayumi, 35; Bianca Miyuk, 33; Cláudia Ery, 29, e Ricardo Keiichi, 28. Eles moram em uma casa com quatro dormitórios, sala de estar, sala de jantar, cozinha e três banheiros. 

Os pais trabalham em casa e todos os filhos têm emprego fora. Durante a semana, cada um tem seu horário e o convívio acaba sendo menor do que eles gostariam. Refeição com todo mundo junto, só no domingo.

Ainda assim, Haruko tem um ritual diário para se sentir mais perto dos filhos: ela acompanha cada um deles até o portão e depois fica na varanda os observando até que eles, antes de virarem a esquina, acenem para ela. "Para mim, é natural acompanhar meus filhos até perdê-los de vista. Se não faço isso, eles sentem falta. É engraçado", conta.

Segundo a filha Claudia, a família é movida pela calma e os conflitos são muito raros, pois cada um sabe e cumpre sua função dentro de casa. "Apesar de sermos todos muito calmos e pacientes, somos seres humanos diferentes. Temos dias bons e outros nem tanto. Quando isso acontece, usamos a família para buscar o apoio necessário para que possamos nos restabelecer, respirar, pensar e, enfim, melhorar", afirma.