Gabriel Leone vive piloto que marcou a história da Ferrari em tragédia

Há 67 anos, um acidente durante a Mille Miglia, uma tradicional corrida de estrada italiana, provocou a morte de dois competidores e nove espectadores — entre eles cinco crianças. A tragédia aconteceu após o estouro de um pneu do Ferrari 335 Sport Scagliettei, conduzido por Alfonso de Portago e o co-piloto Giuseppe Morandi.

Essa história é retratada no filme Ferrari, dirigido pelo norte-americano Michael Mann e lançado no ano passado. Quem vive o espanhol Alfonso de Portago é o brasileiro Gabriel Leone.

O percurso de mil milhas (1.609 quilômetros) tinha o formato do número oito e ligava as cidades de Brescia e Roma (ida e volta). A primeira edição da Mille Miglia aconteceu em 1927, mas os acidentes recorrentes e a Segunda Guerra Mundial impuseram uma pausa forçada até que o campeonato almejado por tantos pilotos foi retomado em 1947 e só acabou 10 anos depois, com a tragédia com o carro da Ferrari.

O grave acidente colocou uma mancha na imagem de Enzo Ferrari, que batalhava para ampliar seu império automobilístico aliando o esporte à empresa que vendia os carros. Meses antes da Mille Miglia, o italiano chegou a presenciar a morte do seu piloto oficial. Eis que surgiu, então, o espanhol Alfonso de Portago, a esperança da escuderia que precisava vencer a competição pela sobrevivência da Ferrari, ameaçada de falência.

Em conversa com o UOL, o ator Gabriel Leone falou sobre a construção do personagem que marcou a história do automobilismo mundial.

"O De Portago tinha esse lado jovem rebelde, mas ao mesmo tempo era um nobre, um marquês espanhol neto de um rei. Então, logo de cara, o Michael [Mann] queria que eu trouxesse essa juventude, fome de viver e essa sede por adrenalina que o personagem tinha, mas que tivesse também uma postura, e por isso ele sugeriu que eu fizesse aulas de dança clássica", explicou Gabriel.

Acidente com carro de Alfonso de Portago durante a Mille Miglia em 1957
Acidente com carro de Alfonso de Portago durante a Mille Miglia em 1957 Imagem: Mondadori Portfolio/Mondadori via Getty Images
Carro de Alfonso de Portago após o acidente em 1957
Carro de Alfonso de Portago após o acidente em 1957 Imagem: Bernard Cahier/Getty Images

Durante as gravações, o ator brasileiro visitou a fábrica da Ferrari e conheceu Piero, o segundo e único filho vivo de Enzo Ferrari. Gabriel também conduziu os carros que aparecem no filme, similares aos utilizados na época da Mille Miglia, justamente para dar o máximo de realismo possível ao longa.

Continua após a publicidade

Alfonso de Portago, personagem vivido por Gabriel, era uma promessa do automobilismo e rapidamente encantou Enzo Ferrari com a característica arrojada e persistente. A carreira do espanhol, porém, acabou cedo por causa do trágico acidente que o matou aos 28 anos. Após a explosão do pneu, o piloto foi atirado para fora do carro, que voou sobre os espectadores que acompanhavam a corrida.

O ator também destacou a evolução dos equipamentos e protocolos de segurança no automobilismo, porém lamentou que grandes mudanças só aconteceram após fortes tragédias.

"Eram as tecnologias e ferramentas de segurança que eles tinham disponíveis na época. Eu sei que eles não andavam de cinto, por exemplo, pela preocupação de o carro pegar fogo, explodir e eles estarem presos. Era uma escolha. Era um grande risco imaginar que uma batida que faria você voar e talvez tivesse a possibilidade ainda de fazer você sobreviver", comentou.

"Assim que as coisas funcionavam na época, mas sem sombra de dúvidas, infelizmente, esses grandes acidentes acabaram se tornando marcos de uma mudança nos meios de segurança no automobilismo. Tanto é que a Mille Miglia retratada no filme foi a última da história justamente por causa do acidente. É triste que essas mudanças não aconteçam de forma gradual, mas somente quando ocorrem tragédias que chocam", destacou Gabriel Leone.

Os riscos nas competições automobilísticas eram tão grandes que os pilotos costumavam deixar cartas aos entes queridos antes de partirem para as corridas.

"Uma estatística que vi em um documentário mostra que, naquela época, morriam 40 pilotos por ano. Isso reflete na cena das cartas dos competidores. Antes de cada corrida, eles já se despediam das pessoas, porque correr naquela época acarretava em uma possibilidade muito grande de você bater e morrer. Hoje em dia, a gente vê acidentes muito feios na Fórmula 1, e os pilotos saem, em sua maioria, ilesos. As tecnologias de segurança evoluíram muito e que bom", falou Gabriel.

Continua após a publicidade

Gabriel é Senna

O automobilismo virou recorrente na vida de Gabriel Leone. Coincidentemente, o ator brasileiro também dá vida a Ayrton Senna em uma cinebiografia da Netflix que será lançada ainda neste ano.

"Eu estava fazendo Ferrari na Itália um ano antes de rodar o Senna. Uma das últimas cenas que eu filmei do Ferrari foi em Ímola, no autódromo onde o Senna bateu e acabou morrendo. Foi muito emocionante", comentou.

"No meio dessa diária de filmagem, eu fui até a estátua do Senna e aí registrei uma foto caracterizado de De Portago. Foi simbólico, até porque eu sabia que em algum momento eu passaria esse bastão de um piloto para o outro. Fazer o Senna foi, sem sombras dúvidas, o grande desafio da minha vida. É uma honra, um orgulho muito grande. Eu cresci sabendo da dimensão do ídolo que ele representa para o nosso povo", destacou Gabriel.

Deixe seu comentário

Só para assinantes