Topo

CERN criará isótopos "sob medida" para detecção e luta contra o câncer

29/11/2017 18h33

Marta Hurtado.

Genebra, 29 nov (EFE).- Durante anos de pesquisa e testes, a comunidade médica identificou os isótopos radioativos mais adequados para poder usá-los no diagnóstico e no tratamento de doenças, e embora muitos deles não estejam disponíveis ainda, serão criados "sob medida" na Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear (CERN).

A CERN é conhecida por grandes descobertas científicas abstratas, como a comprovação da existência do bóson de Higgs, a partícula que completa o chamado "modelo padrão" da Física de Particulas, que descreve a estrutura da matéria, ou por aplicações tão práticas como a criação da World Wide Web (www), que transformou radicalmente a forma de se comunicar.

A partir do ano que vem, o projeto "Medicis" (Medical Isotops Collected from Isolde) produzirá isótopos radioativos "sob medida", ou seja, seguindo as especificações e as demandas dos médicos.

O Isolde é um acelerador que existe há 50 anos e que criou até agora 1.300 isótopos radioativos, muitos dos quais só podem ser produzidos nas suas instalações.

Segundo os físicos teóricos, existem 6 mil isótopos diferentes, com a existência comprovada de 3 mil, e a ideia do Mecicis é ir à frente desses 1.300 e expandir a produção de isótopos "não convencionais ou exóticos", ou seja, não criados até o momento.

"No caso do Medicis, o que fazemos é a produção de isótopos em específico, aqueles que sabemos que são úteis para aplicações médicas, porque conhecemos quais propriedades têm e que tipo de partículas estes isótopos emitem", explicou à Agência Efe Yisel Martínez, uma física nuclear cubana que está fazendo seu doutorado no projeto.

"É útil porque podemos configurá-lo para criar o isótopo que quisermos, que desprenda partículas específicas, que, unidas a uma molécula, podem se dirigir especificamente a atacar, por exemplo células cancerígenas", acrescentou.

Os átomos são formados por um número fixo de prótons ao redor dos quais circula um número variável de nêutrons.

Os prótons dão a massa e definem os elementos químicos - da tabela periódica, como o cobre ou o hélio - enquanto os nêutrons determinam o tipo de isótopo, que são sempre radioativos.

O uso dos isótopos radioativos como aplicação médica é uma ciência antiga que se usa tanto na radioterapia como em exames de diagnóstico de imagem, como as ressonâncias magnéticas, as cintilografias e as tomografias PET.

Na maioria dos casos, o produto é injetado, se expande pelo corpo e os médicos se fixam somente na parte a ser estudada.

Os isótopos que serão criados pelo Medicis serão feitos de modo que vão diretamente atacar a célula concreta ou destacar um tecido específico.

A ideia é produzir isótopos que emitem pósitrons e raios gama para as imagens, ou outros que emitam raios beta ou alpha para atacar especificamente as células cancerígenas afetadas e o seu entorno imediato.

Após criá-los, os isótopos serão armazenados e depois enviados a hospitais e centros de pesquisa.

"Como sempre fizemos na CERN, nós acreditamos na ciência colaborativa, por isso transferiremos os isótopos àqueles centros que são parceiros do projeto Medicis para que os usem de forma prática e na pesquisa e para que a sociedade possa se beneficiar", explicou Manuela Cirilli, uma das responsáveis pelo projeto.

O projeto conta com financiamento da CERN, de fundações privadas e da Universidade de Louvain (Bélgica).

Uma das principais vantagens do projeto é que o Medicis usa o mesmo feixe de prótons acelerados do Isolde.

Após passar pelo Isolde, o feixe de prótons só perdeu 10% de sua energia, por isso o resto pode ser utilizado de novo pelo Medicis.

O feixe de prótons se choca contra uma barreira que contém material pesado e provoca uma reação nuclear, e do resultado se separam os isótopos radioativos em função da sua massa, e são escolhidos os que interessam.

O objetivo não é "produzir isótopos em massa", esclareceu Thierry Stora, coordenador do projeto, mas provar que é possível criar aqueles foram solicitados.

Tradicionalmente, os isótopos são produzidos em reatores nucleares, mas dada a tendência atual à não-proliferação nuclear, cada vez mais os isótopos serão criados nos aceleradores de partículas, como o da CERN.