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OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A imagem de um atleta vai muito além das quatro linhas

Tinga faz propaganda da RMS Telecom, uma das parceira do ex-jogador - Divulgação
Tinga faz propaganda da RMS Telecom, uma das parceira do ex-jogador Imagem: Divulgação

21/05/2021 04h00

Ainda quando atuava como jogador profissional e hoje como empresário, sempre tive muito cuidado em ligar a minha imagem a determinados negócios. Mas esta semana algo me deixou muito triste e angustiado. Em audiência por videoconferência, tive de depor por ter sido processado ao lado de outras figuras do futebol ao ter aceitado um pedido para gravar vídeo pedindo para ajudar na divulgação de uma loja de celulares, que posteriormente aplicou supostos golpes nas vítimas ao não entregar os aparelhos comprados on-line.

Infelizmente, hoje no Brasil você pode se incomodar ao tentar ajudar.

Quando ainda atuava no Cruzeiro, um homem dono de uma loja localizada em Bauru, no interior de São Paulo, e que costumava frequentar os hotéis onde concentrávamos fez essa solicitação. Sem cobrar um tostão, gravei o vídeo de alguns segundos chamando as pessoas para conhecer o estabelecimento. Foi apenas isso.

Passados alguns anos, tive a lamentável surpresa que estava sendo processado por porque a loja não teria entregado aparelhos de celulares que haviam sido comprados pela internet.

Mas por que resolvi abrir publicamente este caso? Acredito que possa ajudar aos novos atletas, artistas, celebridades e até influenciadores digitais para terem muito cuidado quando são abordados para gravar vídeos para pedir ajuda financeira em ações sociais ou para divulgação de lojas ou produtos.

Não me considero um influenciador digital, sou apenas um aposentado do futebol que administra alguns negócios e utiliza a própria imagem para fazer acordos comerciais.

Cansei de ajudar ao gravar vídeos que foram solicitados, principalmente em casos ligados a questões sociais, mas depois deste episódio lamentável parei de aceitar estes pedidos. Tenho centenas de ofertas para divulgar vinhos, casas de carnes, pizzarias... Mas hoje recuso todas.

Logo de cara deixo à vontade as pessoas que me procuraram, aviso que não vou postar nada nas redes sociais apenas por receber alguns mimos. Aos que estão iniciando, oferto até em comprar os produtos para que possam ter ajuda neste pontapé inicial. Esta é a maneira que proporciono para ajudar.

Graças a Deus, este processo que fui envolvido, ao lado do Deco (ex-Barcelona, Chelsea e seleção portuguesa), do Fernandão (ex-Bahia, Fenerbahce e Athletico-PR) e do Camilo (Ponte Preta), não evoluiu porque também fomos vítimas deste golpe. Não tive a necessidade de ir a Salvador para depor perante ao juiz. Fiquei angustiado com este caso, pois em 43 anos nunca havia sido processado, nunca havia precisado de um advogado para me defender perante a um juiz.

Aprendi com esta situação. Atualmente quando me fazem pedidos como esse, recuso e explico porque passei por este caso inconveniente.

Agora, uso muito a minha imagem nas minhas empresas e nos negócios com parceiros comerciais. Todos os contratos que faço são no mínimo de 12 meses para fidelizar. São com empresas sérias. Faço questão de conhecer antes os produtos e as pessoas que estão por trás delas.

Tinga em empreendimento imobiliário na cidade de Torres, no litoral gaúcho - Divulgação - Divulgação
Tinga em empreendimento imobiliário da Construtora Monte Bello na cidade de Torres, no litoral gaúcho
Imagem: Divulgação

Faço comerciais para três gigantes do Rio Grande do Sul - Construtora Monte Bello, Tintas Killing e RMS Telecom, além da loja de artigos esportivos Dresch. Todos os contratos tiveram resultados melhores e comprovados depois de um ano de trabalho. Todos os acordos foram renovados por mais tempo pela credibilidade, lealdade, confiança e legitimidade. Conheço pessoalmente as famílias e eles a minha. É nisso que acredito.

Os jogadores de futebol são muito influentes na nossa sociedade, por isso faço esse testemunho para que fiquem alertas. Os atletas são constantemente abordados nas saídas dos centros de treinamentos, hotéis, aeroportos ou em mensagens diretas em perfis de redes sociais para gravar mensagens. O alerta que faço é para que não sejam vítimas de injustiças e que fiquem atentos como estão utilizando as suas imagens. Os golpes virtuais estão se alastrando.

Sempre levei comigo o seguinte pensamento: o que é meu é meu, e não cobiço o que é dos outros. Faço por merecer de forma justa. E isto me lembra quando eu deixei o Cruzeiro. Estava com tíbia e a fíbula fraturadas e ainda tinha seis meses de contrato. Durante o processo de recuperação, senti que a diretoria não iria renovar o vínculo.

Por lei, eles teriam que renovar automaticamente pelo mesmo período que fiquei parado, mas estava com 37 anos e sabia que não iria render como esperavam. Sem precisar de um advogado, fiz questão de escrever de próprio punho uma carta declarando que não iria processar o clube futuramente e concretizei o meu desligamento sem nenhum problema. Tenho grande apreço pelo Cruzeiro, onde fui bicampeão brasileiro e nunca almejei algo que não merecia.

E deixo aqui a orientação do Cleber Pedroso, meu advogado neste caso.

"A celebridade que serviu de garoto-propaganda não pode ser responsabilizada por publicidade de propostas abusivas ou enganosas, já que tal responsabilidade é do fornecedor/anunciante. O CDC [Código de Defesa do Consumidor] quando trata de publicidade, impõe deveres ao anunciante e em nenhum momento atribui responsabilidade a pessoa que gratuitamente e de forma genérica faz propaganda de determinada marca ou empresa.

O STJ, inclusive, já se posicionou em alguns julgados no sentido de que não se atribui ao garoto-propaganda a corresponsabilidade pela publicidade enganosa. Contudo a matéria é extremamente recente e a orientação que costumo passar aos meus clientes é que evitem gravar vídeos gratuitos de propaganda ou de apoio a desconhecidos, pois muitas vezes com o intuito de ajudar, a celebridade corre o risco de ter sua imagem utilizada para fins duvidosos."

Cuidado, credibilidade e confiança valem muita mais que dinheiro.

*Com colaboração de Augusto Zaupa