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Especialistas apontam violência de gênero como 'pandemia dentro da pandemia'

"A residência nunca foi um lugar seguro para as mulheres no Brasil", disse Gabriela Manssur no fórum virtual da EFE Imagem: Alikaj2582/iStock

Em São Paulo

27/05/2020 08h29Atualizada em 27/05/2020 10h43

Apenas nove dias após o início das medidas de isolamento contra o novo coronavírus, as agressões contra mulheres aumentaram quase 18% no Brasil, tornando a violência masculina 'uma pandemia dentro da pandemia', segundo especialistas que participaram do EFE Fórum Virtual nesta terça-feira.

Organizado pela Agência EFE no Brasil e com o título "Mulheres isoladas: O aumento da violência contra a mulher durante a pandemia do coronavírus", o debate contou com a presença de Ana Paula Antunes, consultora da ONU Mulheres Brasil para o Enfrentamento à Violência contra as Mulheres; Gabriela Manssur, fundadora do projeto Justiça de Saia; e Vivian Machado, gerente de Comunicação, Diversidade e Inclusão do Grupo Carrefour Brasil, patrocinador do evento.

Para Antunes, a violência de gênero é um problema "brutal, duro e global", uma "verdadeira pandemia que enfrentamos há anos" e que mata mais de 1,3 mil mulheres a cada ano no Brasil.

A consultora da ONU Mulheres Brasil destacou ainda que a emergência sanitária e econômica causada pelo novo coronavírus, que levou milhões de pessoas ao confinamento social, "intensificou" a violência de gênero, pois muitas mulheres foram forçadas a dividir o mesmo teto com seus agressores.

"Há um fator comum entre a pandemia e a violência contra as mulheres, que é o medo. [O medo] é paralisante, coloca a individualidade em cheque, o esforço pela autonomia", disse.

Desde o final de março, vários estados do Brasil, quinto país com mais casos de feminicídio em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), adotaram medidas de isolamento social para conter o avanço da covid-19, mas ficar em casa tornou-se, para algumas mulheres, mais perigoso do que ir às ruas.

"A residência nunca foi um lugar seguro para as mulheres no Brasil. Um lugar que deveria ter sido acolhedor tornou-se muito perigoso, pois elas (mulheres) estão sob os olhos e o controle do agressor", disse Gabriela Manssur, fundadora do Justiça de Saia, plataforma que fornece informações para ajudar mulheres vítimas de violência doméstica e promover o empoderamento feminino.

Manssur acrescentou que 87% das mulheres que vieram ao projeto para pedir ajuda foram atacadas dentro de suas próprias casas e por pessoas próximas a elas, em sua maioria parceiros ou ex-parceiros.

Segundo dados oficiais, os pedidos de medidas restritivas das mulheres contra seus agressores aumentaram 30% em São Paulo durante a pandemia, enquanto no Rio de Janeiro o aumento foi de 50%.

Para as especialistas, as quarentenas e o complexo tabuleiro político e social no Brasil são alguns dos fatores que "intensificaram" os conflitos domésticos, especialmente em situações onde já havia "abuso de poder, agressão psicológica e verbal, controle excessivo e machismo".

"A tensão de viver em um momento financeiro mais complicado e difícil pode exacerbar a violência dentro de casa", argumentou Vivian Machado Imagem: Getty Images/iStockphoto

Crise agrava a violência

Além disso, deve ser acrescentada a "tensão" gerada pela dura crise econômica que o país atravessa, cujos efeitos já começam a ser sentidos no desemprego e em vários indicadores socioeconômicos, disse Vivian Machado, do Grupo Carrefour Brasil.

"A tensão de viver em um momento financeiro mais complicado e difícil pode exacerbar a violência dentro de casa", afirmou.

Em relação ao mundo pós-pandemia, as participantes do fórum da EFE concordaram que é "essencial" investir em políticas públicas eficazes para a prevenção da violência machista, além de criar canais de denúncia de fácil acesso para auxiliar as vítimas e facilitar o acesso à justiça para as denunciantes.

"É um momento para investir na cooperação internacional e nos esforços governamentais que envolvem diferentes atores, articulados com a implementação e aprofundamento da participação social das mulheres", disse Ana Paula Antunes.

Já Vivian Machado concluiu que é essencial trabalhar para uma maior inclusão das mulheres em cargos de alta direção, assim como na política, e Gabriela Manssur lembrou que, assim que a pandemia acabar e devido ao complicado cenário político brasileiro, a luta será para "não aceitar retrocessos em direitos conquistados".

O fórum "Mulheres isoladas: o aumento da violência contra a mulher durante a pandemia de coronavirus" foi o ponto de partida para uma série de eventos organizados pela EFE para discutir diferentes questões sociais relacionadas à pandemia de covid-19.

O evento contou com a participação da diretora do site Efeminista, Macarena Baena; do cônsul geral da Espanha em São Paulo, Ángel Vázquez; e do embaixador da União Europeia no Brasil, Ignacio Ybañez, entre outros.

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