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Cat Power invoca Bob Dylan para show especial em SP: 'Ele é um professor'

Cat Power Imagem: Divulgação

Thales de Menezes

Colaboração para Splash

29/04/2024 04h00

Chan Marshall, 52, a norte-americana que usa na carreira o pseudônimo Cat Power, já fez sete turnês pelo Brasil, entre 2001 e 2022. Em todas as vindas, passou por São Paulo. Agora, no dia 19 de maio, o público que comparecer ao último dia do C6 Festival, no Parque Ibirapuera, verá um show muito diferente de tudo que a cantora já apresentou no país.

Cat Power já mostrou por aqui muito de seu repertório sofisticado de pop e rock, que imprimiu a ela um rótulo de musa na cena indie. Além de shows com seu material próprio, ela trouxe ao Brasil muitos hits alheios registrados em dois álbuns dedicados a regravações de outros artistas, "Jukebox" (2008) e "Covers" (2022). Mas seu trabalho mais recente é um passo ainda mais ousado nas regravações.

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"Cat Power Sings Dylan: The 1966 Royal Albert Hall Concert", lançado no passado, é o registro de um show que ela fez na tradicional casa londrina. A proposta foi reproduzir na íntegra um show de Bob Dylan em sua turnê britânica de 1966. A cantora apresentou as mesmas 15 músicas, mantendo a ordem das canções escolhida por Dylan naquela noite.

Quando a oportunidade de uma data no Royal Albert Hall veio a ser discutida na agenda de Cat Power, a ideia surgiu, como ela explica em entrevista por Zoom a Splash. "Esse projeto veio facilmente à minha mente. É uma maneira de oferecer algo a Dylan. É como oferecer flores. Há muitas gerações que se sentem gratas a ele. Dylan é quase como um professor, um cara que levou o pensamento crítico às pessoas com suas obras-primas."

A americana nunca havia feito show na lendária casa, inaugurada em 1871 pela rainha Vitória, que deu ao prédio o nome de seu marido, Albert, morto dez anos antes. "É um lugar especial, tem uma atmosfera única", diz. "Para mim, essa casa de shows está eternamente ligada à cena musical da Londres dos anos 1960. Um lugar que representa uma época, entende? Como o CBGB representa o rock de Nova York da década de 1970." Em seguida, ela ressaltou a curiosa e engraçada história do título equivocado do álbum de Dylan.

Lançado oficialmente em 1998, numa série de álbuns que "legalizaram" gravações de shows de Dylan que há tempos circulavam no mercado em versões piratas, "Live 1966: The 'Royal Albert Hall' Concert" traz na verdade o show que ele apresentou em Manchester, no Free Trade Hall, em 17 de maio de 1966. Em 1971, o disco pirata com esse registro foi lançado equivocadamente como sendo de um show em Londres, no Royal Albert Hall, e por mais de duas décadas foi comercializado em vários países com esse nome.

Mantida a brincadeira, Cat Power seguiu rigorosamente a maneira como Dylan dividiu o show, que tem uma primeira parte acústica e outra acompanhada de banda com instrumentos elétricos. Representa a tumultuada transição que o compositor fez em 1965, quando passou da canção folk, que apresentava com gaita e violão, às guitarras do rock. Fãs radicais do Dylan folk nunca o perdoaram. No show de Manchester, é possível ouvir alguém na plateia gritar "Judas" para Dylan. No disco de Cat Power, há a mesma intervenção da plateia, numa brincadeira espontânea.

Como Cat Power construiu uma ligação tão forte junto à Dylan? "Sempre gostei, claro, mas vivi um episódio muito forte aos 20 anos, quando assisti ao documentário de D.A. Pennebaker, 'Don't Look Back', que mostra a passagem de Dylan pelo Reino Unido em 1966. Eu me apaixonei pelo artista, pelo homem sexy", ela conta, para então recordar uma conversa com a cantora americana Patti Smith. "Ela me disse uma vez que sentia como se Dylan fosse seu namorado. É o mesmo comigo. Primeiro me apaixonei pelo artista, depois pelo homem. Mas, se eu o amei como uma mulher, é muito forte saber que ele foi aquele que, digamos, criou o meu trabalho. Ele escrevia canções e saía por aí cantando. É o que eu faço da minha vida."

Diante tanta admiração, surpreende saber que Cat Power não sabe o que Dylan pensa da gravação do novo disco. "Não tenho a menor ideia. Não conversei com ele sobre esse trabalho. Sendo sincera, não importa para mim o que ele possa pensar sobre isso. Sabe, é um presente para ele. Acredito que você pode entregar seu coração a alguém e sair andando, sem querer nada em troca."

O repertório do show oferece grandes sucessos dos primeiros cinco anos de carreira de Dylan. Exemplos: "It's All Over Now, Baby Blue", "Just Like a Woman", "Mr. Tambourine Man", estes na parte acústica, "Ballad of a Thin Man" e "Like a Rolling Stone", já com apoio da banda. Cat Power rebate quem aponta que Dylan compôs suas obras-primas nos anos 1960 e começo de 1970, para depois não exibir uma produção tão relevante. "Isso é dito por pessoas que vieram dos anos 1960. Eu compreendo. Como elas, Dylan é um sobrevivente. Ele sobreviveu ao mercado musical e a tudo o que aconteceu em sua vida. Eu assisti a quatro shows dele e o mais recente foi o melhor de todos. Ele mistura novas influências, sua sensibilidade na construção das canções segue a mesma. E o álbum recente que gravou recebeu resenhas entusiasmadas."

O último álbum que Cat Power gravou com músicas escritas por ela, "Wanderer", saiu em 2018. Mas não parou de compor. Antes do projeto Dylan aparecer, já tinha encaminhado um novo álbum. Ele tem nome, "Opus", e conta com oito canções escritas, cindo delas já gravadas. "É um ritmo mais lento de fazer as coisas. Eu tenho de cuidar do meu filho, tive problemas com a gravadora. Mas toco e componho sempre. Viajo com um ukulele, toco no ônibus, no hotel. Mantenho a mente sempre aberta para o que pode se transformar em música."

Ela revela ter uma vida mais concentrada nos shows durante as últimas turnês. "Quando eu era mais jovem e viajava sozinha, gostava de chegar a uma cidade, jogar as minhas coisas e sair andando pelas ruas. Pegava um ônibus, o metrô, procurava museus, exposições, cafés, clubes de jazz, livrarias... Hoje é algo mais família. Na verdade, meus músicos se tornam a minha família, então vamos jantar muitas vezes juntos. Gosto de experimentar comidas, conhecer restaurantes antigos. Mas falando assim parece só turismo. A vida na estrada tem muito trabalho e há uma beleza espiritual nesse trabalho duro."

CAT POWER NO C6 FESTIVAL

Quando: Domingo, 19 de maio, Auditório Ibirapuera
Onde: Av. Pedro Álvares Cabral, s/n - Portão 2
Ingressos: R$ 560 (inteira), R$ 280 (meia)

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