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Nei só precisou de um olho para ser jogador profissional de futsal

Felipe Pereira

Do UOL, em São Paulo

14/02/2015 06h00

Desde que se conhece por gente Sidnei Gomes só tem um olho. E ele não precisou de mais que isso para realizar o sonho de ser jogador profissional de futsal. Nei, como é chamado, perdeu a visão esquerda aos dois anos quando a irmã de sete anos furou seu olho com um uma faca. Muito novo na época, não lembra o que aconteceu e repete a história ouvida de outras pessoas.

Parentes contam que ele se jogou sobre os ombros da irmã que, assustada, levantou a mão. Hoje, aos 42 anos, o que Nei consegue lembrar são os feitos de uma carreira como jogador de futsal com atuação em equipes brasileiras e italianas. Ele enfrentou os maiores nomes de seu tempo como Manoel Tobias, Fininho, Ortiz, Schumacher, Morruga e outros atletas da seleção brasileira.

A carreira começou em 1989 e durou 23 anos. Neste período, conquistou alguns campeonatos paulistas e atuou pelo Banespa, Corinthians e GM. Também foi vítima de muitas torcidas pelos ginásios do país.”Se for falar de Bullying hoje eu tava rico”. Cego, caolho e pirata eram os adjetivos mais amenos que escutava. O ex-jogador afirma que nunca ficou incomodado até porque falavam uma verdade. Também considera comum as pessoas tentarem tirar um atleta do time adversário do sério para que jogue mal.

Houve desconfiança até de uma comissão técnica com quem trabalhou no Banespa. Nei recorda que foi questionado para saber se conseguia ver toda a quadra e de forma científica ouviu uma explicação de que pessoas com um só olho têm menos profundidade na visão. Tudo de maneira respeitosa e profissional faz questão de ressaltar. Ele diz que nem quis saber de teste e respondeu que sentia-se capaz de jogar em alto nível. A duração da carreira mostra que estava certo.

E os comentários não eram apenas negativos. Muitas pessoas garantiam que o ex-jogador era tão bom que se tivesse uma visão normal seria seleção brasileira com facilidade. Nei não tem a resposta. Explica que nunca soube o que é enxergar com dois olhos para saber se faria alguma diferença.

O que ele sabe, e bem, é que a carreira foi consequência de uma aposta que tinha tudo para dar em nada. Sidnei nasceu em São Simão (SP) e mudou para capital do estado com 12 anos. Aproveitou que o primo treinava no Corinthians para conseguir uma vaga. Sem constrangimento nenhum, Nei declara que nos primeiros anos ia na aba dele porque o desempenho em campo deixava a desejar.

Nada que surpreendesse porque nem nos campinhos de São Simão se destacava. O resultado era nem ser inscrito nos campeonatos que os times de base do Corinthians disputavam. A coisa começou a dar certo aos 15 anos, quando foi para equipe de futsal do Água Branca. Diferente do campo, o futebol de quadra obriga o jogador a atacar e defender e, mesmo precisando ser mais completo, se adaptou.

Foi parar no Banespa e fez sua estreia como profissional em 1989. Ao todo, foram cinco passagens pela equipe, a mais marcante foi em 2001. Naquela temporada, terminou com 22 gols e foi vice-artilheiro da Liga Futsal atrás apenas de Manoel Tobias. Nei também defendeu o Corinthias e a GM antes de ir para a Itália em 2004.
Sempre atuando de ala ou pivô, foi contratado pela Lazio, equipe da primeira divisão e depois de um período de adaptação conseguiu engrenar. Com o passar do tempo se transferiu para times da segunda e terceira divisão. O fato em si não incomodou. O que não conseguiu digerir foram os calotes recebidos mais de uma vez. Por causa deles, não conseguiu fazer o pé de meia que planejava.

O dinheiro deu para comprar uma casa em São Simão e criar as duas filhas, mas não sobrou para aposentadoria. Nei trabalha numa loja de móveis para escritório e conta que se cruzar os braços não tem como por comida na mesa. Nada que assuste um homem que fez o que mais sonhava com apenas um olho.

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