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"Não estaria no Barça sem o Felipão. Gratidão eterna por ele", diz Paulinho

Imagem: AFP PHOTO / VANDERLEI ALMEIDA

Caio Carrieri

Colaboração para o UOL, em Barcelona (ESP)

24/01/2018 04h00

“Paulinho, podemos tirar uma foto?”, pergunta um funcionário enquanto trabalha na reparação na casa do jogador do Barcelona.

“Pode ser mais tarde, sim, mas agora estou ocupado”, responde o anfitrião, com simpatia, enquanto recebe a reportagem do UOL Esporte na sua residência, em um bairro nobre da cidade-símbolo da Catalunha.

Em pouco mais de metade da primeira temporada no Barça, o meio-campista de 29 anos conquistou a titularidade ao lado de Lionel Messi, Luis Suárez e cia. e silenciou a gritaria pelo Barça desembolsar 40 milhões de euros por um atleta até então no futebol chinês, no Guanghzou Evergrande, e cuja primeira experiência em uma liga relevante na Europa, no Tottenham, entre 2013 e 2015, foi bem abaixo da expectativa.

Jogador já fundamental na formação da equipe de Ernesto Valverde, Paulinho dá de ombros quando perguntado sobre o fato de ter mais gols do que Cristiano Ronaldo no Campeonato Espanhol, no qual marcou oito vezes contra seis do português eleito melhor do mundo em cinco oportunidades. Além disso, os culés lideram a competição com 19 pontos de vantagem para o arquirrival, apenas na quarta posição.

Contudo, o coração abre e se derrete quando o assunto é Luiz Felipe Scolari, técnico que, então no comando do Guanghzou, apostou no ressurgimento do meia consagrado no Corinthians, mas que estava encostado na Premier League até aceitar o convite de Felipão. Confira abaixo a entrevista exclusiva.

Aprendizado no Barça
Nesses primeiros seis meses de Barcelona, estou sendo um cara muito mais observador do que qualquer outra coisa. Observo jogadores, a forma como eles se comportam dentro de campo, nos treinamentos, nos jogos. A minha experiência até agora é muito positiva. Aprendi de tudo um pouco, na parte técnica, tática, no comportamento profissional. Fazer o seu trabalho é a sua obrigação, mas ter o comportamento correto te leva a coisas boas. Observo a qualidade de treinamento, com nível muito alto e forte intensidade. Isso me faz crescer não só como jogador, mas como ser humano. O Barcelona é muito mais do que eu imaginava, uma grandeza que não tem nem como descrever. Comento com a minha esposa e amigos que no Barcelona todo dia eu aprendo algo.

Impacto imediato no Barcelona x insucesso no Tottenham
No Tottenham tive uma primeira temporada boa, mas na segunda não aconteceu a sequência de jogos, pelo treinador ter outras escolhas. Então, nos últimos seis meses de contrato, quando eu não me sentia feliz, esperei acabar a temporada para, aí sim, pedir ao presidente que pudesse me liberar para tentar outro desafio. Tiro lição de tudo o que passei na vida, seja algo positivo ou negativo. Quando cheguei no Barcelona, as coisas aconteceram de uma outra forma. Não posso dizer que o Tottenham foi uma escolha ruim. Na época e naquele momento foi uma ótima opção. Também agradeço porque foi um aprendizado. Tem muitas pessoas lá dentro que gostam de mim, incluindo o presidente, alguns jogadores e as pessoas que trabalham no clube. Só que hoje estou no Barcelona, e as coisas estão acontecendo de uma forma maravilhosa na minha vida.

Imagem: ANDER GILLENEA / AFP
Mais gols do que CR7 no Campeonato Espanhol
Isso é uma coisa que, sinceramente, não faz diferença para mim, porque estamos falando de um cara que foi eleito várias vezes o melhor do mundo. São comparações que não têm nada a ver, jogadores completamente diferentes. Claro que fico muito feliz pelos gols que venho fazendo para ajudar a equipe, mas meu primeiro objetivo dentro do Barcelona é ajudar o clube a conquistar títulos. Evidentemente que a minha felicidade é enorme de poder contribuir com gols. O mais importante é poder ajudar de alguma forma. Vejo as brincadeiras na internet, os amigos falam, mas é uma coisa que não dou muita bola. Se eu responder de uma forma diferente, isso pode cair na mão de outras pessoas, por mais que o tom seja sempre de brincadeira.

Críticas por custar 40 milhões de euros
Quando vim para o Barcelona, eu sabia de tudo isso, só que existia uma cláusula no meu contrato para eu sair do futebol chinês. Esse é o valor que o presidente do Guangzhou estipulou. Do mesmo jeito podem chegar no presidente agora e dizer “Pô, 40 milhões de euros, você vendeu ele barato!”. Podem culpá-lo por isso, mas essa era a cláusula se algum clube me quisesse. Cheguei com desconfiança pelo valor, por estar no futebol chinês. Em nenhum momento me abati por isso, até porque não tenho o perfil de ver as notícias e ficar para baixo. Já faz uns quatro anos que não acompanho isso ou aquilo na imprensa. Não culpo os torcedores, porque eu estava na seleção brasileira, mas não viam como eu estava jogando no futebol chinês. Não digo que estão certos ou errados, eles só poderiam me ver quando eu chegasse ao Barcelona. Depois da minha estreia e outros dois jogos seguintes, não existia mais tanto questionamento, foi passando. Hoje pode haver algum questionamento, mas é muito mais difícil. Não existe palavra melhor para a minha carreira do que superação.

Imagem: Lluis Gene/AFP
Piadas com embaixadinhas na apresentação ao Barça
Levei em tom de brincadeira. Eu já tinha feito 300 embaixadinhas, mas pegaram as imagens só de quando a bola caiu. Isso não tem nada a ver como o jogador joga. Até mesmo por ser uma apresentação, fiz de tudo. Tem alguns que são ignorantes.

Os mais próximos no novo clube
Messi e Suárez foram jogadores que me ajudaram bastante na minha adaptação, na minha forma de jogar. Sempre quando tinha dúvida falava com eles, que também me orientaram a falar com o treinador, sempre aberto para conversar e passar os detalhes. Escuto e observo muito Iniesta e Busquets. É normal você ter mais afinidade com um ou outro. Converso bastante com André Gomes e o Semedo também, já que são portugueses. O André está há mais tempo no clube, mas, como o Semedo também chegou há pouco, compartilhamos essas novas descobertas.

Integração fora do ambiente do clube
Ainda não teve oportunidade. Cada um tem um estilo de vida diferente. Messi e Suárez moram um pouco mais longe da cidade, cada um tem um estilo de vida, as famílias. Serão muitos jogos de janeiro até o fim da temporada. Mas só de estar convivendo com eles em treinamentos e jogos já é o suficiente.

No auge?
Muita gente me perguntou antes de eu chegar aqui. “Depois do Barcelona, tem para onde ir?”. De verdade, se tem eu não sei. Tenho quatro anos de contrato no Barcelona, quando vou estar com 32 para 33 anos. Quero aproveitar os anos que tenho no Barcelona e não vejo outro lugar onde possa estar melhor.

Messi x Neymar
Os dois têm qualidades fantásticas. Ao mesmo tempo que o Neymar tem dribles curtos, o Messi também tem. Os dois têm velocidade, finalizam muito bem, buscam o gol sempre. Torço para que o Neymar chegue ao posto de melhor do mundo, porque é um jogador diferente, uma estrela, um craque, e tem tudo para conseguir esse prêmio.

A chegada de Philippe Coutinho
Ele está muito feliz. Muita gente me perguntou se eu tinha conversado com ele. Falamos algumas vezes na seleção, depois conversamos pouquíssimas vezes por mensagem, porque é um momento muito pessoal. Imagine quantas pessoas estavam falando com ele, perguntando se ele ficaria no Liverpool ou se sairia. Sou um cara que não gosto de perturbar. O que digo para ele, depois de tudo, é que foi uma ótima decisão e que ele vai ser muito feliz. Primeiro pelo potencial que tem, e segundo pela grande pessoa que é.

Campeão da Libertadores x Estreante na Liga dos Campeões
São torneios totalmente diferentes. Às vezes na Libertadores o jogo não é muito bonito, com muito contato, daquele jeito sul-americano. Claro que a técnica faz diferença, mas temos de saber que o contato físico faz muita diferença numa competição como essa. E estou muito feliz por disputar a minha primeira Champions, pelo que representa, com grandíssimos jogadores, alto nível técnico.

“Rivalidade” Paulinho (Corinthians) x Mina (Palmeiras)
Não o conhecia, mas pelos poucos dias que está no clube parece ser um cara muito humilde. Teve um grande sucesso no Palmeiras, é um ótimo zagueiro. Se chegou no Barcelona, algo de diferente tem. Desejo muito boa sorte. Que ele consiga o que ele fez no Palmeiras ou até mais. Tem tudo para ter sucesso no Barcelona. O que o clube oferece é o suficiente para o jogador fazer sempre o melhor. Vi que ele gosta da dancinha quando faz gol. Não sei se vou acompanhar, mas vou dar risada (risos).

Às vésperas da sua segunda Copa do Mundo
Vivo momentos diferentes e agradeço ao Felipão por ter me levado para a minha primeira Copa do Mundo, mesmo numa situação sem jogar muito no Tottenham. Esse ano é especial para mim, por tudo o que passei nas últimas temporadas, na China. Temos de aproveitar a confiança com que a seleção brasileira chega para o Mundial da Rússia. Tem tudo para fazer uma ótima Copa do Mundo. A seleção está preparada e com confiança para ser, com certeza, uma das favoritas.

Imagem: Reprodução
Felipão e o ressurgimento na carreira
Além de ter me dado a oportunidade de disputar uma Copa do Mundo no nosso país, foi um cara que confiou muito em mim. Ele sabia da minha situação no Tottenham, sem atuar com muita frequência nos últimos seis meses da segunda temporada. Mesmo assim, falou com a diretoria e o presidente do Guangzhou que poderia me contratar porque seria um ótimo investimento. Cheguei na China e, querendo ou não, você estranha muito a cultura, os jogadores, a liga. Mesmo assim, no primeiro dia em que eu pisei no Guangzhou, coloquei na minha cabeça que eu tinha de jogar. Fui para China primeiro pela confiança do Felipão e toda a comissão técnica dele e segundo porque eu tinha de jogar. Desde o primeiro jogo eu vi que eu me sairia muito bem. Resgataram a minha confiança. O Felipão me resgatou e eu reconquistei a confiança que eu tinha perdido nos últimos meses no Tottenham.

O apreço pelos chineses
Hoje o torcedor chinês, principalmente do Guanghzou, tem um carinho enorme por mim. Foi difícil sair de lá tanto pelas pessoas que me ajudaram, mas também por aqueles que eu ajudava. Não gosto de falar sobre quem eu ajudo, mas ao sair da China fiquei pensativo porque eu ajudava muitas pessoas. Às vezes eu ajudava os funcionários com alguma premiação que o time ganhava. Pessoas do bem que ganham o suficiente, sim, mas eu enxergava que se eu fizesse isso seria uma forma de gratidão. Sempre tentavam nos deixar nas melhores condições possíveis, com tudo pronto. Roupeiros, a tiazinha que sempre fazia o meu café e deixava pronto para assim que eu chegasse. Deixei muitas pessoas que tinha o prazer de ajuda, e quando eu saí vi uma tristeza por parte deles não pelo apoio financeiro, mas pelo carinho dessa relação. Levava para almoçar, chamava para os churrascos em casa. Me sinto um cara vencedor, mas gosto muito de ajudar. Falo para a minha esposa: se eu acabar a minha carreira com a minha casa, meu carro, meus filhos e você bem, já basta. Tive a oportunidade de conhecer essas pessoas pela oportunidade que o Felipão me deu. Muitos o veem como um cara mais rigoroso, mas a minha gratidão por ele vai ser eterna.

Haveria Paulinho no Barcelona sem o Felipão?
Acho difícil. Felipão estava na China e eu na Inglaterra. Se eu tivesse saído do Tottenham para outro clube europeu que não fosse o do Felipão eu poderia não estar no Barcelona. Fui para o Guangzhou, onde ele pediu a minha contratação. Por isso que também coloquei na minha cabeça que tinha de fazer pelo Felipão, que confiou em mim quando eu estava seis meses sem jogar no Tottenham. Ele deu a cara dele para o presidente do clube com a certeza de que eu ajudaria o clube. Não fosse ele, não sei se eu poderia estar no Barcelona. Talvez poderia estar em outro clube europeu, jogando os dois anos, mas sem estar no Barcelona. Se não fosse ele, não sei se estaria aqui.

Peso do 7 a 1 para o Felipão
Não concordo, mas tenho de ver e me calar que é melhor, ainda mais eu que nunca fui pessoa de entrar em polêmica ou qualquer coisa do tipo. Todo mundo culpou o Felipão, que bateu no peito e assumiu a responsabilidade, mas nós jogadores também somos culpados. Também vamos ouvir 7 a 1 até o fim da nossa carreira, apesar de sabermos que o peso vai cair muito mais nas costas do Felipão por ter sido o treinador. Então tudo o que ele fez e conquistou se apagou? Tudo bem, não temos explicação para o 7 a 1. Se você perde de 2, 3, podemos falar que teve vacilo aqui ou ali, mas para o 7 a 1, não. Aconteceu. Temos de viver a realidade, mas somos maduros e homens suficientes para lidar com isso. Jamais vou esquecer tudo o que ele fez na carreira dele por causa de uma derrota como essa. Ele foi campeão do mundo, viveu anos maravilhosos com a seleção de Portugal, ganhou títulos no Palmeiras, no Grêmio. Além de ser um treinador muito bom, é um ótimo ser humano. Na China eu tratava ele como meu pai, porque me dava bronca. Falei com ele uma vez na China. “Olha a vida que o senhor tem e as suas conquistas, mas (as críticas pelo 7 a 1) são coisas que o senhor vai ter de lidar pelo resto da vida, o senhor não pode deixar que isso entre na sua vida e na sua carreira, porque o senhor tem conquistas maravilhosas que nenhum outro tem”.
 

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