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COP-16: Entenda como foi a Conferência do Clima e o que deverá ser decidido no próximo ano

Lilian Ferreira

Do UOL Ciência e Saúde<br>Em Cancún (México)

13/12/2010 12h44

A COP-16, Conferência do Clima, que durou duas semanas, em Cancún, no México, pode ser comparada a uma partida de futebol das quartas-de-final que você espera que termine em zero a zero. Nem um grande sucesso, nem uma grande decepção. Significou um progresso, como era esperado, com um acordo final após tanto trabalho, mas ainda está muito aquém do necessário.

O encontro sobre o clima, que durou duas semanas, começou sentindo o peso do fracasso de Copenhague.

A COP-15, na capital dinamarquesa, era a reunião que decidiria novos acordos importantes sobre o controle do aquecimento global, principalmente com metas de redução dos gases do efeito estufa, um dos causadores das mudanças climáticas. Naquele encontro, presidentes de quase 190 países se reuniram, mas não conseguiram chegar a um acordo oficial. Seria como levar uma goleada na última partida da fase classificatória, quando seu time precisaria vencer para entrar bem na reta final.

Então, para a próxima partida, ou próximo encontro dos países, não se estava lá muito confiante quanto a um bom resultado, mas o otimismo fazia com que os envolvidos esperassem caminhar nas discussões. Era preciso, pelo menos, um empate para continuar a disputar o campeonato. Muitos negociadores disseram que um segundo fracasso abalaria as reuniões do clima da ONU.

Durante o jogo, seu time parecia que conseguiria emplacar um gol, mas toda vez que chutava contra o adversário, a bola passava longe da trave. Na Conferência, países como Brasil insistiam na possibilidade de um segundo período de comprometimento do Protocolo de Kyoto. O tratado, único compromisso legal que obriga países desenvolvidos (menos EUA) a reduzirem suas emissões, só vale até 2012. Depois disso, o mundo ficaria sem um acordo legal para combater as mudanças climáticas, por isso, muitos países pobres querem que o tratado seja prolongado. Era como insistir na jogada individual mágica para salvar o time, sem dar muita importância para o trabalho da bola no meio de campo.

Assim, durante toda a COP-16, falou-se muito mais de Kyoto do que de outros assuntos que também mereciam atenção como financiamento às reduções dos gases do efeito estufa, mas também uma maior adaptação às mudanças climáticas (já que os países mais vulneráveis como pequenas ilhas e nações africanas sofrem com suas consequências, como aumento do nível do mar, secas e enchentes); repasse de recursos internacionais para que países conservem suas florestas nativas (o desmatamento é responsável por cerca de 20% das emissões globais); e transferência de tecnologia dos países ricos para os pobres, para que estes possam fazer sua economia crescer emitindo menos gases do efeito estufa (hoje, um dos principais causadores das emissões são os combustíveis fósseis como carvão e petróleo, usados para gerar energia e, assim, estão atrelados ao desenvolvimento dos países).

No final, o talento individual não conseguiu fazer diferença e marcar o gol. Apesar de Brasil e Reino Unido terem trabalhado em negociações para facilitar um segundo período de Kyoto, não foi possível convencer totalmente países como Japão, Rússia e Canadá de que eles deveriam se comprometer com novas metas de gases. Eles alegam que só os países do protocolo não são suficientes para controlar o aumento da temperatura do planeta, o que exigiria um comprometimento global, principalmente dos maiores poluidores, como China e EUA.

O acordo foi que não haveria um intervalo entre o primeiro e o segundo período, o que acaba adiando a decisão para o próximo ano, data limite para um acordo legal com metas de corte de gases. É como se o empate nas quartas, pudesse levar para a semifinal. Mas no mata-mata, só uma  vitória levaria para a final. Assim, a decisão foi adiada para o ano que vem, mas só um acordo legal em 2011 poderá impedir este intervalo e, aí então, a conquista do campeonato, ou seja, o objetivo final da COP, que é reduzir as emissões para combater o aquecimento global.

Final conturbado

Quando você já tinha criado uma expectativa maior e se decepcionou, aos 47 minutos do segundo tempo, o artilheiro do outro time, aquele que você sempre soube que poderia dar trabalho, sai com a bola sozinho, dribla o goleiro, e parte para o gol.

A derrota parece inevitável. Mas aí o jogador do seu time, que até então era elogiado por todos por ser gente boa, dá um carrinho por trás no rival e impede o gol. Na falta ele erra o chute. O time adversário protesta revoltado. Alega que isso não é justo, que é contra o fair play do jogo. Já seu time diz que está jogando de acordo com as regras, teve o jogador expulso, mas conseguiu impedir o gol.

 A presidente da COP-16, a mexicana Patrícia Espinosa, era responsável por conduzir o encontro e mostrou-se o tempo todo aberta para discutir e ouvir opiniões conflitantes, além de incluir todos os participantes. Foi amplamente aplaudida pelos países em todas as intervenções que fez.

Mas na reunião final, quando era para bater o martelo sobre as decisões, a Bolívia se colocou contra. Seus motivos são similares ao dos países do protocolo que não querem novas metas: o que está estabelecido não resolve o problema, as temperaturas devem aumentar em até 4ºC, e cerca de 1 milhão de pessoas devem morrer. As COPs precisam ser decididas em consenso, então, a posição da Bolívia bloquearia um acordo em Cancún.

É, bloquearia, porque na hora da decisão, a presidente não quis nem saber e fez a falta. Tirou a Bolívia da jogada e impediu que ela melasse o acordo. Espinosa disse que consenso não é unanimidade e que um país não pode ter direito ao veto, ao aprovar o pacote de decisões, mesmo sem o apoio boliviano. Estes, por sua vez, protestaram por não concordarem com a atitude que, segundo eles, fere a moral das negociações.

Aí, no final, Cancún acabou exatamente como todos esperavam. Com um acordo simples, que não define novas metas ou comprometimentos (a principal briga, ou o gol), mas que diz que outras áreas, as do “meio campo”, têm que melhorar também.

O texto fala em linhas gerais como isso deve ser feito, com um maior detalhamento apenas para a questão de financiamento, mas mesmo assim sem definir pontos crucias como quem vai doar quanto e para quem, e de fundos para florestas, igualmente genérico.

Agora é esperar o jogo das semifinais, isto é a COP-17, que será em Durban, na África do Sul. E só uma vitória lá, com metas e compromissos legais obrigatórios poderá levar à taça.

PS: há uma brecha em toda essa comparação. Diferentemente da diplomacia, a regra do futebol é clara. Na diplomacia, nada impede que no ano que vem os negociadores encontrem um subterfúgio para não decidir e também não fracassar totalmente. É esperar para ver aonde tanta criatividade vai levar a humanidade.