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Aluguel de cozinhas compartilhadas é saída para empreendedores de delivery

O Hub Foodservice, em São Paulo, adota o sistema de cloud kitchen: cozinhas para alugar, com estrutura completa Imagem: Divulgação

Bruno Cirillo

Colaboração para Nossa

16/07/2020 04h00

O conceito de coworking (escritórios de uso coletivo) chegou à gastronomia — ao que tudo indica, para ficar. Cozinhas compartilhadas para alugar, também conhecidas como cloud kitchens, tornaram-se uma tendência entre empreendedores do ramo da alimentação. Em vez de investir em espaço próprio, negócios que fornecem comida para mercados, restaurantes e entrega a domicílio passaram a ser inquilinos desses locais.

No início do ano, a companhia Steam Cloud Kitchen, de capital aberto, anunciou que vai investir R$ 30 milhões na construção de 30 hubs culinários em São Paulo num período de cinco anos. Cada estrutura deve comportar de oito a doze cozinhas para locação. A inauguração da primeira delas, no Tatuapé, zona leste da cidade, está prevista para setembro deste ano e já tem 80% do espaço contratados.

"Cada hub será composto por múltiplas cozinhas em edifícios feitos exclusivamente para elas, de acordo com as normas e padrões do setor", explica um dos sócios-diretores da empresa, Fernando Dias. "O modelo é voltado para atender ao crescente mercado dos diversos aplicativos de delivery (Ifood, Uber Eats, Rappi etc), proporcionando redução de custo logístico, qualidade nos produtos e rapidez na liberação dos pedidos", acrescenta.

Cozinha do Hub Foodservice, originalmente criado para dar suporte a food trucks e startups Imagem: Amanda Gaspar/Divulgação
Além das cozinhas, os espaços são preparados para atender sistema de delivery Imagem: Divulgação

Há cinco anos no mercado de cloud kitchens, o StudioIno começou o negócio com um imóvel de três cozinhas em Perdizes, zona oeste de São Paulo, voltado para dar suporte a food trucks e startups que atuam na região, o Hub Foodservice. Em 2019, investiu na adaptação de outro edifício com mais dez cozinhas e estrutura para delivery, o Hub CK (cloud kitchen), no mesmo bairro. Hoje, o negócio tem 100% do espaço alugado.

Díris Petribu, diretora do StudioIno, há cinco anos no mercado de cloud kitchens Imagem: Divulgação
"Os nossos clientes são, na maioria, restaurantes já consolidados. Nem todos têm o delivery próprio. Alguns deles estão sediados em outros pontos da cidade. Como não atendiam à região oeste, decidiram alugar o espaço para ampliar o raio de atuação", conta a diretora da empresa, Diris Petribú. Além dos hubs que administra, o StudioIno é responsável pelos novos projetos de cloud kitchen da Steam e outros investidores.

Cliente da Hub CK há sete meses, o restaurante Da Mata Saladas, por exemplo, já tinha um espaço próprio no Brooklyn desde 2017, mas decidiu alugar uma cozinha "em nuvem" para ampliar sua operação. Focado no delivery de sopas e saladas, o negócio ampliou as vendas de 250 para 380 pedidos por dia, em média, com o novo ponto comercial. O custo médio do aluguel das cloud kitchens é de R$ 7 mil por mês.

É óbvio que o aluguel, num primeiro momento, assusta porque é um valor alto, mas quando você põe na conta que não precisa investir em equipamentos e não tem gasto com manutenção, acho que faz bastante sentido"
Caio Ciampolin

O dono do Da Mata, Caio Ciampolin, pretende abrir mais cinco pontos comerciais nos próximos anos, todos nesse modelo. "É um jeito de expandir mais rápido, com investimento inicial quase zero. Evita muita dor de cabeça", ele diz.

Projeto da Steam, que tem plano de criar 30 hubs culinários nos próximos anos: várias empresas de delivery no mesmo espaço Imagem: Divulgação

Diferenças

Também localizada em Perdizes, com duas cozinhas compartilhadas em um imóvel, a Oficina de Mesa existe desde 2016. Até este ano, o espaço só era utilizado para a fabricação de produtos armazenáveis, sem estrutura para delivery. Diferente dos hubs, que têm cozinhas exclusivas para cada um de seus clientes, o mesmo espaço é alugado por vários empreendedores em diferentes horários ao longo do dia.

Espaço da Oficina da Mesa: o empreendedor tem à disposição uma cozinha industrial completa Imagem: Divulgação
"A cloud kitchen é como uma sala privativa de coworking com estrutura de cozinha, tem 'senha' e fica reservada para o cliente, então é mais utilizada para delivery", pontua o dono do espaço, Edgard Aires. "Já a cozinha compartilhada permite a utilização do mesmo espaço por diferentes empresas, cada uma em seu horário, sendo mais voltada para a fabricação de comida, como marmitas, geleias e produtos congelados", explica.

O empresário conta que, neste mês, decidiu investir numa estrutura para a finalização e entrega dos produtos, no horário de pico dos pedidos, de quinta a domingo à noite. "A gente vai ser um intermediário entre cozinha compartilhada e cloud kitchen", diz Aires, que aproveita o espaço para fomentar novos negócios, no papel de incubador. A carteira de clientes da Oficina de Mesa conta com sete cases de sucesso, incluindo a produção de tofu, grãos, pães artesanais e massas orgânicas, entre outros alimentos.

As cloud kitchens são como uma sala privativa de coworking, mas com estrutura de cozinha Imagem: Getty Images

Empreendedores

A maioria dos clientes da Oficina de Mesa são empreendedores individuais e startups, a exemplo da Márcia Ramos Cozinha Funcional, focada em alimentos sem glúten, lactose e açúcar refinado. "Em 2017, abri um restaurante nos Jardins", lembra a empresária. "Em dois meses, estava girando 120 almoços por dia, mas o restaurante fechou — para começar um negócio desses, precisa de pelo menos R$ 100 mil", estima.

No ano seguinte, Márcia descobriu a cozinha compartilhada.

Eu já fazia marmitas há dois anos, em casa. A opção que eu tinha era essa. Fica todo mundo cozinhando numa cozinha gigantesca. Quando bati na porta do hub, vi que era o ideal. Na ponta do lápis, compensa mais do que um investimento"
Márcia Ramos

Íris Yazbek, da Meu Primeiro Alecrim, compensou as perdas de contratos durante a pandemia com entregas via aplicativos Imagem: Reprodução/Instagram @meuprimeiroalecrim
Já a empresária Íris Yazbek começou o negócio no mesmo espaço, entre 2018 e 2019, e depois resolveu comprar uma sede própria, também em Perdizes. "A cloud kitchen facilita porque tem tudo pronto, é um lugar para quem está começando, onde dá para experimentar bastante antes de dar o próximo passo", diz.

Até o início da pandemia do novo coronavírus, que pegou os empreendedores de surpresa, a Meu Primeiro Alecrim tinha contrato para fornecer comida para cinco escolas. Os contratos foram suspensos com o fechamento dos colégios. Por coincidência, Íris passou a trabalhar com aplicativos de delivery no mesmo período, compensando essa perda.

O mercado de entrega a domicílio movimenta R$ 11 bilhões por ano no Brasil, de acordo com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel). É nesse filão que as cloud kitchens se inserem, lembra o presidente da entidade, Percival Maricato. "É um setor que está sendo estudado do ponto de vista jurídico, econômico e sanitário. Temos um problema que é a concorrência, para que seja feita em condições de igualdade: para que as cloud kitchens tenham as mesmas condições tributárias do que outras cozinhas", pondera.

O mercado das cloud kitchens cresce globalmente a uma taxa de 20% ao ano Imagem: Getty Images

O modelo de negócio é inspirado no mercado da Índia, cresce globalmente a uma taxa de 20% ao ano e deve movimentar US$ 365 bilhões por ano até 2030, de acordo com um estudo do banco de investimentos UBS. "No nosso caso, tive contato com a ideia em uma viagem para Las Vegas", revela o sócio-diretor da Steam, atualmente responsável pelo principal investimento do negócio no Brasil.

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