Flagrou seu filho se masturbando? Naturalidade é a melhor tática
Heloísa Noronha
Colaboração para Universa
19/06/2019 04h00
Para muitos pais e mães, conversar sobre sexo com os filhos é uma das tarefas mais árduas que existem na missão de educar. Pudor, vergonha, medo de incentivar certos comportamentos, crenças equivocadas e até a dura constatação de que eles mesmos têm dúvidas sobre o assunto são alguns dos fatores que atrapalham o diálogo. Flagrar o filho ou a filha se masturbando, então, tem o efeito de um verdadeiro choque.
"Trata-se de uma situação complicada e desconfortável para ambas as partes. Porém, pode ser também uma oportunidade de ter uma conversa adequada e de fortalecer a confiança e os laços parentais, em vez de afrouxá-los", comenta a psicóloga Sueli da Silva Teixeira, que também atua como terapeuta familiar, de casal e de transtornos dos impulsos.
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Para ela, essa pode ser uma chance, inclusive, de falar sobre o tema sexo pela primeira vez, sem que seja necessário tocar no tópico masturbação especificamente.
O espanto com o fato de que o garotinho ou a garotinha da casa está crescendo e se transformando numa pessoa adulta gera um grande desconforto, mas é preciso superar esse incômodo e oferecer apoio em forma de diálogo.
De acordo com Deborah Moss, neuropsicóloga especialista em comportamento infantil e mestre em psicologia do desenvolvimento pela USP (Universidade de São Paulo), ao flagrar o filho se masturbando é importante que os pais tomem algumas atitudes. "A primeira delas, passado o constrangimento e a surpresa, é se tranquilizar antes de falar qualquer coisa. É preciso levar em conta que isso é normal, faz parte da exploração do próprio corpo e do autoconhecimento. Então, é importante tratar o tema com calma e naturalidade", afirma.
O bate-papo não precisa acontecer no calor do momento, mas também não deve ser adiado por muito tempo. "Deixar no ar uma situação que gera vergonha e fingir que nada aconteceu não é a melhor decisão", alerta Deborah. Os pais precisam conversar com o filho e explicar que a masturbação é algo muito íntimo, portanto, é necessário tomar cuidado com a questão da privacidade. Então, é essencial orientar que ele faça isso em um local seguro, para evitar a exposição diante de outras pessoas.
"Geralmente, quando o assunto é masturbação, é mais comum pensar em adolescentes, pois eles já possuem certa crítica e um senso de vergonha. No entanto, crianças pequenas também podem se masturbar, sem ter a noção de que aquilo que estão fazendo é algo íntimo e que deva ser feito em um espaço privado. Nesses casos, a orientação deve vir dos pais", diz a neuropsicóloga.
Esse é o momento de falar sobre as questões do corpo com os filhos, questionar se possuem dúvidas, se teriam interesse em perguntar alguma coisa. E deixar que as coisas fluam de modo natural, sem ficar pressionando. Talvez pelo constrangimento, eles não queiram falar naquela hora, mas é fundamental deixar o canal aberto e reforçar que isso é normal e natural.
"Se a conversa parecer algo muito difícil, embaraçoso e desconfortável, uma ótima alternativa é presentear a criança ou o adolescente com um livro sobre o assunto. Uma obra escrita por um expert no assunto pode guiá-lo de maneira didática e aliviar um pouco a tensão das circunstâncias, além de dar boas dicas e ensinamentos válidos sobre sexualidade nesse momento importante da vida", observa Sueli.
Adolescente não deve ser julgado nem exposto
Na série "Sex Education" (2019), da Netflix, embora seja terapeuta sexual, Jean (Gillian Anderson) é totalmente invasiva em relação à sexualidade do filho, Otis (Asa Butterfield), ao xeretar seus lençóis e até usá-lo como personagem em um livro. Como consequência, o garoto é travado, não consegue se masturbar e sofre uma crise de ansiedade ao tentar perder a virgindade. Otis só consegue se sentir à vontade com a própria sexualidade depois de enquadrar a mãe e pontuar o quanto ela é opressiva, enxerida e desrespeitosa.
De modo algum o adolescente deve ser motivo de chacota ou de exposição ao ser pego se masturbando. "É importante que essa situação fique restrita apenas aos pais e aos filhos. Nada de expor o assunto para outras pessoas ou de trazê-lo à tona em momentos da família. O jovem precisa ser muito bem cuidado e acolhido na intimidade da relação familiar. O que não pode ser feito é um julgamento moral, no sentido de que aquilo que eles estão fazendo é errado, tratando a masturbação como algo pecaminoso", diz Deborah.
"Para algumas famílias, a preocupação tem a ver com aspectos religiosos ou culturais. Só que, independentemente da criação e das crenças dos pais, a saúde tem que estar em primeiro lugar. Discutir se é uma prática certa ou errada não é o foco", fala Sueli.
Para Lidiane Calil, psicóloga clínica especialista em atendimento a crianças e adolescentes e orientação de pais, julgamentos morais, punições e castigos não devem ser impostos sob nenhuma hipótese. "Há pais que ameaçam, dizendo que algo ruim vai acontecer se o filho repetir esse comportamento. É preciso lembrar que a busca do prazer é uma necessidade básica do ser humano. Se ele está sendo privado do prazer, poderá levar isso para o resto da vida", explica a especialista.
"Punir pode ser confuso e traumático para adolescentes. Do mesmo modo, desestimular a prática também não é recomendável. Os pais devem ter em mente que educar é muito diferente de impor regras. Quando informado sobre o assunto, o adolescente poderá definir as próprias regras, o que pode ser uma experiência de aprendizado importante e positiva", completa a terapeuta familiar Sueli Teixeira.
No mais, é importante observar o comportamento e o humor do adolescente sem ser muito invasivo --nada de ficar investigando ou de tentar dar indiretas ao perceber que o jovem fica muito tempo no banho. Porém, alguns casos em que a masturbação está muito persistente podem ser indício de outros problemas. Nesses casos, o ideal é buscar ajuda profissional.
"Também é sempre bom incentivar a segurança com o uso da internet, certificando-se de que o uso está sendo feito de maneira saudável e protegida, orientando sobre a pornografia de forma ética e responsável", conta Sueli. Porque, mais ou cedo ou mais tarde, o jovem vai transar e será exposto à pornografia. O modo como lidará com isso depende muito de como o sexo é tratado em casa e da confiança que ele deposita nos pais para se abrir e relatar dúvidas."