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Milo Araújo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Ghost Bikes: Uma homenagem que poderíamos evitar

Ghost Bike em Nova York - Divulgação/ghostbikes.org
Ghost Bike em Nova York Imagem: Divulgação/ghostbikes.org

20/02/2022 06h00

Nessas últimas semanas, as notícias não foram nada agradáveis para nós ciclistas e nossos familiares. Tivemos pelo menos três ocorrências de ciclistas atropelados e brutalmente mortos. Em todos os três casos, os motoristas que provocaram os acidentes, quer dizer, os assassinatos, estavam visivelmente alcoolizados, dirigindo em alta velocidade, conforme dito pelas testemunhas que estavam presentes no momento dos atropelamentos. E ainda um deles nem tinha CNH, licença que permite pilotar veículos motorizados. Nas três ocorrências os irresponsáveis motoristas foram presos em flagrante. Mas, assim como muitos outros causadores de terríveis fatalidades como estas, foram soltos e irão responder em liberdade.

No último domingo, vários grupos de ciclistas de São Paulo se reuniram para uma manifestação em um dos locais onde houve atropelamento, em São Bernardo do Campo, para fixarem uma Ghost Bike, ou "bicicleta fantasma", no local. Eis que, para surpresa do grupo, veio o aviso de que naquele momento estava acontecendo outra fatalidade no km 15 da Rodovia dos Bandeirantes. Mais um ciclista sendo brutalmente ceifado de sua vida. Outra Ghost Bike a ser instalada.

As Ghost Bikes são bicicletas brancas instaladas em locais que tiveram acidentes fatais envolvendo ciclistas. É um memorial que tem como objetivo evitar que a morte que ocorreu naquele local caia no esquecimento. Uma homenagem a quem perdeu a vida para a pressa de alguém, para a falta de planejamento viário, para a omissão do poder público e do nosso falho sistema jurídico em que se alega que no Código Brasileiro de Trânsito não existe dolo em acidente de trânsito.

Esse tipo de ação é realizado em todo o mundo e também aqui no Brasil. Infelizmente, em São Paulo, já foram instaladas dezenas delas. As Ghost Bikes servem para alertar os condutores de automóveis para que tomem mais cuidado com as vidas que pedalam pelas ruas. Ajudam a lembrar que os ciclistas também têm o direito de ir e vir e de utilizar as vias assim como qualquer veículo. Lembram aos motoristas que um ciclista é uma pessoa e não um obstáculo a ser transposto. Uma pessoa que como ele tem família, amigos, filhos, amores e sonhos.

A primeira Ghost Bike de São Paulo foi instalada no final de 2007, na Av. Luis Carlos Berrini, um dos principais eixos comerciais e de negócios da cidade, na região do Itaim Bibi. Pendurada em um poste, a bicicleta branca não foi bem recebida pela elite financeira da região e foi removida no dia seguinte. Era feia, ruim para os negócios, não combinava com o bairro. Não se tem o conhecimento do nome do ciclista que ali faleceu. Atualmente, a Avenida Berrini possui uma ciclovia de canteiro central, que poderia ter protegido a vida do ciclista que morreu ali.

Segundo o site ghostbikes.org, a bicicleta fantasma foi criada em 2003 em St. Louis, Missouri, nos Estados Unidos. O site mostra que todos nós enfrentamos diariamente as mesmas ruas inseguras ao redor do mundo.

Assim como os criadores do movimento, espero que esses memoriais promovam discussões necessárias para o bem da população, tornando as ruas seguras para que um dia não seja mais necessário esse tipo de homenagem.