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Meu primeiro véu muçulmano: "Parecia que eu o usava há anos"

Évelyn Martins Imagem: Arquivo Pessoal

Évelyn Martins, em depoimento para Natália Eiras

Colaboração para Nossa

28/03/2022 04h00

Évelyn Martins

Profissão

Autônoma

Minha roupa com história

Primeiro véu que usei após me converter ao islamismo aos 16 anos

"Eu me converti ao islamismo há seis anos. Por causa de um trabalho de escola, comecei a estudar o Alcorão. Estava procurando uma religião e me identifiquei com o que o livro sagrado dizia.

Há muitas divergências das práticas que vemos as pessoas fazendo do Alcorão e percebi que há muitas coisas que são políticas e culturais. Porém, o que ele diz é fazer o que te faz bem e, o que não faz, deixar de lado. Isso fazia sentido para mim. Não fui acolhida pela comunidade religiosa brasileira por várias questões, mas fui bastante acolhida pelo Alcorão, pela Mesquita.

Decidi usar o véu em 2018, dois após a minha conversão, porque estava fazendo a transição capilar. Tive o cabelo curtinho e as pessoas zoavam muito. Principalmente quando saía de mãos dadas com uma mulher na rua. Não aguentava ir em uma festa e as pessoas começarem a puxar os meus cachinhos. Tinha amigos que faziam piadinhas.

O véu me salvou de sofrer bullying e intolerância. Ele me ajudou a não ter vergonha do meu cabelo e a não desistir da transição capilar."

No Alcorão, o véu, as vestimentas modestas tanto para homem como mulheres são um mandamento de Deus. A interpretação mais comum é de que se eu estou conversando com um homem, ele não deveria ficar reparando nos meus cabelos, no meu corpo, mas no que estou dizendo. Ele tem que olhar nos meus olhos.

Porém, no contexto histórico, o Alcorão foi revelado em uma época em que as pessoas nobres cobriam os corpos. A vestimenta do Islã veio justamente para elevar pessoas pobres ao mesmo nível dos ricos.

Comprei o meu primeiro véu pelo Mercado Livre. Uma moça muçulmana estava vendendo esse marsala e um preto. Como eu já tinha muitas roupas escuras, decidi ficar com o outro, mais arroxeado. Aqui no Brasil, é comum as mulheres usarem véus com muitas lantejoulas, strass, e nunca gostei.

Porém, quando vi este com detalhes dourados, achei muito bonito e diferente. Mesmo preferindo cores sóbrias, eu o escolhi porque sabia que nunca mais veria algo igual se eu não o comprasse.

Évelyn Martins na primeira foto feita com o véu, em 2018 Imagem: Arquivo Pessoal

A primeira vez que o vesti foi para fazer fotos. As pessoas já sabiam que eu tinha me convertido, então queria que elas me vissem com o véu.

Foi uma coisa muito louca, porque senti que meu rosto havia sido feito para usar o hijab. Combinou comigo logo de casa.

Foi muito natural usá-lo, parecia que eu sempre havia sido muçulmana. Eu me identifiquei muito com as vestimentas. Por isso digo que o véu faz parte de mim, parte da minha identidade visual. Fico bonita demais usando hijab (risos).

Não lembro quando ou para onde estava indo quando o usei pela primeira vez fora de casa. Porém, a roupa que estava usando ainda está na minha memória: calça jeans e uma camisa azul de manga longa. Estava muito bonita naquele dia. Nem sei como me achava feia."

Nem toda mulher muçulmana usa o véu. O uso tem, no entanto, muitos fatores sociológicos. Há meninas que crescem vendo a mãe cobrindo os cabelos para sair, a jornalista na TV com o véu. Ela percebe que, em um certo momento, terá que usar o hijab.

Há, ainda, uma pressão familiar e social. Eu saio de casa sem o véu quando me convém e sei que, em certos países, eu seria hostilizada por isso. Para mim é uma escolha, mas não é assim para todas as mulheres.

Até hoje eu uso o véu marsala, mas acabo optando mais por cores neutras como o preto, cinza e o vermelho escuro. Atualmente tenho, ao todo, 18 véus.

Para mim, o véu é um símbolo. Ele é muito cultural. Muda-se a amarração, as estampas de país para país. O tamanho dele, se cobre o rosto ou não. Hoje em dia vou para todo canto com ele. O hijab, para mim, é como se fosse parte do meu estilo. É parte do meu corpo. Só não o uso véu quando vou beber, fumar. Ele tem um peso religioso. Eu sou muçulmana e isso não diminui a importância dele para mim."

Como usar

Anos 70

O véu é uma vestimenta religiosa, porém, se gosta da estética, há formas de usar itens semelhantes sem ser desrespeitoso. Uma opção é o lenço pirata. A amarração tem pegada anos 1970 e deixa o visual elegante.

Lenço camponesa

Um visual que bomba no Tik Tok é o lenço camponesa. Dobre ao meio uma bandana ou acessório quadrado, formando um triângulo, e amarre por cima dos cabelos. Você pode deixar a franja aparente ou não.

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