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Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Com IA, equipe com brasileiro revela como coronavírus se conecta às células

Micrografia eletrônica de uma célula (verde) fortemente infectada com partículas do vírus Sars-CoV-2 (amarelo), isolada de uma amostra de paciente - Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID, na sigla em inglês)
Micrografia eletrônica de uma célula (verde) fortemente infectada com partículas do vírus Sars-CoV-2 (amarelo), isolada de uma amostra de paciente Imagem: Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID, na sigla em inglês)

Cientistas do mundo todo têm se dedicado à pesquisa do Sars-Cov-2 na tentativa de desenvolver formas de prevenir e curar a covid-19. Um brasileiro foi destaque na ciência e ganhou prêmio da prestigiosa associação de computação ACM.

Julio Maia é cientista na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, especialista em química computacional e simulações híbridas de mecânica quântica e molecular. Em seu estudo, Júlio e colegas usaram sistemas moleculares para descrever a dinâmica das espículas (ou proteína "spike") da membrana do coronavírus.

É através da espícula que o vírus se conecta ao receptor da membrana celular (chamado ACE2) e infecta a célula humana. Não é qualquer região da espícula que tem essa capacidade de se conectar. Mas existe uma região específica que funciona como uma chave, cuja fechadura é o receptor da célula humana.

Para entender melhor as interações moleculares, um software chamado NAMD pode simular o funcionamento estrutural de átomos da membrana, dinamicamente, e em ambientes complexos.

A estrutura tridimensional das moléculas da membrana determina em grande parte seu funcionamento. As proteínas têm função bioativa relacionada a esta disposição tridimensional e seus elementos se dobram e entrelaçam dependendo dos componentes da proteína. Assim, a espícula tem estados aberto e fechado, que determinam sua interação com o receptor ACE2.

Estudos deste tipo são muito relevantes à investigação do coronavírus Sars-Cov-2.

Uma vez desvendados os mecanismos de infecção, pode-se desenhar ou testar fármacos que possam interromper o ciclo de infecção ou ativar a produção de antígenos específicos.

Os cientistas também estudaram outra região importante da membrana: os "escudos de glicanas". Essas estruturas são constituídas de polissacarídeos, "camuflam" o vírus e retardam a ação do sistema imunológico para combater a replicação do coronavírus.

A pesquisa de Júlio descreveu o mecanismo e papel deste escudo na infecção por coronavírus. Além disso, os cientistas elucidaram a interação dinâmica da espícula com o receptor ACE2.

Uma grande contribuição foi descobrir que dois tipos de glicanas são parte da modulação da "chave" da espícula, não apenas em função de camuflagem.

Os cientistas contribuíram também no entendimento de que o receptor ACE2 é bem flexível e pode fazer movimentos amplos perto da membrana, e isso tem papel importante no mecanismo de infecção.

O prêmio Gordon Bell ACM foi lançado em 2020 para estudos de covid-19 baseados em HPC (computação de alto desempenho). Além da relevância para a doença, o trabalho é inovador ao demonstrar a eficiência computacional aplicada a este tipo de estudo.

Os autores premiados demonstraram uma forma multiescala de simular as estruturas moleculares ao longo do sistema complexo: todos os átomos da membrana viral mais o receptor e membrana celular.

O grande desafio de analisar a membrana e região de espícula é de lidar com mais de 300 milhões de átomos, e simular as estruturas e interações moleculares. Um problema com essa ordem de magnitude demanda também inovação computacional.

Esse processo foi direcionado por inteligência artificial (IA), que facilitou chegar aos resultados desse estudo.

Além do conhecimento já conquistado, a pesquisa poderá ser testada em mais estudos para o coronavírus Sars-CoV-2 ou outros vírus que venham a aparecer. Mais um avanço para enfrentarmos essa e outras epidemias que virão.