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Pazuello participa de evento de pré-candidatos com chope e salgados grátis

Lola Ferreira e Camila Turtelli

Do UOL, em Brasília e no Rio de Janeiro

10/06/2022 21h45

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello — um dos mentores do programa de governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) deste ano — e o jornalista Waldir Ferraz — amigo do presidente há mais de três décadas — estiveram em um evento que reuniu pré-candidatos do PL na noite de quinta-feira (9), em um restaurante na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, com rodada de chope e salgadinhos de graça.

A distribuição de bebidas alcoólicas e comida em um evento com caráter pré-eleitoral pode ferir a lei, de acordo com a interpretação de especialistas ouvidos pelo UOL.

"Fornecer alimentos em ato de pré-campanha, assim como bebida alcoólica de forma gratuita, pode ser enquadrado como oferta de vantagem indevida a eleitor", afirma o especialista em direito eleitoral Filipe Lizardo.

Além de Pazuello e Waldir, que é pré-candidato à Câmara dos Deputados, também estavam no evento os pré-candidatos a deputado federal Alexandre Zibenberg e a deputado estadual Marcelo Bertolucci e Roberto Motta, aliado do ex-governador do Rio Wilson Witzel (PMB) nas eleições de 2018. Todos filiados ao PL.

O ex-ministro da Saúde se declarou "candidato a pré-candidato", e ressaltou à reportagem que esteve na reunião como convidado. "Deixei claro que não sou pré-candidato ainda", disse ao UOL na manhã de sexta (10).

O general, que se filiou ao PL em abril, já flertou algumas vezes com as eleições e foi cotado, inclusive, para ser candidato ao Senado pelo Amazonas. Atualmente, especula-se que ele tentará uma vaga de deputado federal pelo Rio de Janeiro.

O tom eleitoral das declarações marcou o convescote, que começou por volta das 19h e acabou quase três horas depois. Aqueles que falaram ao microfone usaram frases de efeito e apresentaram propostas para a segurança e ao combate da corrupção e do tráfico de drogas, principalmente. Também eram ovacionados ao citar o presidente da República.

"Primeiro chope não paga"

A presença dos bolsonaristas atraiu cerca de cem pessoas ao restaurante Beco do Alemão, a dois quilômetros do condomínio Vivendas da Barra, na zona oeste da cidade, onde Bolsonaro possui um imóvel. Aqueles que pediam uma bebida, ouviam do garçom: "O primeiro chope não precisa pagar".

Ao longo da noite, pratos com salgadinhos e minipastéis também foram oferecidos de graça no salão reservado ao evento no restaurante.

Cartaz convoca correligionários para evento de pré-campanha com Pazuello e chope de graça Imagem: Reprodução

O encontro foi organizado pela líder do Movimento Elite Popular, Marcelle Herdy. Ao UOL, ela disse não se tratar de uma agenda política.

"O local onde foi feito o evento é aberto ao público, dispõe de comanda individual e cada pessoa que compareceu pagou sua própria despesa", disse. "Não houve nenhuma espécie de distribuição de comida ou bebida de forma gratuita."

Como líder do movimento, eu fiz o convite para pessoas que me identifico, pela história pessoal e pelos princípios de cada um"
Marcelle Herdy, líder Movimento Elite Popular

Contudo, a reportagem testemunhou a distribuição gratuita dos comes e bebes. Conforme informado nas redes sociais (no anúncio reproduzido acima), garçons circulavam pelo salão com pequenos pratos de petiscos, como bolinhas de queijo e pasteizinhos.

Em relação a bebidas, os convidados foram avisados que o consumo seria marcado na comanda a partir da segunda rodada de chope — outras bebidas, como drinques, eram cobrados desde o início. Ao sair, os participantes arcavam com os seus gastos individuais.

Legislação

Para o advogado Cristiano Vilela, especialista em direito eleitoral, a distribuição gratuita de alimentos e chope extrapola os limites permitidos de eventos pré-campanha — como reuniões para discutir pontos da candidatura e eventuais propostas.

"Esse evento tem como atrativo e chamariz a distribuição de comida e bebida, o que não é permitido nem mesmo na campanha eleitoral", diz Vilela.

"Se fosse um mero evento de comemoração não caberia mencionar a pré-candidatura. A união desses elementos configura a campanha antecipada."
Gustavo Vilela, especialista em direito eleitoral

O evento pode ser enquadrado como infração ao artigo 299 do Código Eleitoral e ao artigo 36 da Lei das Eleições, de acordo com Filipe Lizardo.

"A legislação veda de forma taxativa que candidatos e pré-candidatos ofereçam bens ou qualquer vantagem aos eleitores, seja durante o período de campanha ou pré-campanha, conforme já decidiu o Tribunal Superior Eleitoral [em 2020] ao analisar caso concreto envolvendo o crime de compra de votos", diz.

Já o advogado Gustavo Guedes, também especialista na área, pondera sobre o período da realização do evento.

"Fosse esse evento durante a campanha, não teria dúvida de dizê-lo absolutamente ilegal, por conta da oferta de benefícios aos eleitores: comida, bebidas e camisetas. Contudo, na fase de pré-campanha, ausente a figura do candidato e eleitores, só vejo como analisá-lo sob a óptica do abuso de poder econômico, o que dependeria da verificação de outros requisitos para configurá-lo", diz.

Palavras de ordem e manifestação popular pró-Lula

Apesar do caráter intimista, não havia controle de quem entrava no espaço da reunião, que ficava na saída do restaurante e atraía a atenção de quem aproveitou a noite de quinta-feira para jantar no local.

O painel improvisado, com bandeiras do Brasil e do estado do Rio de Janeiro presas com fitas transparentes, chamou a atenção e indicou o teor do evento.

Por ao menos duas vezes, as falas dos presentes foram interrompidas por gritos pró-Lula ou contrários a Bolsonaro por quem passava pelo salão. Da primeira vez, os convidados ficaram em silêncio e murmuraram: "Sempre tem um". Da segunda vez, houve xingamentos ao ex-presidente.

O evento começou com a execução do Hino Nacional e a oração de um Pai Nosso, tudo sob olhares atentos de Marcelle Herdy.

Pazuello discursa em evento de pré-campanha no Rio de Janeiro Imagem: Lola Ferreira/UOL

Quem são e o que falaram os pré-candidatos

Pazuello, Ferraz, Motta e Zibenberg fizeram discursos de aproximadamente dez minutos. Zibenberg, fundador do site Política BR, falou contra o "marxismo cultural", "ideologia de gênero", "movimento gayzista", "movimento abortista" e feminismo, além do educador Paulo Freire.

"Precisamos lutar contra isso, senão vamos perder uma geração, porque a geração daqui é conservadora, com valores de família e pátria", disse.

Roberto Motta se apresenta nas peças de divulgação como ex-secretário de Segurança do Rio de Janeiro, mas a pasta foi extinta por Witzel no primeiro dia de mandato, em janeiro de 2019.

Ele foi secretário-executivo do Conselho de Segurança Pública do Rio, órgão criado e excluído por Witzel em apenas 14 dias. A missão do extinto conselho era fazer transição para as estruturas mantidas até hoje, com polícias Civil e Militar com status de secretaria.

Em seu discurso, Motta atacou também a esquerda e a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que restringe operações policiais em favelas do Rio de Janeiro durante a pandemia. Erroneamente, Motta afirmou que as operações estavam proibidas.

Waldir Ferraz é amigo de Bolsonaro há décadas e virou notícia no início deste ano. À revista Veja afirmou que Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente, foi responsável por comandar o esquema de desvio de verba pública — as "rachadinhas" — nos gabinetes do então deputado federal Jair Bolsonaro e dos filhos Flávio e Carlos.

"Faz-tudo" presidencial, Ferraz se autodenomina idealizador das motociatas do presidente e aproveitou seu espaço para divulgar os eventos futuros.

O pré-candidato relembrou a amizade de mais de 30 anos com os Bolsonaros e finalizou sua fala colocando em dúvida o desfecho das eleições.

"Começamos a fazer campanha em 1987 para vereador e deu para acreditar, [ele] chegou lá. E vai prolongar por mais quatro anos, de qualquer jeito. De qualquer jeito. Se não sair no primeiro turno, não vai ter o segundo", disse.

Pazuello, por sua vez, defendeu a "aclamação" ao presidente Bolsonaro. "Essa aclamação vai fazer a diferença. Não basta votar, tem que aclamar. O presidente precisa de uma tropa de choque", disse o ex-ministro.

Ao final da noite, perto das 22h, os convidados posaram para fotos ao som da música Tropa de Elite, popularizada no filme homônimo. Pazuello até arriscou alguns passos de dança.

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