Como é ter um gato que chega a custar R$ 100 mil? 'Já confundiram com onça'

Anna Julia Dannala, 23, é escritora e criadora de gatos. Ela e a avó são donas, desde 2014, de um gatil em Valinhos (SP), especializado na raça Savannah.

"O que nos faz ainda sermos as únicas criadoras da raça Savannah é o preço dos exemplares no exterior, a dificuldade de importação e reprodução da raça e a bênção que tivemos com as oportunidades que nos trouxeram os gatos e o conhecimento", explica.

Foi com Anna que algumas celebridades brasileiras adquiriram o Savannah. Entre eles o youtuber Cerol, o trapper Oruam e a influenciadora digital Carol Castelo Branco. Mas o perfil de quem procura a raça é bem diverso.

E tem anônimo também. O médico radiologista Luís Paulo Marijuan Cabezas Sampaio, 34, morador do Rio de Janeiro, tem um Savannah F1. Mais abaixo você entende o que a sigla significa.

"Tive gatos desde que entrei na vida adulta, mas conforme fui ficando mais velho e formei a minha família, surgiu essa necessidade por um perfil de animal mais companheiro, que se adaptasse ao meu estilo de vida e pudesse sempre estar em todos os momentos em família, até porque tenho uma rotina bem agitada com o trabalho e quando tenho um tempo livre, seria bom conseguir conciliar tudo e todos", conta o médico.

"O Savannah apareceu para mim por acaso, sempre segui gatis [nas redes sociais] e o Justin Bieber tem duas gatas dessa raça e, nela, vi o companheirismo de um cão no corpo de um gato. Para mim, foi o equilíbrio perfeito. O Adebayo [nome do gato de Luís] tem um um ano e me satisfaz como tutor." O Adebayo tem um Instagram, caso queira acompanhar a rotina do felino: @adebayo_savannahf1.

O gato Adebayo é um Savannah F1
O gato Adebayo é um Savannah F1 Imagem: Reprodução/Instagram

O tutor diz que o gato é carinhoso e divertido de se conviver, mas que já teve problemas pela excentricidade da raça.

Já aconteceu de eu levá-lo à praia e confundirem-no com um filhote de onça pintada. Tive que mostrar o certificado que tenho que atesta a raça para me deixarem em paz. Luís Paulo Marijuan Cabezas Sampaio, tutor de um Savannah F1

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História do gatil começou há 10 anos

"Fui criada pelos meus avós e, em 2010, a minha avó foi diagnosticada com câncer de mama em estágio avançado. Tínhamos gatos sem raça definida e os animais ajudaram ela a se distrair e a não pensar em uma provável morte", conta Anna, dona do gatil Lucky Stone.

Avó de Anna, Geisa Narcisa de Fátima, 65, artista plástica, conheceu em 2013 uma amiga em João Pessoa (PB) que se casou com um inglês. Juntos, eles compraram alguns gatos Savannah do gatil fundador da raça nos EUA e os trouxeram ao Brasil, mas o marido dela não se adaptou por aqui e quis voltar à terra natal.

 Anna Julia com um Savannah F1
Anna Julia com um Savannah F1 Imagem: Arquivo pessoal

"Eles não puderam levar todos os gatos para a Inglaterra [não me lembro quantos eram] e anunciaram para venda. Nisso, minha avó adquiriu o nosso primeiro Savannah", recorda Anna.

Léo foi o primeiro "morador" do gatil que hoje tem 30 adultos. Ele é um Savannah F5 de cor silver. Anna Julia e a avó acabaram mantendo o contato com as pessoas que adquiriram os outros filhotes e assim conseguiram a primeira fêmea.

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Doméstico + selvagem = Savannah

A médica veterinária Aline Ambrogi Franco Prado, mestre em Ciência Animal pela USP, explica que o gato Savannah é uma raça que chama atenção por ser bem parecido a um felino selvagem: "Sua origem ocorreu da cruza entre duas espécies diferentes, o gato comum com um felino africano selvagem, chamado Serval, em 1986, mas é reconhecida como raça apenas desde 2012".

Léo é um Savannah F5 que começou a história do gatil de Anna e sua avó
Léo é um Savannah F5 que começou a história do gatil de Anna e sua avó Imagem: Arquivo pessoal

Quando ocorre o nascimento de filhotes de duas espécies diferentes, eles são chamados de híbridos e podem não ter a capacidade de se reproduzir.

Também médica veterinária, Camila Ferreiro, mestre em ciências médicas pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP com ênfase em felinos, tem um pensamento mais crítico sobre o assunto: "A intenção era criar um gato com características selvagens com manchas características, aparência e tamanho, mas com temperamento mais próximo dos gatos domésticos", pondera.

F1 a F5: o que isso significa?

Como é uma raça relativamente nova, cada gato tem um código especial para identificar sua geração:

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  • Gato Savannah F1: serval é o pai / a mãe é uma gata doméstica (filhote é 50% a 75% serval)
  • Gato Savannah F2: serval é o avô / a mãe é uma gata doméstica (filhote é 30% a 37% serval)
  • Gato Savannah F3: serval é o bisavô / a mãe é uma gata doméstica (filhote é de 12,5% a 20% serval)
  • Gato Savannah F4: serval é o tataravô / a mãe é uma gata doméstica (filhote é 6% a 14% serval)
  • Gato Savannah F5: serval é o quinto avô / a mãe é uma gata doméstica (filhote é 3% a 12% serval).

Os gatos Savannah F1 são os mais selvagens entre os híbridos. É um gato ativo ao extremo. Adora brincar, consegue pular até 2,5 metros de altura e correr em alta velocidade. Seu peso pode variar de 15 kg a 25 kg. Devido à sua raridade, custa cerca de R$ 100 mil.

O Savannah F2 tem muitas semelhanças com o F1, mas o porte é mais robusto. Ele é um gato mais afetuoso, que gosta de receber na porta e dividir a cama. O peso corporal varia entre 15 kg e 20 kg. Seu preço pode chegar a cerca de R$ 47 mil.

Savannah F3 é altamente adaptável e tem temperamento mais próximo a um gato comum, adora colo. Por estarem mais distantes do serval, alguns filhotes podem ter a aparência mais semelhante à dos gatos domésticos, com pernas mais curtas e rosto redondo. Seu peso varia entre 12 kg e 17 kg. Pode custar cerca de R$ 21 mil.

O Savannah F4 é um gato extrovertido, interativo e bastante adaptável. Seu peso varia entre 12 kg e 17 kg.

Já o Savannah F5 se mostra dócil e sociável com todos. Gostam da interação com pessoas e, de forma geral, se adaptam com facilidade às mudanças no ambiente. Seu peso corporal varia de 6 kg a 11 kg. Ambos custam cerca de R$ 13 mil.

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O Serval mede de 1 m a 1,10 m de comprimento e de 60 cm a 70 cm de altura. Os Savannah F1 podem medir o mesmo tamanho. Já um F5, por exemplo, mede de 60 cm a 70 cm de comprimento e 25 cm a 30 cm de altura.

Comportamento é diferente do de um gato comum

O tutor precisa fornecer alojamento adequado com estrutura de segurança, como possibilidade de recinto, para os F1 e F2.

Tipo de recinto necessário para Savannahs F1 e F2
Tipo de recinto necessário para Savannahs F1 e F2 Imagem: Arquivo pessoal

Os Savannahs F3 em diante, costumam precisar de telas metálicas para que não consigam cortar a proteção e fugir.

O Savannah F1 e F2 é indicado para pessoas aventureiras que tenham tempo e disposição para brincar com eles ou levá-los para caminhar ao ar livre. Eles lembram bastante um cão quando se trata desse quesito. Anna Julia Dannala, criadora de gatos Savannah

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Outros itens necessários são para enriquecimento ambiental, como contato com grama e lago. Os gatos Savannah amam passear com guia, brincar com água e buscar objetos.

"O tutor precisa ter conhecimento sobre a grande necessidade de enriquecimento ambiental, como prateleiras, tocas, túneis e arranhadores. Nesta raça, o risco de um ambiente tedioso pode levar a um comportamento mais selvagem", aconselha a veterinária Camila Ferreiro.

É importante que o ambiente tenha espaço suficiente e estímulos diários para que os bichos possam se exercitar de forma física e mental.

"Machos marcam território e brigam entre eles caso não sejam os únicos no domicílio. Eles precisam ter seu próprio espaço e essas construções acabam encarecendo ter um gato da raça", detalha Anna.

Tudo isso é para simular o habitat natural de um felino. Cuidados especiais para uma alimentação adequada e balanceada também são necessários:

Savannah F1 e F2 comem exclusivamente 500 g de carne por dia e presas inteiras como aves e ratos.

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Já os de gerações mais distantes, precisam de uma ração de alta qualidade, sem ser transgênica, e complementada com carne, em torno de 250 g ao dia. As carnes costumam ser frango, cortes magros de carne bovina (patinho, maminha, lagarto, filé mignon, coxão mole e coxão duro) e peixes sem espinhos.

F3 em diante é mais independente, não exige tanto espaço, não requer tanto tempo e atenção do tutor e a alimentação é mais simples, é bem mais parecido com um gato doméstico convencional, de raça ou não.

Os filhotes devem ser manuseados desde recém-nascidos e amamentados com mamadeira e leite destinado a gatos. "Isso é para garantir que sejam dóceis com os humanos. Se os deixarmos com a mãe, eles podem se tornar ariscos", ressalta a criadora.

Um gato Savannah F4 do gatil de Anna
Um gato Savannah F4 do gatil de Anna Imagem: Arquivo pessoal

Ela diz que como são animais curiosos, aventureiros e corajosos, ficam confortáveis em caixas de transporte ou mesmo sentados no banco de trás de automóveis, com o uso do peitoral e guia ou cinto de segurança pet.

Por que é um gato tão caro?

Savannah é uma raça de gatos considerada cara porque são difíceis de serem reproduzidos —têm uma ninhada por ano—, o que valoriza o preço dos filhotes.

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Para manter as características da espécie, o gatil busca cruzar os Savannah entre si, ou Savannah com Serval, e a dificuldade está no tempo de gestação para a raça: o gato doméstico tem uma gestação de 65 dias, enquanto a do Serval dura 74 dias, isso faz com que nasçam filhotes prematuros, mesmo nas gerações mais distantes.

De acordo com a experiência de Anna, os Savannahs F1 e F2 são os mais caros, devido aos desafios que os criadores enfrentam ao criá-los.

Os Savannahs das gerações intermediárias (F3, F4 e F5) e das gerações posteriores (F6, F7 e F8) têm preços mais razoáveis por serem mais fáceis de serem criados.

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