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Profissionais de TV buscam emprego em Portugal após cortes na Globo

Jailson, Maria Carolina e Thyago vivem em Portugal - Arquivo Pessoal
Jailson, Maria Carolina e Thyago vivem em Portugal Imagem: Arquivo Pessoal

Wagner Matheus

Colaboração para Splash, em Portugal

30/04/2022 04h00

Nos últimos dois anos, a TV Globo deu início a uma onda de demissões e cortes orçamentais nunca registrados desde a inauguração da rede, em abril de 1965. Dezenas de artistas famosos e nomes icônicos da teledramaturgia da emissora já não são mais vistos pelas dependências dos Estúdios Globo.

As reduções drásticas no número de funcionários da segunda maior emissora de televisão do mundo não tem se limitado aos rostos famosos e conhecidos. Por detrás das telas, dezenas de funcionários e prestadores de serviços, também encarregados de dar vida a roteiros, foram incluídos nas ondas de demissões.

Para alguns desses integrantes de equipes de produção, Portugal passou a ser uma alternativa incerta de recolocação profissional em meio à falta de perspectiva profissional no Brasil, seguindo os passos de artistas famosos.

O idioma em comum, e a já consolidada parceria luso-brasileira em novelas, tem sido fundamentais na mudança definitiva para o país europeu.

Em julho do ano passado, O maranhense Jailson Mattos, 42, decidiu morar em Lisboa, após ter trabalhado como produtor, por 21 anos, na TV Globo, e outros quatro anos na Band e Record.

"Depois de ter integrado a equipe, no Marrocos, da macro série 'Jezebel', da Record, passei algumas semanas em Portugal antes de tomar a decisão da mudança. Não foi um ato impulsivo. Sondei o mercado local, consegui me reunir com diretores de emissoras de TV sediadas em Lisboa. Fui muito bem recebido e pressenti que tinha conseguido abrir portas. A falta de perspectiva de trabalho durante a pandemia pesou muito. Portugal já começava a dar sinais de retomada de produções e, sem hesitar, troquei o Rio de Janeiro pela capital portuguesa", lembra.

Jailson afirma ter certeza de que os trabalhos em importantes produções de novelas na Globo e na Record fazem a diferença frente a outros profissionais na contratação.

"Hoje, sou freelancer para a RTP (Rede de Televisão Portuguesa), onde fiz produção da série O Crime do Padre Amaro, participei da produção do show do Kevin o Chris, cantor e compositor brasileiro de funk carioca, em Lisboa, fiz a assistência de direção do filme espanhol De Perdidos a Rio, gravado no Rio de Janeiro, Madrid e Lisboa, e faço produções de comerciais para a TV e a internet. Meu escopo de trabalho ampliou muito aqui. Fiz a escolha certa", ressalta o maranhense, formado em publicidade e propaganda.

O caracterizador Thyago Mandu, 32, deixou o Brasil em outubro de 2019, depois de trabalhar três anos nos Estúdios Globo. Um ataque homofóbico na Avenida Paulista, durante um trabalho em São Paulo, foi fundamental para ele trocar o Rio de Janeiro por Lisboa.

Na capital portuguesa, o baiano de Salvador, se sentiu protegido nas ruas e, profissionalmente, seguro para começar a realizar o sonho de empreender no setor de Beleza.

Assim que cheguei, procurei trabalho imediatamente. Poucos dias depois, a RTP me chamou. O salário, naquele momento, não era tão atraente. Decidi trabalhar em um salão de beleza, que teve de fechar por causa da pandemia. Em seguida, a TV SIC passou a me chamar para trabalhos pontuais. Meus trabalhos aumentaram e, hoje, presto serviço para vários programas e telenovelas, em geral, com trabalhos para os grandes nomes da emissora. Thyago Mandu

Paralelamente, ele atende clientes portugueses e estrangeiros, previamente agendados, dentro de um SPA em Lisboa. Thyago faz o trabalho nas poucas horas livres que tem e quer investir em uma agência de maquiadores, atividade que tem crescido muito em todo o mundo. Na Globo, trabalho na série Desalma, na novela "Pega-Pega", no "Domingão do Faustão" e no "Big Brother Brasil", entre outros núcleos da emissora brasileira.

A figurinista brasiliense Carla Reis, 54, trabalhou na Central Globo de Produções de 1999 a 2020. Ao longo de 21 anos dentro dos estúdios de gravações da emissora carioca, ela fez parte, entre outros, da produção do programa "Estrelas", apresentado por Angélica, e a última edição do folhetim infantil "O Sítio do Pica-Pau Amarelo" e a série "Filha de Eva", estrelada pelas atrizes Renata Sorrah e Giovanna Antonelli.

No mesmo ano que saí da Globo eu resolvi me fixar em Portugal, país que já conhecia. Minha intenção aqui nunca foi de recolocação profissional. Tenho outras metas profissionais, focadas nos setores de publicidade, seriados e cinema. No momento, estou na equipe de produção de um comercial para um dos maiores grupos de restaurantes internacionais. Carla Reis

Paralelamente, ela investe na paixão pela gastronomia e fornece refeições vegetarianas para filhos de amigos em escolas particulares da região de Lisboa: "A pandemia impulsionou o negócio, devido ao fechamento obrigatório das cantinas nas instituições de ensino no país. Até mesmo a Heloísa Perissé foi minha cliente durante os dias em que ela encenou a peça Te Adoro, aqui na capital, no final do ano passado", afirma Carla.

Maria Carolina Melo, 40, é carioca. Apesar de ser formada em jornalismo, trabalhou, por 11 anos, na TV Globo em equipes de produção de novelas e programas especiais da emissora, de onde saiu há dois anos para recomeçar a vida profissional no Porto, norte de Portugal.

"Foram mais de uma década como funcionária. Entrei em 2008 para participar de uma oficina de produção. Meu desempenho me fez ser chamada imediatamente para a novela Favorita. Logo depois, integrei o núcleo do Criança Esperança. Voltei às novelas em Viver a Vida. Fiz Roberto Carlos em Jerusalém e uma série de outras novelas, entre elas, Malhação, Liberdade Liberdade, Força do Querer e A Dona do Pedaço. Em 2019, deixei a emissora e troquei o Rio pelo norte de Portugal", diz Maria Carolina.

A produtora conta que, por vezes, chega a sentir falta da rotina no Brasil, mas nada que a faça desistir de buscar novas experiências profissionais em terras portuguesas.

"Poucos meses depois da minha vinda, consegui trabalhar em uma assessoria de imprensa portuguesa. A princípio, tive um pouco de dificuldade com a gramática usada aqui. Mas consegui contornar a barreira. Meu contrato não foi renovado devido à pandemia. No momento, estou me estruturando trabalhar com prestação de serviço de produção e consultoria de audiovisual, teatro, workshops e assessoria de imprensa a fim de atender empresas brasileiras e portuguesas", afirma.