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Por que aplicativo diz que encomenda vai de bicicleta e ela chega de moto

Motoboys burlam aplicativos de delivery ao informar que estão de bicicleta; tática serve para obter corridas mais curtas, dizem Imagem: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

Paula Gama

Colaboração para o UOL

26/09/2021 04h00

Você possivelmente já passou por essa situação: após fazer pedido em aplicativo de entregas, como iFood e Rappi, chega mensagem no celular com o nome do entregador e a previsão de chegada, acompanhada da informação de que ele está de bicicleta. Quando a encomenda chega, antes até do prazo previsto, surpresa: o profissional, na verdade, está pilotando uma moto.

Motoboys ouvidos por UOL Carros admitem que cadastram a bicicleta como veículo de trabalho, burlando o app, para evitarem deslocamentos muito longos e conseguirem mais viagens, em tempos de gasolina inflacionada. Segundo a categoria, essa é a maneira encontrada para aumentar um tanto a respectiva renda, que já é escassa e exige longas e arriscadas jornadas diárias para ser obtida.

Segundo um dos profissionais entrevistados, sob condição de anonimato, os aplicativos priorizam ciclistas para entregas mais curtas e motociclistas para as mais longas.

"O meu cadastro como ciclista foi a forma que encontrei para conseguir fazer uma quantidade rentável de entregas diárias. O problema não está em fazer viagens mais longas, porque somos pagos de acordo com a quilometragem, mas na distância percorrida com a mochila vazia entre a casa do cliente e o próximo restaurante", afirma um motoboy que prefere não se identificar, com medo de ser banido da plataforma.

Proprietária de uma browneria em Vila Velha (ES), Samara Werneck já passou pela situação relatada.

"Sempre achei que era um bug do sistema. Na verdade, é algo para o qual nunca dei muita importância. A entrega acaba sendo mais rápida." A empresária não foi a única a passar por isso e identificamos relatos semelhantes em São Paulo e Salvador (BA), por exemplo.

Questionado, o Rappi, por meio de nota, afirma que distribui os pedidos entre os entregadores parceiros de acordo com os trajetos a serem percorridos: as distâncias maiores vão para os motorizados, que recebem um adicional decorrente desse deslocamento.

"O Rappi informa que a declaração da modalidade do veículo constitui responsabilidade exclusiva do entregador e, caso seja identificada fraude, a plataforma poderá fazer a desativação dele", complementa.

Já o iFood também diz que a conduta prejudica os demais entregadores que estão cadastrados e trabalhando de forma correta e isso pode levar ao bloqueio do cadastro.

"O iFood enfatiza que não tem interesse nenhum em ter seus parceiros bloqueados e, por isso, trabalha com ações educativas e orientações. O mau uso do aplicativo de forma recorrente é uma infração aos termos de uso da plataforma, o que pode configurar bloqueio permanente e encerramento do cadastro", afirma a empresa.

Como é calculado o valor das entregas?

Ciclistas são priorizados para entregas mais curtas Imagem: ALEXANDRE GONDM/JC IMAGEM

Segundo o iFood, o valor pago ao parceiro por entrega varia de acordo com quatro variáveis: o número de pedidos a ser retirado no restaurante; o perfil da cidade; a hora e o dia da semana; e o veículo cadastrado. O valor mínimo da entrega, informa, é de R$ 5,31 e há um adicional de, pelo menos, R$ 1 por cada quilômetro rodado. Também há uma taxa se o entregador estiver a mais de 5 km de distância do endereço do cliente.

Outro profissional ouvido por nossa reportagem usa a "estratégia" alegando que é a forma encontrada para garantir remuneração suficiente, considerando os custos para abastecer e manter sua motocicleta.

"Eu ganho uma média de R$ 120 a R$ 150 por dia, fazendo entre dez e 15 entregas e trabalhando em dois turnos. Em dias de bônus e promoções, dá para tirar um pouco mais. Também existem as gorjetas, mas não dá para contar com isso. Desse valor, tenho que retirar o custo da gasolina, que está na casa dos R$ 6 o litro, e da manutenção da moto. É um trabalho honesto, mas recorro ao cadastro da bicicleta para o trabalho valer a pena no fim do dia", conta o motoboy.

Para associação, entregas não valem a pena

Presidente da AMABR (Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil), Edgar Francisco da Silva confirma que a tática existe e que é consequência daquilo que muitos motoboys, segundo ele, têm percebido na prática: não vale a pena trabalhar com aplicativos.

Silva avalia que o foco dos aplicativos não está no profissional motofretista, mas em pessoas que apelaram às entregas como alternativa ao desemprego.

"O grande problema é que essas pessoas não sabem fazer a conta do custo do serviço. Elas pensam apenas que estão ganhando mais do que no antigo trabalho, mas não consideram o custo com a depreciação de veículo, celular, roupas e equipamentos de segurança", analisa.

Gringo, como é conhecido, levanta outro ponto: o risco de acidentes.

"Um trabalhador que ganha pouco, alimenta-se mal, não faz manutenção no veículo e trabalha muitas horas por dia começa a correr para realizar mais entregas. Como não tem equipamentos de segurança de qualidade, começa a cometer infrações e pagar multas e uma hora acaba se envolvendo em um acidente. Precisamos encontrar formas de dar dignidade ao trabalho dessas pessoas".

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