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Por que ter dados raciais da Covid-19 melhora o enfrentamento à doença

Hospital de campanha montado pela Prefeitura de Betim, em Minas Gerais, fica a 10km do Jardim Teresópolis e 18km do Marimbá, bairros da periferia da cidade Imagem: Leo Lara

Bruno Torquato

Colaboração para Ecoa, em Betim (MG)

13/04/2020 15h33

Após 14 semanas da pandemia do novo coronavírus no Brasil, o Ministério da Saúde começou a divulgar um recorte de raça, gênero e localização nos dados relativos à doença. A medida veio depois de pedido feito pela Coalizão Negra por Direitos, via Lei de Acesso à Informação, e pelo Grupo de Trabalho de Saúde da População Negra da Sociedade Brasileira Medicina de Família e Comunidade (SBMFC).

De todas as hospitalizações pela Covid-19, 18,9% são de pessoas pardas e 4,2% de pessoas pretas, mas as porcentagens sobem quando se trata de óbitos, ficando em 28,5% e 4,3%, respectivamente. Do outro lado, as hospitalizações de pessoas brancas representam 73,9%, mas em óbitos elas caem, sendo de 64,5%. O que significa que, proporcionalmente, a doença é mais letal em negros e negras.

Especialistas ouvidos por Ecoa reiteram a importância de ter acesso a esses dados, bem como de aprofundar o nível de detalhamento deles, a fim de tornar a luta contra o vírus mais igualitária e eficaz.

"É essencial para a saúde da população entender as demandas de cada grupo, seja ele etário, de gênero, de classe ou racial. O racismo estrutural e estruturante na sociedade brasileira é um forte fator de violação de direitos e produção de iniquidades, especialmente no campo da saúde", diz Etiene Martins, especialista em Comunicação Social e Saúde pela Escola de Saúde Pública de Minas Gerais (ESP-MG) e mestranda na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Maioria no Brasil (56%), a população negra representa 75% entre os mais pobres no país, enquanto os brancos estão entre os 70% mais ricos. O básico das condições de moradia também tem um cenário discrepante: os negros são os que têm menos acesso a coleta de lixo, abastecimento de água e esgoto sanitário, segundo o último informativo "Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil" do IBGE, de 2019.

Para Lúcia Xavier, diretora da ONG Criola, entidade que integra a Coalizão Negra por Direitos, aumentar o nível de informação é melhorar a prevenção. "A pandemia começou com pessoas de melhores condições de vida, mas não conhecemos o impacto na população negra. Temos apenas uma ideia de que ela morre mais. Acredito que [os dados] possam ser incrementados."

Denize Ornelas, diretora de comunicação da Sociedade Brasileira Medicina de Família e Comunidade, sugere o cruzamento de informações, combinando fatores como, por exemplo, incidência em hospitais públicos ou privados e cor da pele. Ela acredita ainda que é importante saber quantos testes foram feitos nas periferias e favelas, qual é o percentual de pessoas negras e brancas testadas, bem como se o tratamento está adequado.

Para Denize, ter mais transparência e detalhamento nos dados afeta diretamente no plano de ação a ser efetuado. "Assim é possível acompanhar a execução das políticas públicas. Sabemos que a concentração de leitos de UTI é nos centros [em São Paulo, três subprefeituras — Pinheiros, Sé e Vila Mariana — concentram 60% desses leitos], e as pessoas negras estão na periferia. Os hospitais de campanha estão sendo levantados nos centros urbanos. Se queremos construir uma política pública de forma igualitária, precisamos dos dados", resume.

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