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Beta-alanina retarda fadiga muscular, mas não ajuda no ganho de força

A beta-alanina é um aminoácido que participa da formação da carnosina, substância que retarda a fadiga muscular - iStock
A beta-alanina é um aminoácido que participa da formação da carnosina, substância que retarda a fadiga muscular Imagem: iStock

Diana Cortez

Colaboração para o VivaBem

06/05/2020 04h00

Apesar de não ser regulamentada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) como suplemento para atletas, muitos praticantes de atividade física consomem beta-alanina, usando suplementos trazidos em viagens internacionais, produzidos em farmácias de manipulação ou comprados no "mercado ilegal dos importados" — o que não é seguro, pois não há garantia das substâncias presentes na embalagem.

Mas, dependendo da modalidade que a pessoa pratica, talvez o "esforço" para adquirir o produto nem valha a pena. Apesar de ser comercializada com a ideia de contribuir para o ganho de força, a beta-alanina não tem esse efeito. O principal benefício da substância, na verdade, é retardar a fadiga muscular em esportes intensos e de curta duração, como corridas de 100 m a 1.500 m. A seguir, explicamos como funciona o suplemento.

Tire suas dúvidas sobre a beta-alanina

O que é a beta-alanina?

Trata-se de um aminoácido produzido naturalmente pelo fígado que, juntamente com o aminoácido L-histidina, participa da formação da carnosina ?substância capaz de reduzir a acidose responsável pela fadiga nos músculos. Isso mesmo. Ela retarda aquela sensação de queimação que surge ao correr em alta velocidade ou em uma sequência saltar, por exemplo, e que acaba limitando a contração muscular.

Para que serve o suplemento?

Estudos realizados até hoje mostram que a beta-alanina contribui para as atividades físicas de alta intensidade e curta duração ?entre 30 segundos e 10 minutos ?, como corridas de 100 m a 1.500 m e natação de 200 m, que exigem um esforço muito intenso e levam o músculo à exaustão por conta do aumento da produção de ácidos.

Na prática, o suplemento eleva os níveis de carnosina, substância que modula o pH das células musculares, adiando a fadiga muscular e contribuindo para o desempenho físico do atleta, conforme mostra uma meta-análise publicada pelo British Journal of Sports Medicine.

A beta-alanina traz benefícios para quem faz musculação ou outros esportes?

Não há evidências científicas de que o suplemento melhora o desempenho no treinamento de força tradicional (musculação). A substância também não apresenta benefícios para atletas de atividades de longa duração (corrida de rua, ciclismo de estrada), já que esses exercícios são feitos em intensidade moderada e envolvem outros mecanismos fisiológicos que levam à fadiga muscular.

Por outro lado, uma pesquisa realizada com atletas de judô confirma que a beta-alanina pode dar uma mãozinha nas modalidades intervaladas ou acíclicas ?aquelas que mesclam momentos de baixa, média e alta intensidades. Portanto, os praticantes de crossfit, futebol, basquete, vôlei e handball também podem se beneficiar com o suplemento.

Após quanto tempo de uso a beta-alanina faz efeito?

Os benefícios do suplemento em atletas que praticam exercícios intensos e de curta duração foram observados somente a partir de quatro semanas de consumo contínuo.

Esse tempo é necessário para que a beta-alanina ingerida eleve o nível decarnosina dentro das células musculares. Portanto, não é verdadeira a ideia de que doses avulsas do suplemento consumidas antes do treino vão possibilitar uma melhora no desempenho do esportista na mesma hora.

Quando e quanto tomar?

Para evitar a sensação de formigamento e ajudar o organismo a aproveitar melhor o suplemento, a dose média indicada do suplemento é de 3 gramas por dia de beta-alanina, fracionadas em três ou quatro porções diárias. Elas podem ser consumidas puras ou junto às refeições, pois estudos mostram que não há uma interação com os alimentos que prejudique sua absorção.

Mesmo assim, lembre-se: o suplemento somente apresentará resultados a partir de quatro semanas de uso contínuo.

É seguro consumir beta-alanina?

Até o momento não existe qualquer evidência científica de que o consumo de beta-alanina traga risco ou prejuízo à saúde. Recentemente, um estudo publicado no European Journal of Nutrition mostrou que o uso do suplemento, mesmo por um tempo prolongado, é seguro para pessoas saudáveis. A análise teve a duração de seis meses e não verificou alteração nas funções renal e hepática dos participantes que consumiram o suplemento diariamente.

As análises também mostraram que, após a interrupção de seu uso, os níveis de carnosina caíram lentamente, voltando às taxas originais em 12 semanas.

A beta-alanina apresenta algum efeito colateral?

Sim. Doses a partir de um grama do suplemento geralmente causam um formigamento na pele ?efeito chamado de parestesia ?, que dura cerca de 30 minutos após sua ingestão e pode ser bastante desconfortável. Mas é algo transitório e não traz qualquer prejuízo à saúde.

Acredita-se que isso aconteça devido à forma molecular da beta-alanina ser parecida com a de um neurotransmissor. Assim, ela seria reconhecida por receptores neurais que existem na pele e geraria a sensação.

O suplemento emagrece ou aumenta os músculos

Não existe qualquer evidência científica de que o consumo de beta-alanina ajude no ganho de massa muscular ou contribua para a perda de peso

Cápsula, tablete, pó: como a beta-alanina é encontrada?

Como falamos, o suplemento não é liberado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para produção e venda no Brasil. Em outros países, geralmente o produto é comercializado em pó, sachês, cápsulas ou tabletes.

A beta-alanina também entra na fórmula de alguns pré-treinos, apesar de não ter essa função. Provavelmente, a sensação de formigamento promovida pela substância induza o esportista a acreditar que o suplemento possa ter um benefício instantâneo. Mas isso não é visto nos estudos.

A beta-alanina tem glúten?

Não. A beta-alanina é um aminoácido, portanto, não possui glúten ?que é uma proteína encontrada no trigo, no centeio, na cevada.

Mas quem é alérgico ou intolerante ao glúten deve sempre verificar nos rótulos dos suplementos se a substância está presente no produto, uma vez que os fabricantes podem misturar outros ingredientes.

O suplemento pode dar alergia

Estudos realizados até hoje não registraram nenhuma evidência de que a beta-alanina isolada possa causar alergia. Mas produtos pré-treino com o aminoácido podem trazer outras substâncias que têm potencial para alergias, como corantes.

Suplemento de beta-alanina tem cafeína?

A beta-alanina pura não tem cafeína. No entanto, alguns suplementos com o aminoácido, como os pré-treinos, acabam combinando a beta-alanina com cafeína para oferecer ao esportista mais gás e concentração durante o treino.

Nunca é demais lembrar que a beta-alanina não traz benefícios para praticantes de esportes quando consumida antes do treino. Seus efeitos surgem após cerca de quatro semanas de uso do suplemento.

Faz cair cabelo?

Não existe nenhuma relação entre o consumo de beta-alanina e a queda de cabelo, pois até o momento não há evidência científica de que o suplemento cause alterações hormonais.

Grávidas e lactantes podem consumir o suplemento?

Apesar de não haver riscos para a saúde, nenhum suplemento esportivo deve ser consumido por gestantes e mulheres que estão amamentando sem orientação médica.

Na gravidez, devem ser priorizados os suplementos específicos para os nove meses, que contribuam para o desenvolvimento saudável do bebê. A mesma regra vale para a amamentação, uma vez que boa parte das substâncias ingeridas pela mãe passam para o leite materno. Portanto, tenha bom senso e fale com um especialista antes de tomar qualquer suplemento!

Hipertensos podem consumir beta-alanina?

Todos os suplementos devem ser consumidos apenas com a recomendação de um médico ou nutricionista especializado no assunto, que vai avaliar se esse paciente realmente tem indicação para o uso da substância. Apesar de não existir nada que impeça o consumo da beta-alanina por pessoas com pressão alta, a regra é a mesma!

Fonte: Bruno Gualano, pesquisador e professor da Faculdade de Medicina e coordenador do laboratório de fisiologia do Grupo de Pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrição da da USP (Universidade de São Paulo); Guilherme Artioli, professor da Escola de Educação Física e Esporte e coordenador do Grupo de Pesquisa em Fisiologia Aplicada e Nutrição da USP