Gabigol S/A

Na trilha de Neymar, atacante do Flamengo já tem boneco, chinelo e até álcool em gel com sua marca

Alexandre Araújo e Bernardo Gentile UOL, no Rio de Janeiro Thiago Ribeiro/AGIF

Gabigol chegou ao Flamengo no início de 2019 e, em sua primeira temporada pelo clube, conquistou quase tudo. Foi campeão carioca, da Libertadores da América e do Campeonato Brasileiro. Faturou também prêmios individuais na maioria das competições. O desempenho, aliado à força da camisa do Rubro-negro, criou um fenômeno no futebol brasileiro que estava adormecido desde a saída de Neymar de campos verde-amarelo: o marketing pessoal.

Aos moldes do que aconteceu com o camisa 10 do PSG na época do Santos, o sucesso com torcedores de todos os clubes, principalmente as crianças, fez o jogador transcender o futebol. Aos 24 anos, o camisa 9 do Flamengo virou um case de sucesso no mundo dos negócios quando seus empresários perceberam o potencial da marca que começava a crescer com a comemoração de gols com os braços abertos ou as placas de "Hoje tem gol do Gabigol".

Desde o início deste ano, foram licenciados 15 produtos em seu nome. A expectativa é que chegue aos 40 até dezembro. O carro chefe são os voltados ao público infantil, principalmente os que usam o personagem Gabigolzinho. Há planos (e negociações) de transformá-lo em uma série animada em plataforma de streaming. Mas os fãs podem comprar, também, copos, bonecos, chinelos e até frascos de álcool em gel com o nome do craque. A Gabigol S/A parece ter chegado para ficar.

Thiago Ribeiro/AGIF
Bruno Baketa/AGIF

O descobrimento da marca

O fenômeno comercial não começou de maneira repentina. Foi sendo construído a cada gol marcado. Em 2019, ele balançou as redes adversárias 43 vezes em 59 partidas. Em 2020, apesar de uma séria lesão, são 10 gols em 23 partidas —o artilheiro da temporada do Flamengo é Pedro, com 17 gols em 35 jogos. Além disso, a personalidade, refletida nos penteados diferentes e na barba platinada, e principalmente na forma característica de comemorar os gols, fazem diferença.

Após mostrar os músculos como se fosse um super-herói, passou a ser imitado nas ruas. Não demorou muito para virar boneco pirata comercializado por ambulantes.

A primeira grande ação oficial ocorreu em conjunto com o Flamengo: em um jogo da Libertadores no Maracanã, contra o Barcelona de Guayaquil, em março deste ano, foram vendidos copos personalizados com a imagem de Gabigol e a frase "Hoje tem gol do Gabigol" —o atacante não decepcionou e fez o seu naquele dia. Nas arquibancadas, foram vendidos vinte mil copos, cada um a R$ 20. R$ 400 mil brutos em poucas horas.

Percebemos que ele era um sucesso com o público infantil já no meio do ano de 2019. A comemoração viralizou e virou fruto de produto pirata. Vimos que era a hora de explorar a marca, que já havia sido construída, mas que não era explorada comercialmente. Só tematizávamos o aspecto visual dele. Criamos a marca Gabigol, que remetia à comemoração. Sentíamos que poderíamos tornar isso um produto

Júnior Pedroso, empresário de Gabigol

Alexandre Schneider/Getty Images

Boneco pirata ajudou

Foi justamente o sucesso instantâneo de um produto pirata do atacante que mostrou o rumo dos investimentos. Quando o boneco de Gabigol pirata vendido pelos ambulantes ao redor do Maracanã começaram a esgotar, os empresários do atacante aceleraram o processo de licenciamento dos produtos do atacante.

Gabigol nunca se associou ao produto comercializado pelos ambulantes, mas o boneco pirata acabou ajudando. "Provou, na prática, que seria um sucesso absoluto de vendas, como tem sido. Já existia a ideia, o processo estava em andamento. O que eles fizeram foi teste de mercado. Não queríamos que ele se associasse pois eram bonecos fakes feitos por imigrantes que estavam ilegais no Brasil. Nunca endossamos isso. Mas vimos e tivemos a certeza de que daria certo", explicou Marina Nishitani, head de marketing da 4ComM, empresa que gerencia a carreira de Gabigol.

"A gente já tinha começado a planejar tudo, já estávamos em reunião. Mas o processo de licenciamento é lento. Para fazer o estudo, desenvolver e entender como funciona a identidade de uma marca é um processo longo. Negociar com empresa é algo sério. É preciso ter muito cuidado. Imagina fechamos com uma empresa para fazer as pelúcias e depois descobrir que eles fazem trabalho escravo? Ou que estão com dívida fiscal?"

Buda Mendes/Getty Images

Sucesso de Gabigol entre a garotada

O sucesso de Gabigol entre o público infantil é grande, não só entre a torcida mirim do Flamengo. Ou brasileira. Um garoto colombiano invadiu o campo durante uma partida da Libertadores contra Junior Barranquilla para abraçar o jogador em março deste ano. Na mesma partida, um menino chorou ao receber uma camiseta do ídolo.

"Percebíamos que havia uma conexão muito forte com o público infantil, que consumia muito tudo que tinha Gabigol. Nesse ponto entendemos que havia a necessidade de criar um personagem infantil para ter uma comunicação mais objetiva com esse público. Surgiu o Gabigolzinho", contou o empresário Junior Pedroso.

Marina Nishitani afirma que que Gabigol deu a ideia de lançar o personagem. "O Gabigolzinho partiu dele. Ele gosta muito de ter esse relacionamento com as crianças e sugeriu virar um personagem infantil. Foi uma conversa despojada e que deu certo. Ele também falou do minicraque, que está sendo sucesso. Já esgotou toda a primeira tiragem e vamos para a segunda", completou Marina.

Reprodução/Instagram

Gabigolzinho: principal produto

Lançado em junho deste ano, Gabigolzinho se tornou a principal ativação na rede de licenciamento. Há, inclusive, várias frentes para o personagem. O grupo negocia com uma plataforma de streaming para que o desenho vire uma série animada com episódios frequentes ou se transforme em um filme. A equipe diz que ainda não há previsão de lançamento.

"Ainda estamos vendo o melhor caminho. Esse é o nosso desafio. É muito caro fazer uma hora de animação e não sabíamos disso. Estamos filtrando os parceiros que vão ficar e conversando com outra empresa grande, global, para fazer cartoon dele a cada quinze dias", disse o empresário.

A ideia é que Gabigolzinho seja um produto internacional. "Nosso objetivo inicial é no Brasil, mas há também há a possibilidade de ampliar para demais países da América Latina. Hoje, exploramos muito mais o Gabigolzinho do que o próprio Gabigol para licenciar", completou Junior Pedroso.

A maioria dos produtos é feita tanto com a imagem de Gabigol quanto a de Gabigolzinho. São copos, canecas, máscaras, bonecos, almofadas e até álcool em gel. A expectativa é que até o fim do ano as imagens do jogador e do personagem estampem roupas e calçados infantis, além de shampoos e pomada modeladora os cabelos.

Fernando Donasci/Reuters

Ídolos transcendem clubes

A equipe de Gabigol compara a experiência comercial do flamenguista com o sucesso de Neymar em termos de marcas. Fenômeno da publicidade, o craque do PSG estampa comerciais e editorais de várias marcas, entre elas a Puma, com a qual fechou em setembro um contrato no valor de 25 milhões de euros por ano. Neymar é o maior exemplo de criação de marca de um jogador de futebol dentro do futebol brasileiro. Antes de sair do Brasil em direção ao Barcelona, em 2013, o atacante já tinha produtos de sucesso com seu nome.

Para a equipe de Gabigol, o projeto do camisa 10 da seleção brasileira não teve o mesmo impulso inicial que o do camisa 9 do Fla. Justamente pelo fator rubro-negro. "Participei ativamente do início da carreira do Neymar, inclusive, da construção do primeiro perfil de Facebook e site e dos primeiros passos com licenciamentos. Estava tudo começando nesse meio, mas já era uma coisa absurda. Mesmo sendo o Santos, era absurdo. Mas não acho que o Neymar tenha conseguido atuar bem nessa parte de licenciamento", afirmou Junior Pedroso.

Para o empresário, a parceria com o Flamengo foi fundamental para o sucesso nas vendas, já que os produtos da marca Gabigol são vendidos nas lojas e site do clube. "Como estamos falando de um clube muito grande, a maior torcida do mundo, e você percebe isso na base de seguidores do Gabriel, do Gabigolzinho. Aí você começa a entender a força do Flamengo. É uma coisa absurda", explicou.

"Chegou a um ponto em que recebíamos e-mails e vídeos de gente do Nordeste, do Norte, do Sul: 'Meu filho é atleticano, mas é apaixonado pelo Gabigol'. O movimento das crianças foi absurdo, até mesmo fora do Brasil, na América Latina. Entendemos que era algo diferente, ele transcendeu em ser ídolo flamenguista".

Marina Nishitani, head de marketing da 4ComM, empresa que gerencia a carreira de Gabigol

Reprodução/Instagram @gabigolstore

Parceria com Flamengo e caminho aberto para o futuro

Desde o início, Flamengo tem sido um grande parceiro comercial, vendendo os produtos nas lojas do clube. No entanto, ainda não se sabe como será o futuro dessa parceria. O estafe do jogador tem planos para ampliar a presença no mercado e esse movimento pode tirar uma fatia das vendas do Rubro-negro.

Entre as ideias está a criação de uma loja virtual de Gabigol dentro do site da Amazon, o que aumentaria seu lucro, mas tiraria grana do Flamengo. Além disso, outros players, como a Netshoes, já se mostraram interessados em vender os produtos do jogador, o que comercialmente novamente não seria interessante para o clube.

Gabigol tem contrato com o Flamengo até o final de 2024. Com o apelo comercial do jogador para além dos limites da Gávea, a equipe não quer que ele fique preso ao modelo atual. "A comemoração, a autenticidade, tudo isso extrapolou o limite do clube. Tanto que vamos lançar produto do Gabigol e Gabigolzinho sem relação com o Flamengo. Somos a [marca] Gabigol, podemos vestir qualquer camisa. Não estamos menosprezando o Flamengo, que é nosso parceiro. Mas entendemos que se ele for para outro time, se ele quiser defender uma causa social, ele tem força para isso. Esse fenômeno nacional e até latino deu muita força para acreditar", afirmou a head de marketing Marina.

Bruna Prado/Getty Images Bruna Prado/Getty Images

Gabigol dá a palavra final em tudo

Gabigol participa ativamente dos negócios que envolvem seu nome. Ele dá ideias, escolhe layouts e tem poder de veto. "Tudo acontece na nossa empresa passa por ele. Não tem nada que ele não participe", explica Marina Nishitani.

O jogador trata a marca pessoal como o investimento que é. "Ele tem uma personalidade muito forte, é um cara muito preocupado com a imagem dele. Ele tem um fotógrafo, ele tem um videomaker. Ele não gosta de fazer as coisas de qualquer jeito. Se preocupa com detalhes, com o que vai produzir, publicar. Ter um cara que é criterioso com a própria imagem ajuda a gente bastante", disse Junior Pedroso.

Segundo o empresário, Gabigol fica contrariado se alguma decisão for tomada sem seu conhecimento. Fazer a divulgação em sua rede social, somente se estiver feliz com o resultado final.

"Se ele não fizer parte do projeto, não publica nas redes sociais dele. Só o que ele realmente gosta. E eu acho isso maravilhoso pois passa uma verdade para o consumidor", concluiu o empresário. O jogador só se abstém de debater a contabilidade, deixando esse ponto nas mãos dos pais, Valdemir e Lindalva.

[Gabigol] tem noção da força que sua imagem representa. Ele é diferente, é vaidoso, se veste diferente, toma conta do cabelo, da barba e isso faz diferença no produto final

Junior Pedroso, empresário do jogador

A última palavra é dele, que é muito autêntico. Ele só escolhe o que gosta. É preciso ter essa sintonia com as marcas interessadas na parceria. Tudo que trouxemos tem muita sintonia com ele

Marina Nishitani, head de marketing da empresa que gerencia a carreira de Gabigol

Agentes de Gabigol decidiram não terceirizar marca

No início da trajetória comercial de Gabriel Barbosa, empresas especialistas em licenciamento tentaram se aproximar do jogador. A equipe do jogador até consultou a agência que cuida dos negócios de Luccas Neto, responsável pelo maior canal infantil do Youtube do Brasil, mas o negócio não avançou.

O empresário Junior Pedrosa explicou que a família é fechada e a entrada de mais um integrante nos negócios poderia não ter o êxito esperado. Além disso, a equipe e as pessoas que cercam o jogador entenderam que o valor pedido pela agência era muito alto.

A solução foi investir na empresa que já gerenciava a carreira do jogador. Foram contratados novos funcionários e membros da diretoria fizeram cursos de reciclagem.

"Fizemos a opção arriscada de desenvolver tudo na nossa própria empresa. Eu mesma passei a estudar bastante sobre licenciamento. Eu e meu grupo nos qualificamos para desenvolver [o projeto] porque nós já conhecemos o Gabriel, temos proximidade, estamos juntos. Ele quis muito e participou diretamente de tudo. Entendemos que faria muito mais sentido fazer nós mesmos do que terceirizar", disse Marina Nishitani.

Abraçamos o projeto e aumentamos a equipe de licenciamento. O Flamengo nos ajudou bastante no início. Depois, passamos a prospectar oportunidades comercias e tivemos êxito com marcas grandes. Conseguimos atrair negócios com e sem o Flamengo

Junior Pedroso, empresário de Gabigol

Divulgação

Chuva de propostas e produtos esgotados

A entrada da marca Gabigol no mercado em março deste ano foi positiva. Desde então, o estafe recebe entre 30 e 40 propostas por semana de empresas de todos os tamanhos. "Recebemos o pedido e fazemos uma análise de credibilidade, de ativo, entender se é uma empresa justa, sólida, estruturada. Tem um time para avaliar. Se aprovado, vamos para segundo passo, que é estudar a área de marketing e ver o quanto isso tem liga com o Gabriel. Somente depois disso é que levamos a ele e família", afirmou Marina Nishitani.

Uma das primeiras grandes parcerias foi com a Kenner para a produção de chinelos. A marca Gabigol estampa uma linha para adultos e crianças, com produtos vendidos entre R$ 69 e R$ 169 no site da empresa. Lançada em junho deste ano, a parceria obteve lucro de R$ 4,5 milhões nos primeiros três meses de venda.

"É uma surpresa absurda para o mercado. Um fenômeno de vendas durante uma pandemia, com pessoas desempregadas, e gerar esse valor líquido é inacreditável. Surpreendeu a todos: nós, a empresa e o próprio mercado. Essa é apenas uma marca das parcerias. Agora é seguir em frente", comemorou a head de marketing da 4ComM.

Houve uma primeira remessa de minicraques, quase dois mil bonequinhos. Foram todos vendidos antes mesmo de ficarem prontos. Almofadas foram duas mil e também se esgotaram. Estamos até buscando um novo parceiro para poder atender a demanda de pedidos. Personagem de pelúcia também já esgotou. Perfume Jequiti, que ainda será lançado, já tem venda estourada. Linha de shampoo e pomada de cabelo que vai sair também esgotada. É surpreendente, cara. Não tinha noção do tamanho desse negócio. Me pegou de surpresa".

Junior Pedroso, empresário do jogador

Reprodução/Instagram

Até sósia tirou casquinha

O carisma de Gabigol é tão grande que até mesmo um sósia se aproveitou da imagem do jogador para ganhar seus minutos de fama e, claro, colocar uma graninha no bolso, com eventos e até parcerias comerciais. Um dos desafios de Jefferson Sales é acompanhar as mudanças de visual do astro.

"Já perdi até a conta de quantas vezes tive de mudar o visual para acompanhar o dele (risos). Ele muda muito rápido. Antes de ser sósia do Gabigol, eu cortava o cabelo de três em três semanas, uma vez ao mês, nessa média. Agora, de dois em dois dias estou no salão. Acho que gasto uns R$ 400 por mês", disse ele ao UOL Esporte em 2019.

Jeferson, que ficou conhecido como "Gabigordo" pela torcida, montou um time de sósias de jogadores. A turma, que fez muito sucesso em 2019, já não anda tão em alta assim, mas divertiu — e irritou — muitas pessoas durante seu auge. É assim, que mais um personagem pega carona na fama de Gabigol. Esse, porém, não é 'licenciado'.

+ Especiais

Andrew Powell/Liverpool FC via Getty Images

Fabinho convence até na zaga do Liverpool, mas só bate na trave na seleção

Ler mais
PA Images/PA Images via Getty Images

Pantera Negra, Eusébio encantou Ferroviária e quase jogou no Brasil

Ler mais
Marcus Steinmeyer/UOL

Téo José deixa a Fox e retorna ao SBT para assumir narração da Libertadores

Ler mais
Denis Tyrin\TASS via Getty Images

Qual é o futuro da lateral direita da seleção quando Dani Alves parar?

Ler mais
Topo