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"O que é imortal não morre no final?": como seria se fôssemos eternos?

Imagem: Estúdio Rebimboca/UOL

Rodrigo Lara

Colaboração para Tilt

15/06/2021 04h00

O que faria se soubesse que a morte nunca chegaria para você? Responder a essa pergunta pode ser difícil já que, como diz o ditado, a única certeza que temos na vida é a de que um dia nós vamos morrer. Por mais que a ideia de bater as botas não seja lá muito confortante, ela acaba sendo fundamental em vários aspectos e, grosso modo, permite que muitas coisas boas aconteçam.

Mas e se esse ciclo de vida e morte simplesmente acabasse? Como seria se nós, seres humanos, fôssemos imortais? Acredite: isso traria mais problemas do que benefícios.

A morte pode ser positiva

De todos os animais que vivem no nosso planeta, apenas os humanos têm a consciência de que, um dia, a sua passagem pela Terra chegará ao fim. A ideia da finitude da vida pode ser aterrorizante, mas faz com que a humanidade progrida.

Essa consciência, claro, surge aos poucos no decorrer da vida, mas é fundamental para que tenhamos um senso de urgência para realizações.

O tema é recorrente na filosofia e abordado por pensadores que vão de Sócrates aos alemães Friedrich Nietzsche e Martin Heidegger. Esse último, inclusive, define o homem como um "ser que caminha para a morte" e que, nessa marcha rumo ao fim, o melhor a se fazer é se esforçar para encontrar o seu "verdadeiro eu" antes do fim inevitável.

Parece algo um tanto trágico, mas faz sentido se encararmos a morte como algo necessário para nos provocar perante a vida, nos mobilizar a ir em busca ou identificar nossos desejos e encontrar sentido nas experiências, que teriam diferenças em termos de tom e de senso de urgência quando desassociadas da nossa consciência sobre a morte.

Uma nova relação com o tempo

A nossa relação com o tempo também seria diferente. Sabe aquela coisa de não deixar para amanhã o que você pode fazer hoje? Com "amanhãs" infinitos, não teríamos nenhum motivo para nos apressarmos em fazer algo ou resolver um problema.

Isso vale para coisas mais práticas, como consertar aquele defeito na sua casa ou começar uma faculdade, como também nas relações que temos com outras pessoas. Se apaixonar, por exemplo, seria possível, mas perderia aquela gostosa sensação de urgência de querer realizar o máximo de coisas com a pessoa amada. Certamente teria menos graça.

O mesmo vale na hora de encontrar os amigos, algo que sempre poderia "ficar para depois". A tendência é nos tornarmos pessoas mais fechadas e menos expostas a tudo de bom e de ruim que o convívio social causa.

Além da questão de desenvolvimento social, essa nova relação com o tempo também afetaria outro aspecto: a evolução científica e tecnológica. Afinal, por que avançar em ritmo acelerado e tentar tornar a nossa vida melhor hoje se teremos todo o tempo do mundo?

Religiões seriam diferentes

Religião anda de mãos dadas com a vida e a morte. Para muitas pessoas, acaba sendo um conforto acreditar que há seres superiores gerenciando tudo que acontece "aqui embaixo". Ou, ainda, que a morte não significa um simples fim, mas sim uma passagem, uma troca de ciclo, e que não há sentido em pensar nisso.

Trazendo essa relação terapêutica das religiões, fica o questionamento: fossem os humanos imortais, faria sentido cultuar deuses ou acreditar em seres superiores? Será que teríamos instituições que, mais do que dar esse tipo de conforto e orientação às pessoas, também acabam ditando costumes ao definirem o que é certo e errado — e, em alguns momentos, é capaz de provocar comportamentos extremos que desaguam em desentendimentos, conflitos e guerras?

Isso não quer dizer que um mundo com pessoas imortais e, por conta disso, sem religião seria melhor ou pior. Certamente, porém, seria diferente.

O planeta não é imortal

Fora essas questões psicológicas e filosóficas, a imortalidade dos humanos traria consequências, digamos, mais práticas. E quem mais sofreria com isso seriam nosso planeta e os outros seres que o habitam.

De acordo com o repositório de dados "The World Counts" — que, por sua vez, se baseia em dados da Organização das Nações Unidas —, cerca de 385 mil bebês nascem todos os dias, o que dá algo em torno de 140 milhões novos humanos chegando à Terra todo ano. Por sua vez, em situações normais, algo em torno de 150 mil pessoas morrem todos os dias.

Sem mortes para balancear essa conta, obviamente enfrentaríamos um crescimento populacional em grande escala.

Considerando que a maioria dos problemas ambientais que temos hoje em dia é provocado pela atividade humana, o que inclui de mudanças climáticas a extinção de espécies, aumentar de forma exponencial o número de pessoas que habitam o planeta certamente acabaria em uma catástrofe.

Recursos dos mais variados tipos são finitos e, uma vez esgotados, seria impossível garantir uma vida minimamente decente tanto para humanos quanto para outros seres vivos.

No fim, seríamos seres imortais, mas sem um lugar para viver.

Fontes:

Ana Luiza Bortolato, psicóloga especializada em Abordagem Junguiana pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP)

Wanderley Cintra Júnior, psicólogo graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e especialista em avaliação de desempenho

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