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Com Harry Potter e Crepúsculo, streamings apostam em time que está ganhando

Séries de Harry Potter e Crepúsculo mostram que streamings só querem time que já está ganhando - Divulgação
Séries de Harry Potter e Crepúsculo mostram que streamings só querem time que já está ganhando Imagem: Divulgação

De Splash, em São Paulo

26/04/2023 04h00

Uma série baseada em Harry Potter, uma de "Crepúsculo", uma série animada de "Stranger Things", outra derivada de "Bridgerton", um spin-off de "The Boys". O que todos esses títulos têm em comum? São apostas recentes dos principais streamings e bebem na fonte de continuar grandes sucessos.

A série de Harry Potter estará na Max, que será criada com a fusão entre HBO Max e Discovery+, "Stranger Things" e "Bridgerton" seguem na Netflix, enquanto "The Boys" é do Amazon Prime Video. Segundo o The Hollywood Reporter, a nova adaptação de "Crepúsculo" será produzida pela Lionsgate Television, mas ainda não tem destino certo.

Especialistas ouvidos por Splash explicam que essa é uma das principais ferramentas dos grandes estúdios, que minimizam riscos ao apostar em histórias com uma legião de fãs em uma época de produções tão caras.

"Os grandes estúdios sempre foram conservadores no sentido de investimento financeiro. Eles são avessos ao risco. Então, a partir do momento em que se investe em uma propriedade intelectual com uma base de fãs, acredita-se que o retorno ali é mais garantido", explica o crítico Renan Martins Frade, titular da coluna de Splash Na Sua Tela.

"Quando olhamos para o streaming, os investimentos são cada vez mais altos", continua Frade.

"Não é que não tenham boas ideias aí, mas essas coisas são produtos, e uma empresa, quando tem uma marca grande, quer diversificar esses produtos. É muito mais fácil esticar um produto que já é conhecido do que começar um novo do zero", pontua Roberto Sadovski, crítico de cinema e colunista de Splash.

Concorrência e investidores aceleram lançamentos

Quando a Netflix surgiu, a empresa não tinha suas próprias franquias. Com tentativa e erro, muitos cancelamentos depois a plataforma tem um portfólio de respeito, com as já citadas "Stranger Things" e "Bridgerton" e outras mais, como "La Casa de Papel" e "The Crown".

Isso, mais o fato de que a Netflix está pressionada por investidores para melhorar seus resultados, ajuda a explicar o atual movimento do mercado.

"A Netflix entrou muito forte nisso. Como ela não tinha uma biblioteca centenária de franquias e de marcas, investiu para criá-las. E, para competir, os estúdios tradicionais estão trazendo para o streaming suas marcas famosas" Renan Martins Frade

"Os investidores querem que o dinheiro deles seja transformado em mais dinheiro, que isso seja reinvestido e traga rendimentos. A série de Harry Potter foi anunciada sem showrunner, pré-projeto, nada, coisa que não seria feita em outros tempos. Isso é para mostrar para o investidor que o dinheiro dele está sendo empregado em um produto que vai durar uma década, que vai ajudar a Max a crescer e fomentar uma nova geração de fãs", explica Frade.

599 séries originais com roteiro foram lançadas no ano passado, somente nos Estados Unidos, segundo estudo de John Landgraf, CEO do canal FX e da FX Productions. Diante de tamanha competitividade, já há pesquisas que mostram o sucesso do investimento em continuações como bom gancho de crescimento.

Estudo divulgado recentemente pelo YouGov mostrou que as plataformas de streaming que mais cresceram em 2022 tiveram o desempenho atrelado ao lançamento de séries e filmes de grandes franquias ou à disponibilização de grandes blockbusters do cinema no catálogo.

O Paramount Plus, por exemplo, teve destaque com a série "1883", derivada de "Yellowstone", e o Prime Video se beneficiou de "O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder" e de "Reacher". Todos são subprodutos de alguma outra coisa.

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Netflix lança 'Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton', derivada do hit 'Bridgerton'
Imagem: Liam Daniel/Netflix

O poder da nostalgia e o risco na estratégia

Essas novas produções são, de certa forma, nostálgicas para aqueles que as acompanharam desde o início. E é justamente dessa característica que os streamings se aproveitam.

Para Luís Mauro Sá Martino, doutor em Ciências Sociais e pesquisador da cultura de fãs, as maiores chances de sucesso estão na retomada de produções mais antigas, como Harry Potter e "Crepúsculo".

"Tem muito a ver com nostalgia, que significa 'dor da perda' em latim. É necessário um intervalo de tempo mais longo para sentir falta", avalia o pesquisador.

O fã já conhece o universo, sabe o que esperar e projeta na própria mente aquilo que gostaria que acontecesse. Afinal, uma das características de qualquer fã é imaginar: "Tem a ver com a expectativa de fan service, de mostrar na tela aquilo que a comunidade de fãs já imaginava há algum tempo."

Enquanto a nostalgia direciona os produtores ao melhor caminho a ser seguido para tornar seu produto atrativo, também caracteriza um risco criativo a longo prazo: as empresas também precisam de novas histórias para se manterem

Em vez de ir a um porto seguro e lançar coisas que funcionem para ter dinheiro garantido, talvez os streamings estejam matando o que dá dinheiro a eles, tornando-se menos relevantes, menos prestigiosos, menos premium.
Renan Martins Frade, colunista de Splash