Reconstrução em movimento

100 histórias que mostram por que, mesmo na pandemia, devemos nos inspirar e acreditar na força do coletivo

Douglas Vieira Colaboração para Ecoa, em São Paulo

Estamos perto do fim de 2020. Há mais de 200 dias lidamos diariamente com dados aflitivos e números crescentes de infectados e vítimas da Covid-19. Ainda assim, este ano está provavelmente entre aqueles que mais nos despertaram esperança. Mas não esperança como um sentimento abstrato, subjetivo, individual, e sim aquela que se forma num cultivo diário, entre muitos corpos e vozes, personificada em cada ser humano que, em meio a uma calamidade global, olhou para o outro e não apenas para si, sem deixar o medo ou qualquer desafio que estivesse à frente limitar a vontade de apoiar quem estivesse sofrendo não só com o vírus, mas com a fome, a violência e as vulnerabilidades de longa data que vivemos no Brasil.

Foi nesse cenário que a sociedade civil mostrou a potência da articulação e da mobilização popular. Sinalizou que, mesmo fisicamente separados, estamos juntos. Que quem enfrentou os efeitos do coronavírus no próprio corpo, na própria pele, também conseguiu se levantar para reencontrar a família, os amigos e recomeçar. Neste especial, Ecoa reúne 100 histórias inspiradoras, que mostram haver muito mais gente trabalhando pelas necessidades coletivas do que é possível enxergar em nossas bolhas.

Histórias de veteranos de lutas, como as duas décadas de ativismo nas favelas de Preto Zezé, a novatos que, inspirados pelos gestos de outros ou pela emergência do momento, resolveram partir para a ação direta pela primeira vez, como o motoboy José Arludo, que distribuiu lanches a quem precisou varar a madrugada na fila à espera do auxílio emergencial.

Histórias de chefs famosos como Rodrigo Oliveira e Telma Shiraishi, que participaram de ações solidárias a partir de seus restaurantes estrelados, a anônimos como Tássia Bento, que lidera uma cozinha comunitária para produzir e distribuir marmitas a pessoas em situação de rua.

Histórias de um garoto de 9 anos que escreveu um livro para estimular outras crianças a ler na quarentena a uma idosa de 95 anos que costurou máscaras para doar a quem precisa. Do casal rock Vivi Torrico e João Gordo, que trabalham incansavelmente para distribuir comida, roupas e oferecer escuta a pessoas em situação de rua, a drag queen Yasmin Bispo, que fez de suas lives um instrumento de sobrevivência para outras artistas que, como ela, tiveram de se afastar do público. De movimentos organizados a iniciativas improvisadas. De norte a sul. No melhor dos mundos, de um para todos e todos para um.

Fernando Moraes/UOL Fernando Moraes/UOL

Nós por Nós

A capacidade de organização de favelas em todo o Brasil impediu uma tragédia ainda maior nas periferias

O Brasil passa dos 170 mil mortos por Covid-19 e, enquanto muitas pessoas flexibilizam o isolamento social, nas favelas a luta vai além do combate à doença. Desde os primeiros dias de pandemia discutiu-se que, junto com o coronavírus, viriam também a explosão do desemprego e outros problemas comuns às regiões mais vulneráveis, como a escassez e a fome. E se não há como cuidar do doente sem olhar para os determinantes sociais, as soluções mais efetivas surgiram muitas vezes dentro das próprias comunidades, que, com um histórico de mobilização pela sobrevivência, demonstraram o poder da articulação regional e nacional.

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  • A solução é o próprio povo

    A luta de Raull Santiago, do Rio de Janeiro, Anna Karla Pereira, do Recife, Thiago Vinicius, de São Paulo, Joice Paixão, do Recife, Max Maciel, de Ceilândia (DF), e Eduardo Tamborero, de Novo Hamburgo (RS) nas comunidades onde vivem

    Imagem: Fernando Moraes/UOL
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@ramondebh/Reprodução @ramondebh/Reprodução

Lute como uma garota

A pandemia escancarou (ainda mais) a violência doméstica, mas também fez florescer uma grande rede de apoio

Foi nos ombros das mulheres que caíram pesos da quarentena: cuidar da casa, dos filhos e do home office, cozinhar, lavar, trabalhar e, em muitos casos, tentar sobreviver a situações extremas como violência doméstica, depressão e burnout. Nos primeiros meses da pandemia, a ONU Mulheres lançou um alerta sobre o impacto do isolamento social, que poderia agravar uma série de problemas pré-pandemia para mulheres do mundo todo. Mas elas resistiram: para ajudar umas às outras, criaram projetos de acolhimento psicológico, assistência jurídica, campanhas solidárias e ações para reinserção no mercado.

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Jade Azevedo/Reprodução Jade Azevedo/Reprodução

Quem tem fome tem pressa

A urgência por comida fez muita gente partir para a ação direta

Uma catástrofe de "proporções bíblicas". Foi essa a expressão usada pela ONU para dimensionar o risco de crise alimentar, dobrando o número de famintos mundo afora para 265 milhões. Com mais de 10 milhões de pessoas nessa condição, o Brasil pode voltar ao Mapa da Fome, lista que inclui países onde 5% da população não ingere o mínimo de calorias por dia para viver. E quem tem fome tem pressa, já dizia o sociólogo Herbert José de Sousa (1935-1997), o Betinho. Na pandemia, o lema foi resgatado em diversas campanhas de crowdfunding, distribuição de marmitas e cestas básicas organizadas para oferecer um prato de comida a quem mais precisa.

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Wellington Lenon/Reprodução Wellington Lenon/Reprodução

A rua é nóis

O esforço coletivo para evitar uma calamidade ainda maior na vida das pessoas em situação de rua

No asfalto das cidades, a pandemia foi marcada principalmente pelo medo do desemprego e da fome, problemas históricos das metrópoles brasileiras. Mas o que vimos também foi o fortalecimento e o surgimento de um grande número de projetos inspiradores que visam a atender populações vulneráveis, em situação de rua. Apesar do pessimismo quase inevitável, líderes de comunidades pobres Brasil adentro se dizem esperançosos com o legado de solidariedade nas regiões metropolitanas de Manaus (AM) a Maringá (PR), indica levantamento recente da Rede de Pesquisa Solidária, que monitora as respostas à Covid-19. Se a cidade é nossa, a rua é nóis.

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  • Solidariedade Vegan

    O esforço contínuo do casal rock João Gordo e Vivi Torrico para entregar marmitas, roupas, orientação e escuta às pessoas em situação de rua do centro de São Paulo.

    Imagem: Rodrigo Ferreira e Ugo Soares/UOL
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Penna Prearo Penna Prearo

Não pira

A criatividade foi fundamental na rotina de quem estava trancado em casa e com medo do mundo lá fora

Na montanha-russa emocional provocada pela pandemia, incerteza, isolamento, medo e um turbilhão de informações provocaram angústia e agravaram quadros psiquiátricos e psicológicos. O rol de sintomas é tão extenso quanto a da Covid-19: dores no corpo, estresse, irritabilidade, insônia, letargia, melancolia e um nó na garganta diante de tudo o que está acontecendo. Mas se 2020 teve dor e luto, também teve afeto e luta, com incontáveis iniciativas de atendimento e acolhimento, uma mistura de ações aguerridas para tentar manter a saúde mental do país.

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Samela/Divulgação Samela/Divulgação

Indígenas em luta

O esforço coletivo para não sucumbir ao vírus e nem aos incêndios devastadores de 2020

Ao longo deste ano, os indígenas estiveram frequentemente no noticiário, muitas vezes sendo injustamente ligados a incêndios florestais de grandes proporções, acusados de destruir o ecossistema que defendem pela própria sobrevivência. Ao mesmo tempo, convivemos diariamente com notícias e posts em redes sociais que relatavam o medo de que a Covid-19 se espalhasse tão rápido quanto o fogo dentro de aldeias pelo Brasil todo. Mas há séculos lidando com ameaças, a população indígena não se recolheu e foi, muitas vezes, ela própria a responsável pelo combate à pandemia em seus territórios.

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Dimitri Lee Dimitri Lee

Linha de frente

O enfrentamento à pandemia mobilizou profissionais da saúde, pesquisadores e muitos voluntários

Das janelas, eles foram aplaudidos. Na internet, homenageados entre emojis e lives. No dia a dia, passaram a receber cartas, flores e mensagens de agradecimento por ocuparem a linha de frente no combate à Covid-19. Uns vestem jaleco branco e são celebrados como super-heróis (médicos, principalmente), outros não, mas são tão importantes quanto: é o caso das funções ocupadas por enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem, agentes comunitários de saúde, auxiliares de lavanderia e de limpeza, almoxarifes, copeiros, cozinheiros, recepcionistas e um sem-número de auxiliares de serviços gerais, os "faz-tudo", sem os quais ambulatórios e hospitais não param de pé. Que sejam todos aplaudidos.

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Rodrigo Ferreira e Ugo Soares/UOL Rodrigo Ferreira e Ugo Soares/UOL

Palco em casa

A internet foi uma ferramenta potente na busca por entretenimento e informação durante a quarentena

Longe do público, artistas de diferentes linguagens precisaram se reinventar para continuar na ativa, seja pela sobrevivência, seja para ajudar os outros. Nesse contexto, foi criada a lei Aldir Blanc, que garante uma renda emergencial para trabalhadores da cultura e também para a manutenção dos espaços culturais brasileiros durante o período de fechamento das portas. Mas foi a internet que ocupou o espaço do palco, com uma longa lista de lives memoráveis. Pelas redes, também entendemos que a ciência pode e deve ser pop, com pesquisadores se tornando trending topics em diversas plataformas, cativando milhões de seguidores, assim como outros profissionais que usaram a rede para lançar soluções criativas para lidarmos com nossa nova rotina.

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  • Traveshow online

    A performer Yasmin Bispo fez do espetáculo que dirige uma ação online pela sobrevivência dela e de outras artistas trans que perderam suas rendas na pandemia

    Imagem: Rodrigo Ferreira e Ugo Soares/UOL
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Roger Pires/UOL Roger Pires/UOL

Caminho suave

Professores e voluntários se desdobraram para combater as desigualdades no ensino a distância

No mundo todo, a educação foi posta à prova. Quase no fim de 2020, diante da incógnita do calendário letivo 2020-2021 no Brasil, é verdade que a pandemia escancarou desigualdades na área, como a miragem de aulas adaptadas para o ensino remoto. Mas também é verdade que professores não ficaram de braços cruzados e fizeram o possível e o impossível para continuar dando aulas, muitos literalmente percorrendo quilômetros para entregar lições na casa de alunos sem acesso à internet. Alunos com deficiências ou necessidades especiais também conseguiram continuar estudando graças à perseverança dos docentes. A estrada é longa, mas o caminho pode ser suave.

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  • Todo aluno importa

    A jornada de Elisandra Rodrigues Ferreira para levar as atividades escolares aos alunos que não têm acesso à internet em Mucambo, no interior do Ceará

    Imagem: Roger Pires/UOL
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Edu Cavalcanti/UOL Edu Cavalcanti/UOL

Vim, vi e venci

Histórias de quem esteve entre os mais de 6 milhões de infectados no Brasil e conseguiu superar a doença

Superar uma doença como a Covid-19, que provocou mais de 1,3 milhão de mortes no mundo, é motivo para comemorar; já é uma vitória conseguir respirar em um mundo tão fragmentado e confuso, que tenta enfrentar um vírus tão sorrateiro quanto o Sars-CoV-2. Receber alta pode ser uma conquista individual, mas também está entrelaçada à malha que se formou, ponto por ponto, na resposta à pandemia: da linha de frente aos afetos, do arroz no prato à espera dos abraços quando tudo isso passar. Cada vitória individual é também um alento ao coletivo. Em frente.

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Fernando Moraes/Roger Pires/Rodrigo Ferreira e Ugo Soares/UOL Fernando Moraes/Roger Pires/Rodrigo Ferreira e Ugo Soares/UOL

Ações inspiradoras

Um mergulho em vídeo no dia a dia de pessoas que cuidam dos que foram mais afetados pela pandemia

A rotina de Raull Santiago, do Rio de Janeiro, Anna Karla Pereira, do Recife, Thiago Vinicius, de São Paulo, Joice Paixão, do Recife, Max Maciel, de Ceilândia (DF), e Eduardo Tamborero, de Novo Hamburgo (RS), que representam outros tantos líderes comunitários que trabalham no enfrentamento da pandemia em suas comunidades. O esforço de Vivi Torrico e João Gordo, casal formado nas doutrinas do punk, para entregar mais de 35 mil marmitas, além de água, itens de higiene, roupas e escuta às pessoas em situação de rua do centro de São Paulo. A iniciativa da atriz e performer Yasmin Bispo, que fez do espetáculo Traveshow uma ação online pela sobrevivência dela e de outras artistas trans, que perderam suas rendas com a suspensão das atividades nos palcos. E a jornada de Elisandra Rodrigues Ferreira para levar as atividades escolares aos alunos que não têm acesso à internet em Mucambo, no interior do Ceará.

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