Agora, um torcedor

Galiotte chega ao fim de seu mandato como presidente do Palmeiras com títulos e finanças em dia

Danilo Lavieri e Diego Iwata Lima Do UOL, em São Paulo NAYRA HALM/ESTADÃO CONTEÚDO

Um Campeonato Brasileiro, um Campeonato Paulista, uma Copa do Brasil e duas Libertadores. A gestão de Mauricio Galiotte conquistou um título para cada ano de seu mandato no Palmeiras.

Diante disso, a pergunta que se coloca não poderia ser outra: seria Galiotte o maior presidente da história alviverde?

"Qual a expectativa de um presidente do Palmeiras? Que ele proporcione a satisfação ao nosso torcedor e isso a gente conseguiu", disse Galiotte, 52, quando indagado sobre o tema, em entrevista ao UOL Esporte.

"Eu me considero um vencedor, totalmente realizado. Entregamos a satisfação ao torcedor, colocamos troféus na nossa linda sala, temos um clube respeitado nacional e internacionalmente dentro e fora dos gramados. Isso tudo deixa o presidente realizado", completou.

Mas a gestão de Galiotte foi além do gramado. Em meio a uma pandemia, que arrebentou com o caixa, o dirigente manteve o orçamento e os empregos de centenas de funcionários, por exemplo.

Se foi o maior presidente, Galiotte não quis responder. Mas perguntado se é difícil comandar um clube como o Palmeiras, ele nem pensou:

NAYRA HALM/ESTADÃO CONTEÚDO

[Ser presidente do Palmeiras] é um desafio estratosférico, uma torcida gigante, uma expectativa muito grande. Sempre uma pressão em busca de títulos e resultados e faz parte. É a nossa história, nossas conquistas, nossa tradição. Então é um desafio muito grande. Eu encerro o ciclo realizado. Absolutamente realizado."

Mauricio Galiotte

Há um jogador que Galiotte queria ter trazido ao Palmeiras...

Torcedor x gestor, a busca por equilíbrio

A partir do fim de 2019, o Palmeiras fechou a torneira de gastos. Muito dinheiro havia sido gasto com o time, e pouco resultado veio do campo. Foi a estratégia correta? Foi precisamente o período de ascensão do Flamengo de Jorge Jesus, diga-se.

"O resultado final muda o pensamento das pessoas. Se você ganha, você fez certo. E, se você perde, fez errado", disse Galiotte.

"Mas, se o resultado não vem, diz que não contratou A, B ou C, já ganhou uma Libertadores e não teve ambição e coragem para a segunda", completa.

O torcedor está pronto para os dois, porque é torcedor. É o papel do torcedor. Eu tenho torcedor em casa e a cobrança é essa."

"Como torcedor eu queria ter contratado vários jogadores e atendido ao anseio do torcedor, mas temos que ter equilíbrio, clareza de propósito, entender o que está acontecendo", diz.

"É tudo planejamento de elenco, financeiro, e deu tudo certo. Mas sei que, se não fosse campeão, viriam as críticas por reforço", afirma. "São situações que alguém tem que pensar. Porque traz consequências. E esse alguém é o presidente."

Cesar Greco/SE Palmeiras

Reformulação com Luxemburgo? Mudança estratégica veio com Abel

Ao perder por 3 a 1 para o Flamengo, em 1º de dezembro de 2019, na 36ª rodada do Brasileiro, Mauricio Galiotte anunciou: "O futebol está passando por mudanças e o Palmeiras precisa sofrer essas mudanças, com isso vamos procurar as peças que são as melhores para tal", disse o dirigente.

E para encampar as mudanças, Galiotte trouxe… Vanderlei Luxemburgo.

"A gente ia ter um impacto muito grande, com garotos da base para subir e esse processo não é simples, é sensível", explica. "Porque já tínhamos um vestiário ganhador, profissional e quando você inclui garotos da base, você precisa de um líder que tenha conhecimento do clube, das pessoas da parte política, por isso o Vanderlei fez esse processo", afirmou.

"O que o Vanderlei fez não é fácil, não foi simples. Vestiário com estrelas, jogadores renomados, com títulos em 2015, 2016 e 2018. Então o Vanderlei também foi importante estrategicamente falando", afirma.

Mas a mudança de verdade só viria com a chegada de Abel Ferreira, em novembro de 2020.

"E aí depois fomos buscar um perfil, que é mais estratégico, que tem uma forma diferente de administrar o dia a dia, o elenco, uma pessoa [Abel] que tem uma gestão de grupo impecável, que tem quase uma especialização em trabalho de base. E é esse o novo perfil que a gente buscou para 2020. E depois disso tudo, o Palmeiras mudou, passou por uma transição, por ciclos e a gente vê hoje um clube diferente", disse.

Marcello Zambrana/AGIF

Os reforços chegaram. Ao seu tempo

O Palmeiras contratou pouco em 2021? A pergunta correta talvez fosse se o Palmeiras contratou tarde em 2021?

Porque na janela do meio do ano, em julho, o Palmeiras trouxe Jorge, Piquerez e Matheus Fernandes, além dos retornos de Dudu, Deyverson e Borja —que acabaria emprestado ao Grêmio.

"Quando vencemos a Libertadores em 2020, o Abel trouxe essa demanda [por contratações]", conta Galiotte.

"E eu analiso o contexto e vejo uma situação do Dudu para ser definida e ele é atacante de ponta, primeira linha, ele poderia voltar. Além disso, tínhamos o empréstimo do Deyverson e Borja, que poderiam voltar", explica.

"Então o Abel solicitou, no início do ano, um atacante e um jogador de frente. Eu tinha esses três para voltar. E aí você me pergunta: não é esse o sonho do palmeirense. Não era o desejo", confessa o ex-presidente.

"É esse o contexto que temos que analisar, com fluxo de caixa com a volta de Dudu, que é importante. Se volta Deyverson e Borja: eu atendo esportivamente? O Abel sabia disso", diz.

"Vendemos o Viña e fizemos uma reposição rápida, mantivemos o equilíbrio na posição e de certa maneira atendemos à expectativa da comissão, porque ele validou as contratações, a volta do Dudu, estávamos entre Borja e Deyverson, os dois não ficariam. Ele validou por característica, e acabou ficando o Deyverson."

REUTERS/Amanda Perobelli

O maior erro

Mauricio Galiotte sabe que cometeu erros, como ocorre em qualquer gestão. Mas, apesar do final feliz, um erro específico ainda persegue o dirigente: não ter renovado o time após a conquista do Brasileiro de 2018:

"Quando fomos campeões brasileiros no final de 2018, a gente cometeu uma falha. A gente poderia ter feito um processo de reformulação paulatina, de elenco. E contemplado alguns meninos da base, já tínhamos algumas revelações. Poderíamos ter feito isso no início de 2019. Mas hoje é mais fácil a gente identificar e olhar para trás. E aí fizemos isso em 2020", diz.

"É um processo de renovação natural, que é difícil de fazer quando ganha, mas é necessário. Porque, quando perde, você faz naturalmente, você é empurrado, mas precisa fazer também quando ganha", diz. "Naquele momento eu poderia ter contratado menos e subido mais garotos. Mas depois fizemos. Juntamos talento, experiência, juventude, mudamos a forma de trabalhar e tivemos muito sucesso nos últimos dois anos."

VINICIUS NUNES/AGÊNCIA F8/ESTADÃO CONTEÚDO VINICIUS NUNES/AGÊNCIA F8/ESTADÃO CONTEÚDO
Divulgação

Palmeiras além dos troféus

Os títulos são suficientemente eloquentes. Mas a gestão Galiotte se encerra com algumas realizações importantes para além dos troféus.

  • A chegada de Abel: Foi Galiotte quem decidiu apostar no jovem treinador que estava no obscuro futebol grego, no médio Paok. Houve atritos. A veia temperamental de Abel se chocou com a parcimônia financeira do presidente. Mas, sem dúvida, foi um grande acerto.

  • A contratação de Anderson Barros: Foi Galiotte quem trouxe o dirigente de perfil discreto e econômico, que chegava ao Palmeiras para sanar o caixa, reduzir custos e fazer com que jogadores sem espaço no elenco tivessem rumo. Barros fez isso e ainda contratou e viu sua gestão ganhar duas Libertadores uma Copa do Brasil e um Paulistão.

  • Apostar na base: 33 jogadores formados nas categorias de base foram convocados para jogos do Palmeiras em 2021, superando o recorde de 31 estabelecido em 2020. Destes, 25 entraram em campo, o que também é um novo recorde, superando os 22 de 2002. Galiotte considera investir e apostar na base o seu maior acerto.

  • A gestão de pessoas: o futebol é uma parte apenas do que o presidente de um clube precisa fazer. E gerir os funcionários está entre as maiores tarefas. O Palmeiras sob Galiotte foi exemplar nesse quesito. Não demitiu nenhum funcionário durante a pandemia. E deu salários extras a todos os colaboradores após a conquista das duas Libertadores.

  • O cofre: Galiotte conseguiu manter as finanças do Palmeiras saneadas. O clube que Leila Pereira receberá de seu antecessor tem hoje o melhor dos mundos: protagonismo esportivo e finanças em dia.

A saída do Alexandre Mattos foi traumática. Ele foi uma pessoa importante, principalmente em 2015, 2016, 2017, 2018... Ele foi importante. A saída foi triste para o clube, porque foi uma pressão grande, não só pela pressão, mas pela exposição, familiar, profissional. Foi um momento sensível. E eu quero te dizer também: ele deixou um legado importante e foi muito importante para o clube. Com erros e acertos, mas mais acertos. E se você pegar o time campeão da Libertadores tem muito dedo dele e do Anderson”

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Galiotte, Sobre a demissão, em dezembro de 2019, do diretor de futebol que ajudou a montar a base vencedora em sua gestão

Cesar Greco

O futuro com Leila Pereira

Galiotte, que teve Leila como sua aliada —política e financeiramente— durante a gestão, deposita muita confiança na presidenta. E acredita que o conselho deliberativo é o melhor caminho para sanar conflitos de interesse que possam surgir pelo fato de ela ser também a gestora do atual patrocinador máster do clube.

"O Palmeiras precisa de pessoas que estejam ajudando o clube, com objetivo de ter um time cada vez maior, estando como referência em um cenário nacional e internacional e é isso que ela diz que quer fazer. Por isso ela diz que tem condição de administrar o Palmeiras, é o desejo de todos nós, torcedores", disse.

"Patrocinadora e presidente, o fato é que, caso exista um tema sensível, ele precisa ir ao Conselho. É uma maneira de resolver qualquer tipo de assunto mais sensível em relação a ser presidente dos dois (Palmeiras e Crefisa) ao mesmo tempo", diz.

"É um dia a dia que tem que ter muita energia. Muita resiliência, exige do líder, do presidente, enfim... Faz parte. É a liturgia do cargo. Não é fácil, eu repito. Não é fácil ser presidente de um time grande", disse ele.

Cesar Greco/Palmeiras

E agora, como fica Galiotte?

Sai o presidente, entra o torcedor, que é dono de uma empresa do ramo de chaves e fechaduras. Galiotte sabe que seguirá como referência política no clube, mas quer descansar. E, até segunda ordem, não se vê atuando na gestão de Leila Pereira.

"Meu lugar principal vai ser na arquibancada, como torcedor nato. O torcedor sempre existiu e sempre vai existir. O presidente é um período. Eu sou torcedor do início ao fim, quando nasce até o último dia. O dirigente tem que saber que são etapas, ciclos. E meu ciclo se encerra como administrador", diz ele que, como presidente, será membro nato do COF, o "senado" do Palmeiras.

"Minha obrigação como ex-presidente é ajudar, apoiar, em um momento de necessidade poder contribuir, sempre estar no meu lugar, mas estar à disposição. Eu vou ter minha maneira de atuar no clube como fiz a vida toda, tentando ajudar o Palmeiras", afirma.

E fora do clube? Galiotte, afinal, ganhou enorme projeção nacional com o Palmeiras. Talvez um cargo na futura Liga dos Clubes?

"Essa pergunta eu não consigo te responder. Se surgir algo que eu possa contribuir, que seja interessante para o futebol, para mim, que eu, enfim, entenda que existe uma possibilidade para contribuir com a minha experiência, eu acho que é possível. Mas não tenho nada direcionado, não pensei em absolutamente nada, a não ser no Palmeiras. Agora, eu acho que pode ocorrer? Pode. Mas nesse momento não digo nada", disse.

"Eu vejo com muito otimismo a formação da Liga. Talvez ainda demore mais tempo, mas estão tendo reuniões, existe trabalho nessa direção e em período breve a gente tem que montar um grupo para administrar o Brasileirão", disse.

Ettore Chiereguini/AGIF Ettore Chiereguini/AGIF

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