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Jovem miss após ter 'doença do silicone' e tirar próteses: 'Não foi fácil'

Miss Baixada Santista CNB (Concurso Nacional de Beleza) 2022 retirou próteses de silicone após incômodos e vários sintomas Imagem: Reprodução/ Instagram @gicoltro

De Splash, em São Paulo

02/05/2022 20h30Atualizada em 22/07/2022 18h52

A cirurgiã-dentista Giovanna Coltro, de 24 anos, tinha apenas 18 quando decidiu colocar implantes de silicone, mas só completou a ideia mesmo três anos depois no último ano da faculdade. Com o passar do tempo, vieram complicações e a necessidade de um explante (retirada das próteses) após diagnóstico da chamada "doença do silicone" — que ainda não tem reconhecimento científico e médico por sociedades de medicina.

"Desde muito nova, eu nunca fui contente com o meu corpo, eu sempre tive muita vergonha, porque eu tinha perna muito grossa, eu tinha bumbum grande. [...] Eu não tinha nada de peito, sempre fui muito magra em cima. E sempre fui muito seca e isso mexia com a minha feminilidade", afirma Giovanna, que é a atual Miss Baixada Santista CNB e compartilhou no Instagram fotos exibindo suas cicatrizes da retirada das próteses, até então um sonho.

Se agora ela já se sente à vontade para compartilhar fotos com os seios de antes, nem sempre foi assim e ela sabe que ainda terá um longo caminho para se recuperar emocionalmente, mesmo com o êxtase oriundo quando passou pelas primeiras cirurgias e colocou 285 ml de silicone em cada seio.

[Quando eu fazia balé] Não me trocava na frente de ninguém no balé e morria de vergonha, nem com a minha mãe eu me trocava, sempre fui muito envergonhada, muito insatisfeita por conta de não ter peito Giovanna Coltro em entrevista a Splash

Tudo mudou quando ela passou por cirurgia em 2018: "Olhava pra mim, era o padrãozinho 'loira odonto'. Clássico loira odonto era eu. E eu sou dentista ainda pra ajudar, né? Só faltou HB20", diz sorrindo. "Mas brincadeiras à parte, foi só quando eu me encaixei nesse padrão que eu achei que eu estava sendo suficiente".

Giovanna como Miss São Paulo no Miss Brasil Globo 2016 antes de colocar próteses de silicone Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

Quando o sonho virou pesadelo

Já iniciada na carreira de miss ainda na adolescência para elevar a autoestima, Giovanna entrou para os concursos adultos e chegou a competir com novo busto após as próteses. Mas foi apenas no final de 2020 que ela começou a se sentir realmente mal, principalmente com cansaço, a princípio sem saber o que era.

Quando passou por especialistas, a maioria deles pensou se tratar de algo psicológico, principalmente devido à pandemia. Os sintomas iam de cansaço e frio extremo, queimação nas costas e até tremores.

Após ver na internet sobre a "doença do silicone", ela foi atrás do profissional que fez sua cirurgia em 2018, mas a atenção não foi adequada. "Ele não deu bola, falou que podia acontecer, mas era raro, que podia acontecer mas não era comum. Deu de ombros", afirma a jovem.

"Acabei demorando mais para fazer a minha cirurgia porque eu precisei aceitar que eu realmente estava com essa doença. E não foi fácil o diagnóstico, porque não tem um exame específico para você descobrir a doença de silicone", explica a dentista, que apenas retirou as próteses após procurar o cirurgião que fez sua rinoplastia, passar com especialistas e descartar todas possibilidades, inclusive fibromialgia.

Antes e depois do explante feito em Giovanna, em outubro de 2021 Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

O que seria a 'doença do silicone'?

"A 'doença do silicone' é um termo com uma tradução livre do inglês do termo 'breast implant illness', utilizado pelo público leigo para se referir a um conjunto de sintomas sistêmicos e inespecíficos, na maioria das vezes autorreportados pelos próprios pacientes", explica a Splash o cirurgião-plástico Pedro Soler Coltro, doutor em Cirurgia Clínica e professor da FMRP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto) da USP (Universidade de São Paulo).

Ele conta que geralmente é um auto-diagnóstico que a paciente faz e dentre os sintomas citados há dores nas articulações, dores musculares, perda de cabelo, cansaço, fadiga, alteração de humor e depressão. "Tem uma infinidade de sintomas que as próprias pacientes relatam ser devido a colocação do implante de silicone. Porém a "doença do silicone" não é reconhecida pelas sociedades médicas".

Tanto a DFA (Agência de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos), a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e o órgão similar nos EUA não reconhecem como diagnóstico médico formal a "doença do silicone", pois "não há critérios diagnósticos e reconhecidos para sua definição", observa o especialista.

Uma das principais recomendações que nós cirurgiões-plásticos temos que ter com essas pacientes é respeitar os sintomas que essas pacientes apresentam, de forma séria e acolhedora e explicar que a luz da ciência, não existe uma relação direta, nem uma comprovação de que o silicone é o causador dos sintomas que ela diz apresentar Drº Pedro Coltro, cirurgião-plástico

Doutor Pedro fala da existência de um outro termo que pode causar confusão: a Síndrome ASIA, que pode ser traduzida do inglês como Síndrome Autoimune Induzida por Adjuvantes — todo material estranho ao corpo que o paciente tem contato, podendo ser uma prótese de silicone, ortopédica ou marca-passo, dentre outros.

Há quase um mês a miss exibiu suas cicatrizes após resultado final seis meses após retirada das próteses Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

"Ao contrário da 'doença do silicone', a Síndrome ASIA é uma doença reconhecida pela medicina que ainda é motivo de muitos estudos, também não temos nenhuma relação causal confirmada, mas nessa síndrome o implante de silicone funcionaria como fator desencadeador de alguns sintomas bem específicos de doenças autoimunes", pontua o médico, acrescentando que há tratamento após diagnóstico.

Uma nova vida

"Quando eu tirei o silicone foi bizarro, porque no dia seguinte a queimação que eu tinha nas costas sumiu. Com 15 dias sem, meu rosto já começou a desinchar, a bolsa embaixo dos olhos, meu nariz ficou mais fino. Sintomas de tremor pararam, [hoje] sinto frio como uma pessoa normal", confessa Giovanna, já que um dia chegou a sair de casa com até 6 camadas, mesmo sem estar muito frio.

"Depois que tirei, minha vida melhorou 500%", diz aliviada a miss, que somente decidiu retirar as próteses quando já estavam descartadas outras hipóteses e a da "doença do silicone" passou a ser considerada. Apesar disso, ela não foi diagnosticada oficialmente e a "doença do silicone" não aparece no seu relatório médico, de dezembro de 2021.

Prótese "murcha" após explante indicando que ouve ocorrência de vazamento de gel no corpo da miss durante seu uso Imagem: Reprodução/ Arquivo pessoal

Quando tirou o silicone, Giovanna viu que o gel bleeding — vazamento de gel da prótese — era real, e ela não sabia da possibilidade disso ocorrer quando fez os implantes, o que deveria ter sido alertado: "Minhas próteses estavam mais murchas, ou seja, esse gel estava jogando metais pesados no meu corpo esse tempo todo e o corpo gera um processo inflamatório generalizado para tentar expulsar aquele corpo estranho".

Entretanto, tal condição não tem relação com o que seria a "doença do silicone". "Muitas pacientes relatam que a presença do gel bleeding causa a 'doença do silicone', mas isso é outra coisa que não existe relação nenhuma. São coisas autorreportadas pelas pacientes, não é uma constatação científica. [Mas] Existe muito esforço de toda comunidade médica de compreender melhor essa situação que ganhou muito destaque nos últimos anos", diz o professor da USP.

Giovanna vai disputar o Miss Brasil CNB 2022, que dá vaga do Brasil no Miss Mundo, em agosto na capital federal Imagem: Reprodução/ Ari Teles/ Arquivo pessoal

Concurso de Miss Brasil

Giovanna vai disputar pela segunda vez o Miss Brasil CNB, com edição de 2022 marcada para o início de agosto, em Brasília. Ela participou do concurso em 2019 com a faixa Miss Bem Viver Paulista e retornou agora pela Baixada Santista. O certame escolhe uma brasileira para o Miss Mundo, um dos mais tradicionais concursos de miss do planeta. A última vencedora foi a polonesa Karolina Bielawaska.

"Nesse momento que estou vivendo é a melhor franquia que eu posso participar. Mesmo com cabelo curto e sem peito, eles não fizeram objeção nenhuma", relata a miss, citando que o CNB possui o "Beleza pelo Bem", que incentiva candidatas a terem participação em projetos sociais e não exige prova de biquíni ou maiô como critério de seleção.

"Achei que nunca ia participar de concursos de novo. [E agora posso] Participar de um onde meu corpo não vai ser avaliado, onde eu posso estar de cabelo curto, onde não preciso de megahair igual na franquia Universo. Eles valorizam o ser, não o parecer", explica a dentista.

Posso ser uma miss de cabelo curto, sem peito, uma miss que está em lugar de evidência para poder falar com outras mulheres para se conscientizarem com a doença do silicone, essa busca inalcançável por um padrão inatingível no qual a gente fica doente. Vamos parar de ficar doentes, padrão não existe. Padrão é ser feliz do jeito que a gente é Giovanna Coltro

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