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8 meses após estupro em rodeio, jovem fala de depressão: 'Insônia e choro'

Imagem: Acervo pessoal

Franciane Andrade em depoimento a Rute Pina

De Universa, em São Paulo

22/07/2022 11h57Atualizada em 24/07/2022 18h11

Oito meses após ser estuprada em novembro do ano passado um rodeio em Jaguariúna, interior de São Paulo, a estudante de veterinária e influenciadora Franciane Andrade, 23 anos, que foi dopada e não lembra do crime, luta contra a depressão e tem dificuldade de retomar sua rotina. 'Só terei paz quando acharem agressor', diz em entrevista a Universa.

Sem respostas sobre o inquérito e sem abertura de ação penal já que o autor do crime ainda não foi identificado, Franciane fala sobre as consequências emocionais e um trauma muito grande. "Tem dias que eu só fico dormindo. Não tenho vontade de levantar da cama e nem forças. Em outros, não consigo dormir à noite", conta.

A seguir, Franciane compartilha como tem sido seus dias desde o crime:

Influencer estuprada em rodeio: 8 meses depois

"Desde tudo o que aconteceu, não tenho mais vontade de fazer nada. Sabe quando parece que te arrancaram tudo? Minha vida mudou completamente. Tem dias que eu só fico dormindo. Não tenho vontade de levantar da cama e nem forças. Também não consigo dormir à noite.

Ligo para as advogadas todos os dias quase para saber se teve algum andamento no processo, porque, para mim, é muito lento. Elas sempre me explicam tudo, o ritmo e o andamento do processo.

Fico tão indignada em casa que às vezes eu vou pessoalmente até a delegacia também para ver como está o inquérito. Mas eles tratam a gente muito mal — e olha que é uma delegacia da mulher. Eu acho um descaso, essa demora, porque a vítima fica aqui, na ansiedade, na expectativa de que encontre algo, que façam algo, que faça justiça.

Mudei de casa com a minha família. Morávamos numa chácara, mas ficamos com medo mesmo, das ameaças. Fui muito ameaçada na internet, recebi comentários como 'vocêtá preparada para outro estupro?' ou 'você é muito atriz da Globo, você é mentirosa e seu caso vai ser arquivado'. Então ficamos com medo e voltamos para a cidade.

É um trauma muito grande, difícil de falar. O mais difícil de você passar por um crime desse é que as pessoas julgam muito a vítima de violência sexual. Fiquei inconsciente. Não sabia que eu tinha sido abusada. Só comecei a sentir dor na segunda-feira, quando eu cheguei da festa, eu não senti nada.

Você tenta retomar a sua vida, aí as pessoas começam a falar coisas 'olha lá, já está saindo' ou 'nossa, já está bem'. Mas não é tão simples assim. Até agora, só consegui ir em três eventos porque eu só saio de casa quando tenho algum trabalho. É muito raro eu sair, que eu morro de medo. Não me sinto segura.

No primeiro evento, me senti mal, queria voltar embora, chorei. Era um aniversário da e show de uma dupla sertaneja que sou muito fã, grandes amigos meus. Meus pais me levaram até lá, sabia que eu estava junto com eles e que ia ser tranquilo. Mas fiquei muito nervosa, muito nervosa mesmo.

Acho que isso é medo de acontecer de novo. Ter sido alguém que sabe da minha vida, da minha rotina, que sabe o horário que eu pego, o horário que eu vou para faculdade. Eu tenho medo de ser uma pessoa que já sabe alguma coisa da minha vida.

Vou para a faculdade, meus pais me esperam até eu entrar na van. Não fico nem no campus andando: quando chega o horário de embora já vou correndo para a van e volto para casa.

Foi muito difícil a retomada das aulas porque as pessoas fizeram muitas piadinhas, me chamam de mentirosa. Perdi muitos amigos na faculdade, muita gente mesmo — porque as pessoas julgam muito e se afastam ou porque eu mesma me fechei um pouco também.

Ninguém avisou na sala de aula que eu tinha passado, para avisar e instruir os colegas de sala. Fiquei vários dias sem ir para a faculdade no primeiro semestre, tive bastante faltas. Mas consegui atestados psicológicos.

As pessoas olham para você de uma forma diferente. Tenho crise de pânico dentro da sala e as pessoas riem. Muitas vezes tenho que sair da aula porque estou chorando. Não consigo focar.

Também perdi parcerias, muitos patrocínios, muita gente virou as costas para mim no trabalho nestes meses. Não fui chamada nem para fazer provador loja mais, que era uma coisa frequente assim na minha vida.

Mesmo com três laudos é comprovando a violência sexual, mesmo com todas as comprovações do laudo toxicológico positivo para benzodiazepínicos, as pessoas ainda desacreditam da vítima.

Tenho minha psicóloga, do projeto Justiceiras. E o que me faz bem também é conversar com a Helô [Gomes, influenciadora], que me entende que ela passou um caso de agressão parecido. Costumamos conversar de madrugada quando tenho crise de pânico. Isso tem me ajudado: conversar com ela, andar a cavalo, que eu gosto muito, e ficar em casa com meus pais, onde me sinto segura.

Eu só vou ter paz quando acharem o agressor. Me sintomuito impotente por causa disso

Isso que eu procuro: justiça. Quero que a pessoa que fez isso e pague, não fique impune. Acho que, assim, ficarei mais tranquila."

Polícia coleta provas e tenta identificar autor do crime

Oito meses após o crime, o caso de Franciane está em fase de inquérito policial, sem abertura de ação penal já que o autor do crime ainda não foi identificado. A advogada Izabella Borges, que faz a defesa da estudante ao lado da advogada Luciana Terra, afirma que as investigações são de ordem complexa, já que envolvem perícias de todas as câmeras de segurança do local da noite do evento e de aparelhos eletrônicos da Franciane que podem fornecer informações com precisão sobre os locais por onde a vítima esteve durante o evento.

A advogada explica que a Justiça determinou a perícia das câmeras por empresa especializada sem ônus financeiro à vítima só recentemente. "Isso significa que, além da perícia realizada pela polícia, as imagens das câmeras também serão analisadas por peritos com expertise específica", explica Izabella.

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