Trilha na Mata Atlântica em São Bernardo do Campo vale (e exige) o esforço

Olhando do alto da plataforma natural que se debruça sobre a paisagem, a Baixada Santista parece logo ali. Nos dias de céu limpo, dá até para ver o Guarujá acenar de longe.

Mas assim como a caminhada que começa plana até a torre de energia, nada é fácil para quem caminha sobre esse tapete verde de terreno irregular que se estende, aos trancos e barrancos, até o Rio Grande do Sul.

Reinaugurada no último mês de março, a Trilha Cachoeira da Torre é a versão mais exigente do Parque Caminhos do Mar (www.caminhosdomar.com.br), no Parque Estadual da Serra do Mar, em São Bernardo do Campo, no ABC paulista.

A caminhada de dificuldade intermediária tem nove quilômetros de extensão (ida e volta), em meio a formações de vegetação que se alternam entre arbustos e florestas densas de bromélias, orquídeas e cipós.

Em outras palavras, a imersão total em um dos trechos mais preservados da Mata Atlântica vale o esforço. Mas também exige.

Basta vencer a primeira metade do terreno plano para o visitante entender o apelido "Trilha dos Sete Morros", em referência à sequência de subidas e descidas por uma área acidentada e escorregadia com variação média de altitude de 740 metros.

É uma trilha que exige bastante preparo físico. Aqui, começa a brincadeira e, desse ponto em diante, vamos poder notar os vários desníveis a serem vencidos até o final", avisa o biólogo e líder de monitoria do parque, Maycon de Oliveira Morais, diante do primeiro obstáculo íngreme.

Com poucos trechos protegidos em boa parte da caminhada, o visitante fica exposto ao sol e não conta com nenhum local para reposição de água potável, o que exige também carregar toda a quantidade de líquido necessário para toda a trilha.

E enquanto alguns seguem imaginando onde aquilo tudo vai dar, Maycon caminha com olhos atentos às diversas pegadas encontradas em boa parte da trilha, uma área de passagem de pequenos roedores, antas e felinos como jaguatirica, gato mourisco e onças parda e pintada.

A recompensa ao final são os poços para banhos no Rio do Ouro, cujas águas seguem em direção à uma língua que rasga a mata, onde a cachoeira despenca em degraus até lá embaixo.

A única frustração do roteiro é a vista parcial (e apenas do alto) dessa cachoeira que, no total, tem cerca de 130 metros de quedas.

Caminhos para o mar

Embora não seja nenhuma novidade para a população trilheira do ABC paulista, a caminhada até a Cachoeira da Torre foi reinaugurada recentemente pela Parquetur, empresa que acaba de assumir a gestão e a operação de parte do parque.

Aberta para a construção das torres de transmissão que levavam cabos de energia para a serra das Escarpas da Serra do Mar, essa trilha era feita até então de forma clandestina. Por isso, atualmente, só é possível fazer essa caminhada com agendamento prévio e acompanhamento de um dos guias do parque.

É como levar consciência ambiental para a população, que vê a preservação acontecendo diante dos olhos. O parque traz a sociedade para perto disso e as pessoas se sentem também corresponsáveis pela conservação desse bioma tão ameaçado", analisa Maycon.

Criado em 1977, o Parque Estadual Serra do Mar está presente em 25 municípios paulistas e seus 332 mil hectares fazem dele o maior corredor biológico da Mata Atlântica em todo o Brasil.

Por conta de sua extensão, o PESM tem gerenciamento em dez núcleos administrativos, em cidades como Bertioga, Caraguatatuba, Cunha e o núcleo Itutinga Pilões, que abrange Praia Grande, São Vicente, Santos, Cubatão, Mogi das Cruzes, Santo André e São Bernardo, onde começa a trilha até a cachoeira da Torre.

"A pandemia trouxe esse sentimento de reclusão e a tendência agora são as diversas atividades ao ar livre disponíveis. Nesse sentido, o parque é muito democrático", avalia Maycon.

O núcleo no ABC abriga também outros dois roteiros históricos, como a clássica descida a pé pela Estrada Velha de Santos, com 16 quilômetros de extensão (ida e volta), aproximadamente.

Com possibilidade de retorno de van, reservada com antecedência, esse roteiro autoguiado segue por trilha asfaltada que leva a mirantes com vista para a Baixada Santista e monumentos históricos que, devido ao bicentenário da Independência do Brasil, em 2022, estão sendo totalmente revitalizados em intervenções como limpeza e restauro dos painéis em azulejo.

A história segue sendo contada também em uma terceira opção de caminhada.

O Roteiro Ecoturístico na Calçada do Lorena é uma trilha pavimentada com rochas de 1792 trabalhadas a mão por onde passavam as mercadorias no período colonial, considerada a primeira via pavimentada entre São Paulo e o litoral paulista.

Dizem, aliás, que, em setembro de 1822, Dom Pedro 1° passou pela calçada em direção a São Paulo, onde proclamaria a independência do Brasil.

"[No Brasil de 1822] eram apenas trilhas, mas isso não impediu que D. Pedro vivesse com o pé na estrada. Sua viagem mais famosa foi a Jornada ou Itinerário da Independência", lembra o jornalista Eduardo Bueno, que em 2020 lançou um dicionário ilustrado sobre os 200 anos da Independência do Brasil.

Sem necessidade de agendamento prévio nem acompanhamento de guia, a trilha na Calçada do Lorena tem, aproximadamente, sete quilômetros de extensão (ida e volta).

Quando ir

Embora seja a temporada de chuva, a melhor época para realizar a trilha até a Cachoeira da Torres é durante o verão, quando as águas do Rio do Ouro têm temperaturas mais convidativas.

Um ponto que pode estragar o rolê é a declividade da área do parque, cujos ventos se condensam entre as montanhas, formando neblina e chuvas que podem cancelar o passeio em dias de clima mais invocado. Por isso, vale a pena sempre consultar a previsão meteorológica.

VAI LÁ

Parque Estadual da Serra do Mar
SP-148 (Estrada Caminho do Mar), km 42 (Alto da Serra - São Bernardo do Campo/ São Paulo)
De quarta a domingo, das 8h às 17h.
Agendamento prévio pelo whatsapp (11) 9 7279-5616 ou pelo endereço caminhosdomar@parquetur.com.br
Ingresso: R$ 40 (4ª e 5ª) e R$ 50 (nos finais de semana)
www.caminhosdomar.com.br