A Meca do Galo

Atleticanos desviam rota em BH para ver de perto a obra de R$ 900 milhões; UOL mostra em fotos

Victor Martins Colaboração para o UOL, em Belo Horizonte Marcus Desimoni/UOL

De pouco movimento, a rua Cristina Maria de Assis era conhecida apenas pelos moradores do bairro Califórnia, na Região Noroeste de Belo Horizonte. Mas hoje ela já virou uma espécie de Meca dos torcedores do Atlético-MG. Afinal, seu número 202 marca o endereço da obra de construção do estádio comercialmente batizado de Arena MRV.

Com 60% das obras concluídas, a previsão de atingir os 100% está mantida para outubro. No entanto, como é necessário uma série de etapas e testes para que o estádio seja liberado para receber a capacidade total de público, o primeiro jogo do time profissional masculino está marcado para maio de 2023. A ideia é fazer um amistoso contra algum clube da Europa, mas essa é uma conversa para outro momento.

A futura casa do Atlético, chamada oficialmente de estádio Elias Kalil (presidente do clube de 1980 a 1985 e pai de Alexandre, prefeito de Belo Horizonte e também ex-presidente do Galo), terá capacidade para 46 mil pessoas. Ainda não foi entregue, mas já é um sucesso de público. O local virou um ponto de peregrinação —basta ficar por cinco minutos na entrada para constatar a quantidade de torcedores que passam por ali apenas para conseguir uma fotografia com o futuro estádio do Galo ao fundo.

"Todo atleticano, pelo menos uma vez na vida, tem que visitar a Arena MRV", diz Reinaldo, o maior artilheiro da história do Galo, com 255 gols.

Agora, tem uma coisa: quem estiver mais apressado talvez nem precise desviar tanto a rota assim para ver a construção. Vista de diversos pontos da cidade, a Arena MRV é ainda mais imponente para quem passa pela Via Expressa, avenida que será o principal acesso à nova casa alvinegra. Embora menor do que o Mineirão no quesito capacidade, a Arena é mais alta. São 48 metros de altura do gramado até o teto, cerca de dez metros a mais do que o Gigante da Pampulha.

Marcus Desimoni/UOL

Sou atleticano da velha guarda, com 65 anos, desde que nasci e do interior, do Sul de Minas, o que não é fácil. Passei por tantas provocações e provações, que às vezes me abatiam, sim. Mas sempre vislumbrei um futuro grandioso para nosso Galo. Só não tinha ideia de que antes da minha finitude iria vivenciar essa preciosidade.

Edson Lopes Libanio, médico e morador de Baependi, cidade do Sul de Minas

Quando meu filho insistiu para ver as obras, achei que seria um monte de trator e terra virada. Confesso: segurei as lágrimas algumas vezes. Ao ver a esplanada, aquela grandiosidade, acho que enterrei todas minhas frustrações. Entendi que agora é um agora é um caminho sem volta, o Galo é gigante. Muito obrigado aos envolvidos.

Edson Lopes Libanio, após quase 380 quilômetros de distância na estrada entre as duas cidades

Divulgação/CAM
Rubens Menin, Ricardo Guimarães, Renato Salvador, Bruno Muzzi (CEO do Atlético e da Arena) e Rafael Menin

Qual o papel da MRV?

A MRV não deu o estádio para o Atlético e também não é responsável pela construção. A ligação pode até ser feita de forma automática, já que o futebol atleticano foi turbinado nos últimos anos com o dinheiro de alguns mecenas —entre eles, Rubens Menin, fundador da construtora. Menin também doou ao clube o terreno da obra. Por fim, a empresa comprou os naming rights do estádio, por R$ 60 milhões.

Então, é verdade que sem ele e seu filho Rafael Menin, Renato Salvador (Materdei) e Ricardo Guimarães (Banco BMG) —os 4 R's, como são chamados os investidores/torcedores que elevaram o patamar do time—, não teria Arena MRV, mas o dinheiro da edificação é 100% do Atlético.

O valor final da construção vai ficar em torno de R$ 900 milhões, sendo R$ 650 milhões o custo do equipamento e mais R$ 200 milhões em contrapartidas a Belo Horizonte —no total são mais de 100 itens, como construção de um posto de saúde, academia, escola de línguas e um parque, além de reparação para interferências viárias, que aumentaram o custo devido à elevação do preço para se produzir asfalto.

Marcus Desimoni/UOL

Para levantar quase R$ 1 bilhão, o Atlético vendeu metade de um shopping localizado na Região Centro-Sul de Belo Horizonte e antecipou a bilheteria de 10 mil lugares da arena por 15 anos, entre cadeiras e camarotes.

O clube também recorreu ao mercado financeiro e colocou CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários) à venda. O pagamento será feito de acordo com as receitas geradas pela venda das cadeiras, além de acordos publicitários vinculados ao próprio estádio. Com essa operação, a expectativa é que não falte dinheiro para entregar o acordado com a Prefeitura.

Outra confusão comum é acreditar que a MRV é responsável pela obra. O que também não é verdade. A empresa ligada ao Atlético é especializada em construção de residências. Um estádio de futebol foge de seu raio de ação. Por isso, as obras são de responsabilidade da Racional Engenharia.

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A prazo

As cadeiras cativas da Arena MRV são vendidas por R$ 39.528,00 e também por R$ 46.728,00. O valor varia de acordo com o setor e dá o direito de uso em jogos do Atlético por 15 anos. Considerando que o Galo faz uma média de 30 partidas como mandante a cada temporada, é como se o ingresso para cada jogo saísse por R$ 87,84 e 103,84, respectivamente. Os camarotes já foram todos vendidos.

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De ouvidos atentos

Para construir um estádio desse tamanho, é necessário muito material. Com 60% do total da obra concluída, a Arena MRV já recebeu quase 17 mil peças de concreto, que são encaixadas ao melhor estilo Lego, trabalho feito com o auxílio de gruas e guindastes. Das cinco gruas, apenas três ainda seguem em operação no canteiro de obras. Mais de 3,1 mil toneladas de aço já estão instaladas na estrutura metálica que terá pouco mais de 4 mil toneladas após finalizado.

Pensando no momento em que estádio estiver entregue, pronto para os jogos do Atlético, o detalhe da edificação que talvez mais interesse aos torcedores tem a ver com o que se chama de lã de rocha. É um material que vai entre as placas e tem dupla função. O estádio terá uma acústica melhor, além de ser um isolante térmico. Quer dizer: pode fazer barulho e ser aconchegante ao mesmo tempo.

Um detalhe curioso é que as placas externas, que vão dar a aparência final ao estádio, são construídas no próprio local, com a tecnologia de uma empresa espanhola.

  • Uma estrada

    São 585 quilômetros de cabos -- pense em eletricidade e internet. Essa extensão seria suficiente para ligar Belo Horizonte e São Paulo.

  • Pré-estreia

    Duas vezes por mês o Atlético abre visitas para o canteiro de obras da Arena MRV. Desde dezembro mais de 500 torcedores já foram nesse tour especial.

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Qual a grama?

Ainda não existe uma definição sobre o tipo de grama que será colocada na Arena MRV. A cobertura é bastante fechada e isso prejudica o gramado natural, que teria de receber iluminação artificial feita por equipamentos específicos. O gramado sintético tem muita força, até por ser uma Arena Multiuso. Mas o gasto de água com o gramado sintético é dez vezes maior do que no gramado natural.

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Quase sem parar

Mais de 2,3 mil trabalhadores estão envolvidos diretamente na construção do estádio, mas não todos ao mesmo tempo. Como toda construção tem suas etapas, alguns já não estão mais no canteiro de obras, como o pessoal responsável pela terraplanagem, por exemplo. Atualmente, são mais de 800 funcionários no dia a dia da construção, e o número ainda vai aumentar. Em breve, serão 1,2 mil pessoas trabalhando na conclusão do estádio.

Para atender o prazo estabelecido, a obra na Arena MRV é praticamente 24 horas por dia. O último turno encerra às 3h, com trabalhos que não fazem barulho, para não incomodar os vizinhos. Os trabalhadores são divididos em turnos e tarefas, que começa às 7h. Entre os profissionais envolvidos na construção, constam até alpinistas.

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Conectividade e acessibilidade

Transformar os jogos de futebol em um evento e faturar em cima disso. É assim que o Atlético-MG espera fazer mais de R$ 120 milhões por ano com a Arena MRV. Por isso, o projeto do estádio deu bastante atenção a alguns pontos importantes, como conectividade e acessibilidade.

Rampas dão acesso a todos os setores da Arena. Serão mais de 100 banheiros adaptados, além de lugares especiais para cadeirantes, sempre no primeiro degrau, de uma maneira que nenhum outro torcedor tampe sua visão do gramado.

Em alguns setores será possível carregar o celular sem sair da cadeira. Aliás, a conectividade é algo de destaque no planejamento. Recentemente o CEO do Atlético, Bruno Muzzi, esteve nos Estados Unidos, acompanhado de outros dirigentes. A ida ao país norte-americano foi para visitar estádios e conhecer tecnologias que poderão ser utilizadas na Arena MRV, como iluminação e antenas que garantem Wi-Fi para todos os torcedores.

Pedro Souza/Atlético-MG

Como fica o Mineirão?

Até a inauguração da Arena MRV, o Atlético vai seguir jogando no Mineirão, sua casa desde 1965. Não será fácil deixar para trás quase 60 anos de história. Mas e como ficará o Gigante da Pampulha sem um de seus dois principais inquilinos? Como o América-MG tem o Independência e o Galo também terá seu estádio, o Mineirão ficará apenas para o Cruzeiro.

Porém, desde 2013, após a reforma para receber os jogos da Copa do Mundo, o maior estádio de Minas Gerais não depende apenas do futebol para sobreviver. Antes da pandemia, mais de 40% do faturamento do Mineirão vinha de eventos, como shows. Para 2022, por exemplo, estão previstos mais de 200 eventos no estádio, tanto que Atlético e Cruzeiro tiveram de mandar jogos no Independência recentemente, já que o Gigante da Pampulha estava ocupado por atrações musicais.

Claro que o Atlético fará falta ao Mineirão, mas o estádio não depende apenas de um clube para sobreviver.

Porém, a questão envolvendo o Independência preocupa um pouco mais. Durante os nove anos em que o Atlético foi sócio participante da SCP Arena Independência, junto da LuArenas, jamais o clube alvinegro teve lucro operacional com o equipamento. Novamente o estádio está sob gestão do América, que é o proprietário do local, que não tem condições de receber outros eventos que não sejam esportivos.

Em 2022, como mandante, o Galo foi mandante em nove partidas no Mineirão e em outras quatro no Independência.

Marcus Desimoni/UOL Marcus Desimoni/UOL

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