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Entenda a guerra comercial envolvendo a Huawei, os EUA e prisão de diretora

Meng Wanzhou, executiva da Huawei presa no Canadá Imagem: EPA

Márcio Padrão

Do UOL, em São Paulo

11/12/2018 16h44Atualizada em 12/12/2018 10h00

Desde que a diretora financeira da Huawei, Meng Wanzhou, foi presa no Canadá no início de dezembro, grande parte do público ocidental --incluindo o brasileiro-- se faz uma série de perguntas. O que é Huawei? Por que essa executiva foi presa? Por que esse caso está repercutindo tanto?

Wanzhou continua presa no Canadá a pedido dos Estados Unidos, porque ela teria usado, há alguns anos, uma empresa ligada à Huawei como fachada para acordos comerciais com o Irã, país que sofre sanções comerciais dos EUA.

Ainda há poucas informações sobre as acusações, mas o contexto leva a crer que não se trata apenas de uma simples prisão de uma executiva por fraude. Na verdade, o acontecimento está no centro de uma guerra comercial dos EUA com a China, que dura anos e se tornou mais acirrada na gestão de Donald Trump.

Vamos às principais perguntas sobre o caso.

O que é a Huawei e por que ela importa?

A Huawei foi fundada em 1988 em Shenzhen, na China. Seu foco é fornecer equipamentos para redes e telecomunicações, e se tornou a maior do mundo neste ramo, ao superar a sueca Ericsson em 2012. Mas nos últimos anos, tornou-se também a segunda maior fabricante de celulares do mundo, passando a Apple e ficando atrás apenas da Samsung.

No Brasil, a empresa não aparece tanto, por não vender smartphones, mas aqui vende equipamentos de infraestrutura de internet para operadoras grandes, como Vivo, Tim, Claro e Oi, além de empresas menores.

Quem é a diretora da Huawei que foi presa?

Meng Wanzhou é diretora financeira da Huawei e também filha do fundador da empresa, Ren Zhengfei. Ela ainda acumula o cargo de vice-presidente do conselho consultivo da empresa. Ou seja, é definitivamente um "peixe grande" da companhia.

Quando Wanzhou estava em um voo em Vancouver, no Canadá, foi provisoriamente detida em 1º de dezembro pelas autoridades do país em nome dos EUA, que por sua vez pediram a extradição dela para enfrentar acusações da Justiça norte-americana. A divulgação da prisão só ocorreu dias depois, no dia 5 de dezembro.

Por que ela foi presa?

John Gibb-Carsley, um advogado do Departamento de Justiça do Canadá, detalhou a acusação ao "The New York Times". Entre 2009 e 2014, a Huawei teria usado uma empresa de Hong Kong, a Skycom Tech, para fazer transações no Irã e fazer negócios com empresas de telecomunicações de lá, em violação às sanções americanas.

Trump restabeleceu no mês passado todas as sanções dos EUA contra o Irã, que estavam suspensas desde 2015.

Bancos dos EUA liberaram transações financeiras para a Huawei, que estava fazendo negócios com as empresas iranianas pela Skycom. Por isso, se a denúncia se comprovar, os bancos foram "vítimas" de fraude por Meng, disse Gibb-Carsley.

Em comunicado, a empresa afirmou que cumpriu "todas as leis e regulamentações aplicáveis onde opera, inclusive as leis e regulamentos de controle de exportação e sanções da Organização das Nações Unidas (ONU), Estados Unidos e União Europeia".

O que a Huawei tem a ver com espionagem?

No início deste ano, seis chefes das principais agências de segurança dos Estados Unidos, incluindo aí CIA, FBI e NSA, disseram a um comitê de inteligência do Senado americano que existe risco de espionagem em celulares fabricados pela Huawei.

O fundador da Huawei e pai de Meng Wanzhou, Ren Zhengfei, é ex-engenheiro do Exército de Libertação do Povo, que tem uma conexão com o Partido Comunista Chinês. Isso contribuiu para as suspeitas das agências de inteligência dos EUA.

Christopher Wray, diretor do FBI, disse se preocupar com os riscos de permitir que companhias ligadas a governos estrangeiros ganhe posições de poder em redes de telecomunicações dos EUA. "Isto permite a capacidade de exercer pressão ou controle sobre nossa infraestrutura, de modificar maliciosamente, roubar informações ou conduzir espionagem sem detecção", disse.

Em 2011, o Departamento de Defesa dos EUA alertou sobre uma conexão de risco entre a companhia e as forças militares da China. Um relatório do Comitê de Inteligência da Câmara, emitido em 2012, corroborou esta preocupação. Em 2013, o ex-diretor da CIA (Agência Central de Inteligência) e NSA (Agência de Segurança Nacional) Michael Hayden declarou que "não é preciso nem dizer" que há uma relação íntima entre a Huawei e o governo chinês.

A resposta da empresa: "A Huawei está ciente das diversas atividades do governo americano com o aparente objetivo de inibir seus negócios no mercado do país", declarou um representante em fevereiro.

Qual é a relação disso com a ZTE?

O Departamento de Comércio proibiu em abril que empresas norte-americanas como Qualcomm, Microsoft e Intel vendessem componentes para outra chinesa também da área da telecomunicação, a ZTE. Assim como a Huawei, ela também foi acusada de infringir o embargo ao Irã.

A ZTE se declarou culpada no ano passado em um tribunal no Texas por embarcar ilegalmente produtos e tecnologia dos EUA para o Irã. A empresa pagou US$ 890 milhões em multas e penalidades, e uma multa adicional de US$ 300 milhões.

Como parte do acordo, a ZTE prometeu demitir quatro funcionários e impor sanção disciplinar a outros 35, seja reduzindo seus bônus ou repreendendo-os. Mas a empresa chinesa admitiu em março que, embora tenha demitido os quatro funcionários, não havia tomado nenhuma ação. Em maio, um novo acordo acabou com as sanções dos EUA à ZTE, que aceitou pagar uma nova multa de US$ 1,19 bilhão ao governo americano

Apenas os EUA estão com pé atrás?

Alguns países ocidentais receiam que a China tenha acesso à rede móvel de quinta geração (5G) e a outras redes de comunicação por meio da Huawei e amplie sua suposta capacidade de espionagem.

As preocupações de segurança levaram a British Telecom (BT), que domina a rede de telecomunicações do Reino Unido, a descartar o uso da infraestrutura da Huawei na base da rede 5G que está sendo implantada no país.

A Nova Zelândia proibiu a utilização de equipamentos da companhia por questões de segurança nacional, depois que a Austrália impôs um veto similar tanto à Huawei quanto à empresa de telecomunicações chinesa ZTE. E o Japão também falou recentemente em proibir compras governamentais de equipamentos da Huawei e ZTE.

Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Reino Unido são parte da aliança conhecida como "Five Eyes" (Cinco Olhos, em inglês), feita para cooperação em inteligência.

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Por que se fala em guerra comercial?

Há tempos que a China reclama que os EUA são injustos com suas grandes firmas de tecnologia, em particular a Huawei, que é a empresa chinesa que mais se aproxima de ser concorrente importante da Apple.

A prisão da executiva da Huawei foi no mesmo dia da "trégua" negociada no encontro do G20 --as 20 maiores nações do mundo em termos econômicos-- entre China e EUA. 

Trump se comprometeu a não elevar mais a alíquota de importação sobre US$ 200 bilhões de produtos chineses de 10% a 25%, enquanto o presidente da China, Xi Jinping, disse que aumentaria a compra de produtos dos EUA.

É claro que a prisão foi um balde de água fria neste acordo. "Banir empresas chinesas como a Huawei vai isolar os EUA da economia digital do futuro", diz uma manchete recente do The Global Times --o jornal estatal chinês.

Espera-se mais dificuldades de mercado para as gigantes americanas de tecnologia, que conseguiram estabelecer presença na China. Cerca de 20% das receitas do ano passado da Apple, por exemplo, vieram de lá.

"O fracasso em garantir uma abertura recíproca significa que as empresas deles não receberão qualquer benefício da economia digital da China", sentenciou o jornal chinês.

Enquanto Meng Wanzhou aguarda por uma decisão de um juiz canadense para responder ao processo em liberdade, nesta terça-feira (11) o ex-diplomata canadense Michael Kovrig foi detido na China. Não ficou claro de imediato se os casos estão relacionados, mas a prisão de Wanzhou  tem provocado temores de represálias contra a comunidade empresarial estrangeira na China.

De acordo com o jornal "South China Morning Post" de segunda (10), a Menpad, empresa responsável pela fabricação das telas LCD usadas nos smartphones da Huawei, anunciou que irá multar qualquer um de seus funcionários que comprar um iPhone. A multa será do mesmo valor pago pelo funcionário no celular. A regra já está em vigor.

* Com agências internacionais

Errata: este conteúdo foi atualizado
O pai de Meng Wanzhou é o fundador da Huawei, Ren Zhengfei, e não o diretor executivo da empresa, Richard Yu, como foi informado anteriormente em um dos parágrafos.

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