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Ideia de jovem chileno diminui lixo eletrônico e promove acesso à educação

Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Carolina Vellei

Colaboração para Ecoa, de São Paulo

10/07/2021 06h00

Na sua casa existe algum celular antigo, parado em uma gaveta, pegando pó? Nas mãos de um jovem chileno de 17 anos, esses smartphones começaram a ganhar uma nova vida ao serem consertados e doados para crianças que estavam sem acesso às aulas online. Com o projeto "Collecting Dust" ("coletando poeira", em inglês), Tiberio Malaiu uniu sua paixão por tecnologia ao desejo de ajudar quem não possuía um dispositivo móvel para estudar em casa.

Em janeiro de 2021, ele começou o projeto sozinho ao perceber a carência tecnológica em seu país. Ele também sabia que muitas pessoas compravam smartphones novos e descartavam os antigos que ainda poderiam ser úteis. No começo, recebia doações de pessoas próximas e, após consertar os aparelhos, procurava escolas para oferecê-los às crianças de baixa renda. Com o tempo, diretores escolares começaram a recomendar seu projeto e a procura aumentou.

Com a ajuda de amigos, Tiberio ampliou sua equipe e montou uma página no Instagram para coletar doações. A iniciativa aceita celulares com sistema operacional a partir do iOS 5 ou Android fabricado nos últimos cinco anos. Essa exigência, segundo o grupo, é pela necessidade de rodar aplicativos específicos para acompanhar as aulas, como o Google Classroom, Zoom, Google Meet, WhatsApp e outros.

A pandemia e a educação

Desde o início da pandemia, o setor educacional foi uma das áreas que mais sofreram impacto com a necessidade de manter o distanciamento social. A escola, em seu formato remoto, trouxe desafios não apenas pela distância entre professores e alunos, mas também pela dificuldade financeira de muitas famílias.

A ausência de equipamentos eletrônicos permanece como uma das principais barreiras ao acesso das crianças mais pobres às aulas online. Dados do Ministério da Educação do Chile revelaram que mais de 186 mil alunos de 5 a 21 anos abandonaram a escola em 2020, a maioria oriunda de famílias sem acesso a um dispositivo.

Tiberio e seu grupo consertando os dispositivos que serão doados a estudantes - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Tiberio e seu grupo consertando os dispositivos que serão doados a estudantes
Imagem: Arquivo pessoal

Um balanço recente mostrou que o grupo já consertou mais de 80 celulares. O estudante admite que gostaria que esse número fosse maior, mas explica que, dentro das possibilidades atuais, é o máximo que conseguiram fazer - especialmente porque ainda precisam cumprir as próprias tarefas escolares. "Fazemos isso puramente como voluntários, em nosso tempo livre, nos finais de semana e depois da escola", contou à reportagem de Ecoa.

Atualmente, o projeto funciona com a ajuda de nove jovens, todos eles estudantes do Ensino Médio com idade entre 15 e 18 anos. Tiberio explica que muitas outras pessoas já manifestaram interesse em participar depois que sua ideia foi divulgada nas redes sociais e nos jornais. O problema é que, para ensiná-los a consertar os celulares, os colaboradores atuais teriam que se reunir presencialmente com os novos integrantes e, com a forte onda de covid enfrentada pelo Chile, isso ainda não é possível. Por isso, o treinamento da nova equipe tem sido feito aos poucos.

Tiberio não esperava que o projeto pudesse alcançar tanta repercussão, mas sabia que teria bons resultados. "Senti desde o início que o que estava fazendo era uma iniciativa muito boa, pois eu mesmo, como aluno, já sabia como é importante ter um dispositivo adequado para acompanhar as aulas", explica.

Para o futuro do projeto, o jovem chileno já planeja os próximos passos. No momento, ele está em busca de uma empresa que possa virar parceira do grupo para que, juntos, consigam alcançar mais crianças. "Seria muito bom se pudéssemos fazer uma aliança com uma grande empresa ou fundação para termos mais apoio logístico e gente treinada para ajudar a ter um impacto ainda maior", diz.

Incentivo da família

Sua mãe, a artista plástica Sofia Donovan, costuma incentivá-lo a seguir com suas ideias e a agir ativamente em busca de soluções para problemas que percebe no dia a dia. Ainda assim, ela admite que tanta repercussão a pegou de surpresa. "Tiberio sempre foi uma criança curiosa e inquieta. Está sempre inventando coisas, aprendendo novos assuntos, por isso achei que esse projeto seria mais um dos muitos em que ele embarca", revelou a Ecoa.

Sofia conta que a atitude do filho teve um grande impacto na vida de outras pessoas, além das crianças beneficiadas pelo projeto. "Eu vi como as pessoas responderam, generosamente doando seus telefones celulares e se oferecendo para ajudar", diz.

Segundo ela, a ideia se espalhou e foi replicada por uma operadora de telefonia chilena, que começou a receber equipamentos para consertar e doar. Outras empresas, entre elas uma revendedora de equipamentos para manutenção de smartphone, também já entraram em contato com o grupo para oferecer treinamento e ferramentas.

Tiberio sabe que no Brasil também há muita desigualdade social. Para quem deseja testar sua ideia por aqui, ele aconselha que a pessoa toque o projeto com paixão e convicção, pensando sobretudo nas crianças que mais precisam. Além disso, ele lembra que a atitude estaria ajudando não apenas as crianças em idade escolar, mas também o próprio planeta, "reciclando tanto lixo eletrônico que temos".