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"Criei um serviço de áudios eróticos para ajudar mulheres a gozar"

Mariah Prado é a criadora do Share Your Sex, grupo em que mais 167 mil mulheres falam sobre sexo sem tabus Imagem: Arquivo pessoal

Mariah Prado em depoimento a Júlia Flores

De Universa

12/12/2020 04h00

"Em 2015 eu criei um grupo secreto só de mulheres no Facebook chamado Share your Sex ("Compartilhe seu Sexo", em português). Lá, conversamos sobre sexo sem tabus. Sempre tenho o cuidado para saber quem entra no grupo, olho perfil por perfil para saber se são mulheres reais - e não fakes, para ver se não é homem, além de ler todos os conteúdos para aprovar o que está sendo postado. Atualmente somos mais de 167 mil pessoas, todas com perfil verificado.

No começo eu não tinha pretensão de transformar aquilo em um negócio. Mas em pouco tempo o Share Your Sex tomou proporções que eu não imaginava. Logo precisei chamar algumas amigas para me ajudarem a moderar o grupo, pois não dava mais conta sozinha.

Desde que eu era muito nova, o empoderamento sexual é um tema normal e latente pra mim. Lembro de, aos 15 anos, virgem, ir na seção adulta da livraria e pensar: 'Eu ainda vou escrever um livro desses'. Sempre achei muito legal e saudável.

Veia empreendedora
Eu gosto de empreender. Na época do colégio, comprava capinha de celular da China e revendia na escola. No final da escola e no começo da faculdade eu comecei a vender produtos de sex shop para amigas.

Quando o Share your Sex começou a bombar fiquei pensando em como dar o próximo passo, mil coisas me vinham na cabeça, mas como eu tinha outras empresas nunca conseguia parar para pensar no assunto.

Há dois anos eu decidi abrir uma empresa com CPNJ e me tornar empreendedora. Foi quando eu abri a Trace, minha marca de papelaria. Comecei a vender cadernos personalizados, planners e etc. Sou formada em relações públicas, domino o mercado da comunicação, mas eu me sentia um pouco despreparada no sentindo administrativo.

Investi em uma pós de empreendedorismo e gestão de negócios. Já fiz pensando no Share Your Sex, buscando me profissionalizar e entender como as coisas funcionam. Até que veio a pandemia.

Como eu tomei coragem para me tornar uma empreendedora do sexo

No começo de 2020 eu estava focando apenas na minha empresa de planners e ajudando meus pais com o negócio da família. Com a pandemia de Covid-19, tudo acalmou. Eu me vi em casa finalmente com tempo para tocar o Share Your Sex. Comecei a desenvolver as ideias que eu tinha. Comecei a fazer perguntas no grupo, a conversar com as usuárias, a pesquisar tudo sobre o setor - o que não é muita coisa, pois não temos muitas informações relacionadas a sexo, muito menos sex techs, no Brasil.

Logo eu entendi que existem dois grandes problemas no jeito como mulheres enxergam o sexo, duas grandes dores que precisam ser solucionadas. O primeiro é a questão do autoconhecimento. E quando eu falo de autoconhecimento eu falo do lado emocional, psicológico e físico. Eu sinto que várias coisas que são feitas poderiam ser evitadas se a gente tivesse uma noção mínima de saúde e sexualidade.

Uso de pílula do dia seguinte de forma desregulada, por exemplo, a falta de uso de preservativos, inclusive no sexo anal, mulheres que lavam a vagina ao invés da vulva. Enfim, coisas muito simples e fáceis de serem explicadas, mas que as pessoas não aprendem a respeito. Decidi que precisava atuar nisso, em levar o máximo de informação possível para essas mulheres.

A outra dor feminina é a questão do pornô. Sabemos de todos os problemas do pornô tradicional, vários filmes com abuso e estupro. As pessoas aprendem a transar vendo pornografia - que não é sexo, mas sim uma performance. Os vídeos são carregados de estereótipos. Tem estereótipo até pra vulva, sabe?! Eu vejo que as mulheres já estão em um caminho forte de parar de consumir pornografia. Elas já entendem quais são os problemas desse mercado. Mas dessa maneira a gente fica órfã de um conteúdo erótico.

Um serviço de streaming de mulheres para mulheres

Foi então que decidi transformar o grupo do Facebook em uma plataforma onde mulheres produzam conteúdo erótico para outras mulheres de forma saudável e positiva, além de falar sobre saúde mental e educação sexual. No dia 06 de dezembro de 2020 lançamos a plataforma de streaming do Share Your Sex. Ela se chama SYS Club.

Lá, reunimos áudios eróticos escritos por mulheres e narrados por atrizes. É um negócio bem legal. São contos em primeira pessoa com toda uma ambientação, tem suspiros e gemidos. Histórias em que a gente sempre usa preservativo nas relações - e normalmente a mulher tomando a decisão de colocar a camisinha no parceiro. Com isso, nossa ideia é normalizar o sexo saudável e seguro.

Share your Sex: grupo do Facebook vai virar serviço de streaming de conteúdo erótico Imagem: Divulgação



Além disso, também tem uma parte de bem-estar dentro da nossa plataforma. Temos uma linha de meditação, que foi desenvolvida pensando na nossa mente, na nossa presença corporal e na nossa energia sexual. Uma linha sobre autoconhecimento, autocuidado e autoestima e temos também cápsulas de conhecimento, que foi desenvolvida por uma fisioterapeuta pélvica, onde ela traz as principais dúvidas das pacientes dela e das mulheres que acompanham o Share Your Sex.

Recém-lançada, por enquanto a nossa plataforma se resume a esses conteúdos. Estamos também desenvolvendo conteúdos com uma ginecologista e com uma sexóloga, mas que entrarão só no ano que vem, em 2021. Queremos lançar ainda uma categoria que se chama 'Ela/Ele e você' em que os atores vão dar ordens aos ouvintes.

Não é porque eu trabalho com isso que eu transo mais

"Não é porque eu trabalho com sexo que eu vou transar menos ou mais", explica Mariah Imagem: Arquivo pessoal


Dentro do nosso time de redatoras e autoras de contos eróticos, temos mulheres lésbicas, héteros, trans, brancas, negras, com deficiência, e tentamos sempre manter a nossa equipe o mais plural possível. É um esforço que eu faço para buscar essas mulheres.

Quando eu comecei a desenvolver a estratégia de marketing, eu entendi que teria que ser a cara do Share Your Sex e, na época, eu estava solteira. Pensei: 'Meu Deus, ferrou'. Será que isso vai me atrapalhar ou não? Sei lá, achava que só ia atrair os 'esquerdomachos'. Depois eu comecei a namorar e, apesar de meu companheiro ser um pouco conservador, ele me apoia.

Minha família também me apoia muito. Meu pai tem 75 anos, já é mais velho, superconservador e tudo mais, mas ele entendeu que existe uma diferença entre trabalhar com isso e ser promíscua. Não é por que eu trabalho com sexo que eu vou transar menos ou mais.

Quem disse que empoderamento sexual não pode ser acessível?

Meu investimento inicial foi de R$ 25 mil. Não estou querendo ir atrás de investidores, até porque só conheço investidor homem e não sei o quanto vai ser interessante a gente começar a dissolver a empresa para colocar homens. Estou analisando se vamos para uma aceleradora, se vamos atrás de incubadoras, ou de investidoras mulheres. Ainda estou estudando essa parte.

Quanto ao preço da assinatura, a SYS Club vai custar R$ 27 por mês ou R$ 147 por ano, de acordo com o plano que a cliente escolher, sendo que ela pode consumir o quanto de conteúdo que quiser, como se fosse a Netflix. Teremos dois áudios novos toda semana, um erótico e um de bem-estar.

Decidi lançar a plataforma agora porque todo o mercado que trabalha com sexo, ou com produtos eróticos, aumentou na pandemia. Acho que as pessoas, por ficarem em casa, tiveram que redescobrir a própria sexualidade. Muitas mulheres que não moram com suas/seus parceiros tiveram que descobrir novas formas de sentir prazer, sem estar de fato com a pessoa ali.

A longo prazo a minha ideia é democratizar o empoderamento sexual feminino. Hoje a gente fala que as mulheres já tem espaço para falar sobre sexo, seja na internet, seja no mundo offline. E a gente até vê alguns cursos voltados para elas na área de sexo, pompoarismo, sexo tântrico, etc, mas quando eu olho para esses cursos, eu vejo também o preço deles. O empoderamento sexual acaba sendo um pouco elitista.

Hoje um curso de pompoarismo está em torno de R$ 600. Um curso de tantra está em torno de R$ 3 mil. E aí eu fico me perguntando... empoderamento sexual pra quem? Que mulher hoje no Brasil tem essa grana pra investir em um curso voltado pra sexualidade dela, né?

Por isso a ideia foi fazer uma plataforma de streaming mais acessível ao grande público porque, ao passo que a gente for crescendo, a gente vai trazendo outros conteúdos, inclusive parecidos com esses cursos. Por enquanto, quero que a mulher aprenda a deixar uma luz baixa acesa, colocar o fone de ouvido, relaxar e gozar"

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