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Rodrigo Ratier

REPORTAGEM

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Exausto, professor tem excesso de trabalho, alunos e turmas

Professor cansado - iStock
Professor cansado Imagem: iStock

Colunista de Ecoa

27/04/2023 06h00

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Professores e professoras atuando em mais de uma escola - às vezes, em mais de uma rede -, com cargas horárias exaustivas, muito maiores do que as observadas em países como Estados Unidos, França e Japão. É essa a radiografia do Ensino Fundamental 2, etapa que cobre do 6º ao 9º ano. É a fase em que os docentes "polivalentes", que ministram todas ou mais de uma disciplina, dão lugar aos "especialistas" - responsáveis por um único tópico, e que, para compor sua carga, quase sempre precisam pingar de escola em escola em busca de aulas.

Os dados são do relatório "Volume de trabalho dos professores dos anos finais do Ensino Fundamental", publicado pelo coletivo Dados para um Debate Democrático na Educação (D3E), em parceria com a Fundação Carlos Chagas (FCC) e o Itaú Social. A pesquisa colabora com as evidências de que a rotina extenuante cobra um preço alto, comprometendo a saúde física e mental dos educadores - com implicações como alto índice de faltas e pedidos de licença médica - e do próprio trabalho em sala de aula. Sem tempo para planejar aulas, avaliar o desempenho de cada aluno ou participar de atividades coletivas na escola fora de sala, o dia a dia desgastante compromete a aprendizagem.

Em fevereiro, a coluna relatou a rotina da professora Dayana Vieira de Rezende Silva, obrigada a se deslocar diariamente entre dois municípios do interior de Minas Gerais para lecionar em 35 turmas, num total de mil alunos. O levantamento da D3E mostrou que o cotidiano da docente de Artes está mais para regra do que exceção. O estudo, que também analisou outros fatores ligados à exaustão docente, como a quantidade de turmas por professor e a média de alunos em cada turma, chegou às seguintes conclusões:

  • 45% dos professores brasileiros atuam em mais de uma escola; 30% deles estão em mais de uma rede de ensino;

  • As médias de turmas por professor estão entre 14 e 17, enquanto a média registrada nos Estados Unidos e no Japão é de até sete turmas por professor;

  • Os alunos por sala podem chegar a 40 ou até 45 (em especial nos 8º e 9º anos), embora pareceres do Conselho Nacional de Educação (CNE) recomendem o número máximo de 30;

O problema persiste no restante da escolarização. Pesquisadora da Fundação Carlos Chagas (FCC) e uma das coordenadoras da pesquisa, a especialista em Administração Pública Gabriela Moriconi, aponta que a sobrecarga iniciada no Fundamental 2 tende a se aprofundar no Ensino Médio, justamente pela continuidade do modelo da etapa anterior. "O número de alunos por professor tende a ser até mais elevado no Médio do que nos anos finais do Fundamental. Também há mais disciplinas com menos aula por semana, o que leva mais professores a assumirem mais turmas".

Só se salvam do problema da falta de aulas por turma os docentes de Língua Portuguesa e Matemática, disciplinas que costumam ter até seis aulas por semana em cada sala. Entre as outras disciplinas, História, Geografia, Biologia, Física e Química (as três últimas agrupadas sob o rótulo de Ciências, no Fundamental 2), costumam ter até três aulas semanais. A situação é mais complicada em disciplinas como Inglês, Artes e Educação Física, com duas ou mesmo uma aula por semana.

"Para completar sua carga horária, é comum que um professor desses componentes curriculares tenha de assumir o dobro ou o triplo de turmas em comparação aos colegas de Língua Portuguesa ou Matemática. Isso resulta em grandes diferenças em relação ao número total de alunos dos professores", afirma Gabriela.

A pesquisadora destaca que uma reformulação da grade curricular atenderia não apenas à necessidade dos professores por condições de trabalho mais dignas, mas também a questões pedagógicas urgentes. "Retomando o exemplo da Língua Estrangeira, o que se espera em relação à aprendizagem dos estudantes ao se reservar apenas uma ou duas aulas semanais para um componente curricular como esse?"

Com organização adequada, as escolas de tempo integral também são apontadas pelo estudo como uma possível solução para essa sobrecarga, uma vez que os professores continuariam dando muitas aulas, mas poderiam concentrar-se em uma única unidade escolar com um número razoável de turmas para lecionar. Outras sugestões são a limitação da jornada de trabalho a 40 h semanais - incluindo o trabalho extraclasse, que por lei deve compreender ao menos um terço da carga total -, a melhoria da remuneração e garantia de turmas de, no máximo, 30 alunos para o Fundamental 2.

Colaborou Gabriel Costa (reportagem e texto)