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Só mais uma saga? 'Mundo em Caos' incomoda com distopia que parece o agora

Renata Nogueira

Do UOL, em São Paulo

13/05/2021 04h00

Quer momento mais oportuno para se estrear um filme chamado "Mundo em Caos" do que a caótica realidade que estamos vivendo, especialmente aqui no Brasil? Coincidências a parte, o aguardado longa estrelado por Tom Holland e Daisy Ridley foi gravado antes da pandemia e teve sua estreia adiada no Brasil por causa das salas de cinema fechadas.

A história é uma adaptação da bem-sucedida trilogia de livros de Patrick Ness, que também assina o roteiro, e retrata um mundo pós-apocalíptico. O curioso é que o autor poderia ter subtraído pelo menos duas centenas de anos da ficção que se passa em 2257. Ele não teria errado.

Mundo em Caos

Lançamento: 2020 Duração: 108 minutos Pais: Estados Unidos Status: Em cartaz Direção: Doug Liman Roteiro: Patrick Ness, Christopher Ford
splash
4,8 /5
ENTENDA AS NOTAS DA REDAÇÃO

Pontos Positivos

  • "Ruído" bem adaptado para as telas
  • Elenco cheio de estrelas e afinado
  • Traz reflexões bastante atuais

Pontos Negativos

  • Filme fica dependente de uma continuação

Veredito

O filme gera reflexões necessárias e atuais e não se perde apenas no entretenimento raso de outras sagas destinadas a adolescentes e jovens adultos. Baseado em uma trilogia de sucesso, tem todos os elementos para ser o novo "Jogos Vorazes", resta saber se a situação também caótica do mundo real vai permitir isso.

Assisti ao filme duas vezes. Uma experiência interessante, já que a sensação inicial que se tem com "Mundo em Caos" é a mesma, de incômodo (por causa do tal "ruído", que explico logo mais), mas as reflexões embutidas nos personagens e detalhes traduzidos das páginas de papel para as telas só aumentam.

Esqueça as máscaras e o vírus. Não é disso que estamos falando. Mas sim do comportamento de uma sociedade completamente dividida e enganada por falsos líderes. Todd Hewitt (Tom Holland) é o integrante mais jovem de um povoado em que só existem homens e que um pode ler o pensamento do outro, já que eles emitem um ruído com tudo o que se passa na cabeça deles (um desafio bem resolvido pela equipe de efeitos especiais).

Os homens, e somente eles, foram acometidos por esse mal assim que chegaram ao Novo Mundo, um outro planeta muito distante da Terra. As mulheres se livraram do mal, mas em compensação podiam ouvir o ruído dos homens e acabaram todas mortas. Todd sofre com o tédio, já que em futuro próximo ele provavelmente será a última pessoa viva daquele lugar.

todd - Divulgação/Lionsgate - Divulgação/Lionsgate
Todd Hewitt (Tom Holland) sofre com seu ruído em 'Mundo em Caos'
Imagem: Divulgação/Lionsgate

Até que uma nave cai em sua propriedade e entre os destroços está Viola (Daisy Ridley), a primeira mulher que ele conhece, já que ele tem poucas lembranças de sua mãe. A garota passa a ser perseguida pelo prefeito (Mads Mikkelsen) e seu séquito, e é para protegê-la que Todd foge de seu povoado e descobre que há vida além de onde ele vivia.

A partir daí o filme poderia se perder na aventura de dois jovens em busca da independência, mas é quando ele ganha mais graça. O nosso Homem-Aranha e a nossa Rey de "Star Wars" mostram sintonia juntos e não se perdem nos clichês. A inevitável shippada para um possível casal vira piada e traz momentos de alívio cômico. Pelo menos nesse primeiro filme, a troca entre eles é bem mais interessante.

Enquanto Todd apresenta a Viola coisas mundanas, como a chuva que ela nunca viu, já que nasceu dentro da nave, a menina abre os olhos dele para a realidade. Por que ele foi treinado para matar? A cena em que ela lê para o rapaz é uma das mais tocantes, já que os livros foram todos queimados e Todd impedido de estudar. Segundo seu líder, o ruído seria inteligência suficiente.

todd e viola - Divulgação/Lionsgate - Divulgação/Lionsgate
Tom Holland e Daisy Ridley em cena de 'Mundo em Caos'
Imagem: Divulgação/Lionsgate

Desde o início até o final do filme a figura do pregador (David Oyelowo) também persegue Todd proclamando crenças limitantes e perdido em sua própria fé. O religioso é um importante aliado do prefeito para manter seu povo dominado e sedento por vingança e ódio contra quem é diferente deles, como os povos originários do Novo Mundo que são apresentados como o mal.

Também vale prestar atenção na figura do cachorrinho Manchee, fiel escudeiro de Todd e cheio de significados. Sem spoilers, o bichinho que é um dos mais queridos pelos fãs dos livros da saga cumpre bem o seu papel no filme. Do monstro no lago ao pai que defende o filho, cada personagem carrega uma mensagem atual que vale a reflexão do público.

Primeiro filme baseado na trilogia de livros, "Mundo em Caos" deve sair um pouco prejudicado nas bilheterias em razão da pandemia, mas tem força e elenco de peso para ser um novo fenômeno como foi "Jogos Vorazes", do mesmo estúdio. Uma saga que entretém adolescentes, mas que também traz mensagens de cunho social e político para formar novos adultos.

Resta saber quando (e se) veremos os próximos filmes diante da situação atípica do mundo real.