Coronavírus pode se espalhar no Carnaval? Infectologistas respondem
Wanderley Preite Sobrinho
Do UOL, em São Paulo
04/02/2020 04h00
Resumo da notícia
Aglomerações no Carnaval podem ser situação propícia para que um vírus se espalhe
Recomendação para pessoas que estejam doentes é ficar em casa
Milhares de pessoas se espremem em uma faixa da rua cantando, conversando, trocando abraços e beijos. A cena, típica de um bloco de Carnaval, parece inofensiva, mas pode representar o ambiente propício para o coronavírus se espalhar pelo território nacional.
A nova cepa do vírus ainda não chegou ao Brasil oficialmente. Por enquanto, 14 pessoas estão sob observação. O vírus, no entanto, segue se espalhando pelo mundo e pode chegar por aqui a qualquer momento, e o Carnaval pode ser o mais delicado deles.
Na semana passada, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou que não há "nada específico sobre o Carnaval". Ele garantiu que portos e aeroportos serão monitorados e recomendou "lavar as mãos e evitar compartilhar objetos, como copo e talheres".
Como o vírus pode chegar ao Brasil?
De acordo com o Ministério da Saúde, todos os dias 250 pessoas entram no Brasil vindas da China. "É provável que um deles chegue com um vírus ou com ele incubado para pular o Carnaval", afirma o médico infectologista do hospital Igesp (Instituto de Gastroenterologia de São Paulo), Marco Antonio Cyrillo.
"Tudo o que o vírus quer é alguém por perto para passar de uma pessoa para outra", diz. "No Carnaval, milhares ficam juntos, alguns em ambientes abertos, outros em ambientes fechados."
O especialista lembra que muitos foliões podem chegar ao Brasil já doentes, mas sem sintomas. "Assim como na Alemanha, é possível que alguma pessoa ainda assintomática transmita o vírus."
Por que os blocos de Carnaval são perigosos
Destino preferido de foliões, São Paulo espera pôr na rua 15 milhões pessoas no Carnaval a partir de 15 de fevereiro: serão 796 blocos em 861 desfiles. No Rio e em Salvador, a expectativa é que desembarquem 1,9 milhão e 800 mil turistas, respectivamente.
O médico explica que um paciente doente precisa de uma distância entre um e três metros para contaminar outra pessoa. "O Carnaval vai ser uma época de maior preocupação porque há muito contato íntimo, como abraços e beijos em blocos e salões de festa."
"Uma pessoa pode contaminar três pessoas, em média", diz Rosana Richtmann, infectologista do hospital Emílio Ribas. "É parecido com a transmissão da Sars (Síndrome Respiratória Aguda Grave). O paciente com sarampo, por exemplo, pode infectar entre 12 e 18 pessoas."
Vírus no Carnaval resultará em surto?
Para a médica, os brasileiros não precisam ficar alarmados caso o vírus chegue ao Brasil no Carnaval. "Cerca de 15% dos casos são graves, precisam de hospitalização. O risco de morrer de coronavírus é baixo, em torno de 2%", afirma.
Embora o "risco seja real" de contaminação durante a festa, Richtmann acredita que a propagação será menor quando a data chegar, no final de fevereiro. "A quarentena na China começou no dia 23 de janeiro e vai durar duas semanas. Nesse período, quem teve a doença, teve. Quem não teve, não terá mais contato com infectados."
"Além disso, o calor do Brasil é ruim para o vírus. O problema é maior no hemisfério Norte, mas por lá a vigilância sanitária é alta", diz a médica.
E se você ficar doente no Carnaval?
Para Cyrillo, "ficar em casa" é a primeira dica a quem contrair alguma doença respiratória durante o Carnaval. "Se for uma pessoa com doença cardíaca, pulmonar, HIV, se for idoso, criança ou grávida, evite qualquer contato com as pessoas durante a festa."
Ele também sugere alguns cuidados: "Higienize suas mãos, use máscaras e limpe os objetos de uso frequente com água e sabão".
O governo vai cancelar a festa?
O médico do Igesp duvida. "Não acredito que alguém vá cancelar uma festa com milhões de pessoas e forte investimento. Nós teremos de esperar os próximos dias para ver as medidas preventivas, mas o Carnaval deve acontecer como sempre."
Para a médica, "as autoridades devem tomar alguma decisão" em breve. "O que a gente pede das pessoas é bom senso. Quem vier de uma região com transmissão ativa do vírus, não saia na rua, não se exponha."
Ela acha difícil, no entanto, que alguns estrangeiros resistam à folia. "Imagina um estrangeiro que pagou a viagem e chegou ao Brasil para a festa... Não sei se ele vai ter essa responsabilidade de não contaminar outras pessoas."