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'Não existe liberdade mais ou menos', diz Carol Solberg

Jogadora de vôlei de praia Carol Solberg na praia de Ipanema onde treina com sua equipe - Ricardo Borges/Folhapress
Jogadora de vôlei de praia Carol Solberg na praia de Ipanema onde treina com sua equipe Imagem: Ricardo Borges/Folhapress

Do UOL, em São Paulo

30/11/2020 20h38

Absolvida na 2º instância do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) do vôlei por gritar "Fora, Bolsonaro" durante uma entrevista ao vivo na primeira etapa do Circuito Brasileiro de vôlei de praia, Carol Solberg comentou a repercussão do caso em uma entrevista a Associação Brasileira de Imprensa (ABI).

A atleta afirma que defende qualquer tipo de manifestação, e que a diferença no tratamento da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) entre a sua manifestação e o apoio de parte dos jogadores da seleção masculina, em 2018, ao então candidato à presidência Jair Bolsonaro a revoltou.

"Na primeira nota da CBV, pensei 'como pode?'Era exatamente a mesma coisa que tinha rolado com os meninos. Dois homens fazendo propaganda para o Bolsonaro nas eleições", lembrou. "Que fique claro: acho que estão certíssimos, no direito deles. O que me pareceu absurdo foi ser tratada de forma tão diferente por manifestações políticas após a partida".

Para Carol, o fato de ser mulher agravou o tom das ofensas em razão do posicionamento político. A postura do presidente do STJD, Otacílio Soares de Araújo, durante o julgamento, também incomodou. "O presidente do STJD disse que eu não estava lá [na entrevista após a partida] para dizer o que eu pensava, mas para dizer o que aconteceu no jogo. O que é isso? Ele falava comigo como seu eu fosse uma criança. Me senti muito ofendida, desrespeitada. Depois do voto dele, da maneira que se desenhou aquele voto, não tive dúvida que tinha que recorrer", conta.

Durante o julgamento do recurso de Carol Solberg, Araújo chamou a jogadora de 'senhorita'. "Esse cara para mim representa o machismo. Achei um tremendo desrespeito, ele queria me reduzir a uma garotinha. Eu sou uma mulher, tenho 33 anos. E eu tive que ficar quieta".

Perguntada sobre as manifestações políticas de outros atletas tomando como exemplo o jogador Felipe Melo, do Palmeiras, que abertamente apoia o presidente Bolsonaro, Carol defendeu a liberdade, mas condenou algumas atitudes.

"Eu acho que ele [Felipe Melo] está no direito dele, de dizer o apoio dele. Não existe liberdade mais ou menos. Mas acho que infelizmente o governo Bolsonaro, quando faz um sinal de arma, vai para um outro lugar, de ódio e violência. Não acho que seja ok. Jogador de futebol tem uma responsabilidade grande. Não consigo achar razoável", ponderou.

Na avaliação da jogadora de vôlei de praia, ninguém na CBV imaginou que o caso tomaria tal proporção. "Eles tomaram um susto", disse.

"Quando viram que não tinha para onde ir, que se fizessem uma grande injustiça comigo, a coisa ia esquentar mais ainda. E por causa da dimensão que a coisa tomou", opinou.

Silêncio entre os colegas

Segundo Carol, nenhum atleta quis debater o assunto após a denúncia. "Na primeira competição que eu fui jogar, ninguém falou sobre isso. Achei que seria uma possibilidade legal de debater, e não teve troca", contou.

"Mesmo com a minha absolvição, me dá uma sensação de que preciso ficar atenta, de que as regras podem piorar, podem colocar uma cláusula mais específica. Não vejo atletas querendo estar nesse lugar", avaliou.

"A coisa chegou em um ponto que não precisa entender de política, é coisa de humanidade. Eu quero me colocar no mundo, falar sobre o que acontece nao meu redor. Eu não vejo atletas querendo participar disso. (...) O atleta é muito voltado para si, tem essa competitividade que não cria uma união, mas é humano. Você não tá vivendo os problemas do mundo?", questionou.

"Vimos o que aconteceu em Porto Alegre com João Alberto, e em seguida o Mourão [Hamilton Mourão, vice-presidente] disse que não existe racismo no Brasil. E como nenhum atleta se posicionou, disse que não aceita? Hoje no futebol ainda tem o Richarlison. Mas, caramba. A gente não está falando de política, vote em fulano.São direitos humanos. Por que o atleta tem que estar alienado?".

Carol foi denunciada pela manifestação contrária ao presidente em 20 de setembro. Ela foi advertida com base no artigo 258, que trata de conduta antidesportiva. Na primeira instância, ela havia sido condenada por 3 a 2, e teve a multa convertida em advertência. A atleta optou por recorrer, e venceu no Tribunal Pleno por 5 votos contra 4.