O Estádio Cícero Pompeu de Toledo, onde Peixinho fez história, já era um sonho antigo da diretoria tricolor. O gigante, projetado para acomodar 150 mil pessoas, começou a ser construído em 10 de março de 1953, quase sete meses depois da cerimônia de colocação da pedra fundamental. E somente sete anos depois, ainda inacabado, recebeu a primeira partida. A instalação, no entanto, só chegou a capacidade plena em 1970.

Antes de ter uma casa para chamar de sua, o São Paulo usava, na década de 1930, os campos da Chácara Floresta, na marginal do Tietê, e da cervejaria Antárctica, na Mooca. A partir de 1940, passou a mandar seus jogos no estádio do Pacaembu. Até que, em 1944, comprou o Canindé. O local, no entanto, era considerado pequeno para a construção do estádio pretendido pela diretoria e acabou vendido para a Portuguesa.

Em 1952, a Imobiliária e Construtora Aricanduva doou o terreno para a construção do novo estádio, na zona sul da cidade. Na época, o presidente do São Paulo era Cícero Pompeu de Toledo, que morreu em 1959 e não viu o sonho realizado. Coube a seu sucessor, Laudo Natel, homem do setor financeiro, o trabalho de erguer o Morumbi.

Peixinho conta que ele e os companheiros de time chegaram a desconfiar que o gigante pudesse ficar pronto. "Na época, o São Paulo não tinha um lugar certo para os treinamentos. Nem tinha campo. Quando começaram a construção do Morumbi, a gente treinava em um terrão no local em que hoje ficam as piscinas. Lembro que um menino olhava para o outro desconfiado e sempre a gente se perguntava: 'será que vão construir mesmo um estádio?' A gente via duas colunas e pensava: 'acho que não vai dar certo"'.

Não poderiam estar mais errados. O Morumbi, que, apesar de ter passado por adequações na estrutura ao longo dos anos e perdido capacidade (66.795 mil torcedores atualmente), ainda é o maior estádio privado do Brasil.

Na semana anterior à inauguração do Estádio Cícero Pompeo de Toledo, o São Paulo era uma festa só. A torcida se orgulhava do gigante recém-construído. E havia a promessa de um prêmio especial da diretoria ao são paulino que primeiro balançasse as redes da nova casa. "Era um Volkswagen 1959 modelo alemão", relembra, de boca cheia, Peixinho.

Todos os jogadores estavam de olho no prêmio. O mais cotado para balançar as redes era, sem dúvida, o centroavante Gino Orlando, originário do futebol do bairro da Lapa, assim como Peixinho.

Para enfrentar o Sporting Lisboa, o São Paulo entrou em campo com Poy, Ademar, Gildésio e Riberto; Fernando Sátiro e Vitor; Peixinho, Jonas, Gino, Gonçalo e Canhoteiro. O técnico era Flávio Costa.

"Choveu muito antes do jogo e eu pensei: muita água, então está para peixe!" E Peixinho foi logo mostrando para as 56.448 pessoas mil presentes que a tarde era dele.

"Com seis minutos de jogo, acertei um chute e a bola se chocou com o travessão. E eu pensei na hora: 'poxa, acho que não vou fazer esse primeiro gol'. Mas Deus me ajudou muito e eu agradeço ao São Paulo eternamente por estar naquela partida!"

Peixinho gosta de contar o que aconteceu depois daquela bola na trave ao estilo narrador de rádio.

O time do Sporting estava no ataque, mas o Fernando Sátiro entrou na jogada, desarmou o adversário e entregou a bola para o Gonçalo. Foi aí que eu me desloquei para o centro da área e o Jonas se movimentou para a direita, recebendo o passe do Gonçalo. Então o Jonas cruzou e eu entrei no meio da zaga, subi na frente do Gino, mergulhei e fiz o gol de peixinho. O primeiro gol do Morumbi, aos 12 minutos do primeiro tempo. E a partir daquele dia, todo gol de cabeça com mergulho foi batizado de peixinho".

Após o mergulho, Peixinho não caiu no chão. Ele se reequilibrou e saiu correndo, como mostram as raras imagens do momento histórico do futebol brasileiro.

Um gol desses e você queria que eu caísse no gramado? Eu me estiquei todo no ar, cabeceei e sai correndo... eu queria sair voando e sai mesmo. Correndo. Um gol histórico!"

Um gol que rendeu um desabafo do amigo Gino. "Ele sempre brincava que eu tirei dele o primeiro gol no estádio: 'eu é que ia fazer', brincava o Gino, que era um grande jogador e um grande amigo".

A vitória sobre o time português e a festa pela inauguração do estádio renderam muita comemoração em campo e no vestiário. No final da partida, Peixinho foi parabenizado por dois amigos importantes: Vicente Feola, que, além de técnico, quando era preciso fazia tudo no clube tricolor, e Caxambu, que era o treinador da base. "Eles choravam. Foi o seu Feola quem me lançou. E a turma toda me abraçava, afinal eu era um jogador formado no clube. Um prata da casa. Ganhei um relógio do doutor Paulo Machado de Carvalho. E foi só." Nada de carro.

Peixinho e o pai, Peixe, orgulhoso do filho, que, além de seguir a mesma profissão, era artilheiro, como ele, deixaram o estádio do Morumbi a pé. Caminharam em meio à torcida, que não reconheceu o artilheiro, até a avenida Francisco Morato. Andaram até o ponto de ônibus mais próximo, que ficava a alguns quilômetros. No coletivo, chegaram, sem serem incomodados, até o Largo da Batata, em Pinheiros, onde pegaram o bonde para a Lapa de Baixo, onde moravam na rua Tenente Landy.

Em casa, só trocaram a roupa, receberam os cumprimentos de alguns vizinhos e familiares e pegaram de novo o bonde. "Haveria um jantar de confraternização com os jogadores do Sporting e lá fomos nós até um restaurante na avenida Celso Garcia. Voltamos para casa de madrugada".