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Letícia Piccolotto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Sem patentes e grana: os desafios que as nossas startups devem superar

DCStudio/ Freepik
Imagem: DCStudio/ Freepik

27/11/2021 04h00

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A Associação Brasileira de Startups (Abstartups) lançou os resultados da pesquisa "Mapeamento do Ecossistema Brasileiro de Startups" na última terça-feira (23 de novembro). Realizada desde 2018, a iniciativa busca trazer visibilidade e compreensão sobre o mercado de startups do país.

O levantamento é fundamental para fortalecer o ecossistema das startups. Isso porque qualquer iniciativa voltada a apoiar o trabalho deste setor precisa estar embasada em informações confiáveis sobre as potências e também os desafios enfrentados pelas empresas.

Em 2021, a pesquisa envolveu 2.486 empresas de 314 cidades do país. Todas as regiões participaram do levantamento, que traz também uma visão sobre as comunidades de startups presentes em 94 cidades do país.

No BrazilLAB tivemos a oportunidade de construir algo semelhante, publicando o relatório "As Startups GovTech e o Futuro do Governo no Brasil", em parceria com o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF).

A pesquisa deixou evidente os três principais desafios do mercado govtech: acesso a investimentos, a legislação de compras públicas e a cultura de inovação.

Desde então, diversas medidas foram sendo criadas por atores privados e públicos para enfrentar esses desafios —por exemplo, a aprovação do Marco Legal de Startups, que discuti aqui.

O trabalho da Abstartups traz muitas descobertas sobre o setor. Dentre elas, destacaria três como as principais.

O primeiro, sem sombra de dúvidas, está relacionado à baixa diversidade do setor em relação aos critérios de gênero e geográfico.

O cenário é o seguinte: mais de 80% das pessoas fundadoras de startups são homens ou, quando em sociedade, majoritariamente homens e as empresas estão massivamente localizadas nas regiões sudeste e sul (77,6%).

Curiosamente, quando perguntadas sobre o tema, a maioria das startups (96,8%) afirma que apoia a diversidade.

Por outro lado, o número de pessoas fundadoras que se autodeclaram pardas é bastante significativo: 55,1% do total.

O segundo destaque se relaciona ao perfil das empresas.

Se pudéssemos criar uma persona sobre a startup mais comum no Brasil ela atuaria no setor B2B (business to business, 49,5%), muito provavelmente nas áreas de educação (11,5%), saúde (9,4%) ou finanças (8,5%) e teria uma equipe de até 5 pessoas (51,3%).

Outros dados chamam a atenção: uma parte considerável das empresas ainda não tem faturamento (27,1%), não tem qualquer negócio no exterior (82,2%) ou solução patenteada (83,1%).

Como não poderia ser diferente, as descobertas sobre investimento e captação de recursos são o terceiro destaque do estudo. E elas são surpreendentes: 64,8% das startups nunca receberam nenhum tipo de recursos de investidores.

Dentre aquelas que alcançaram algum tipo de apoio financeiro, 83,2% vieram na forma de investimento-anjo, capital semente (conhecido como seed-money) e programas de aceleração.

E os apoios são modestos: 28,9% receberam entre R$ 50 e R$ 250 mil.

Uma interpretação dos dados

O levantamento aponta para um ecossistema brasileiro pujante, mas ainda em amadurecimento.

Os dados também indicam quais são as principais alavancas que precisam ser acionadas para avançarmos: investimentos, internacionalização e desenvolvimento tecnológico.

Todas elas são estruturais e dependem da atuação conjunta de diversos atores e setores, incluindo público e privado.

Ecossistemas internacionais de referência, como o do Vale do Silício, eleito reiteradas vezes como o líder global do setor pela Startup Genome, reforçam ainda mais a importância de ações direcionadas a essas três alavancas:

  • Em 2021, a região, que fica no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, contou com US$ 22 bilhões em investimento para startups em fases iniciais (chamadas de early stage);
  • Ela também se tornou referência internacional em inovação, atraindo, inclusive, filiais empresas bem estabelecidas;
  • E é o lar de grandes universidades, especialmente Stanford, cujos ex-alunos são responsáveis, anualmente, por surpreendentes 4% do PIB mundial (ou US$ 3 trilhões anuais).

Reconhecer os desafios de nosso ecossistema de startups é fundamental para impulsioná-lo.

Mas é preciso começar já.

As startups são fundamentais para o desenvolvimento tecnológico do país e o crescimento desse setor ditará se, nos próximos anos, podemos alcançar o status de referências internacionais na oferta de soluções digitais.

Não tenho dúvidas de que temos expertise, tino empreendedor e capacidade para isso.