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Retrô 2019: como foi a luta contra a desigualdade social pelo mundo

Manifestação contra a desigualdade social no Chile reuniu milhares de pessoas em Santiago, em outubro deste ano. Imagem: Rodrigo Gutierrez/Zimel Press

Fred Di Giacomo

Colaboração para Ecoa

28/12/2019 04h00

Se você fosse cantar 2019 num refrão popular poderia se lembrar de Chico Science (ou do grupo de axé music As Meninas) e gritar "o de cima sobe e o debaixo desce". Segundo o estudo "Escalada da Desigualdade", do economista da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Marcelo Neri, a desigualdade de renda no Brasil completou, no segundo trimestre de 2019, um ciclo de quatro anos e três meses crescendo.

A pesquisa, baseada em dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ressalta que foi o mais longo período de concentração de renda da história do país. Também segundo a mesma instituição, a extrema pobreza cresceu este ano e o número de miseráveis no Brasil chegou a 13,5 milhões - mais gente do que a população da Bolívia e quase quatro vezes a do Uruguai.

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Mas não foi só o Brasil. O mundo começou 2019 mais desigual. Segundo relatório da Oxfam, divulgado em janeiro, as 26 pessoas mais ricas do mundo têm mais dinheiro do que os 3,8 bilhões mais pobres. Sim, menos de 30 pessoas possuem mais dinheiro do que 50% da população mundial. E em janeiro deste ano, suas fortunas tinham crescido 12% em comparação ao ano anterior, enquanto os 50% mais pobres tinham ficado 11% mais miseráveis. Esses números ficam mais críticos ao analisar o relatório da ONU, que mostra a fome voltando a crescer no mundo no final da década — cerca de 2 bilhões de pessoas vivem sob o fantasma de não saberem se terão o que comer.

Se a desigualdade cresce, a luta contra ela também. Pelo menos é o que prega a Fight Inequality Alliance, a aliança global contra desigualdade, que lançou este ano seu primeiro relatório com insights de 170 ativistas de 23 países e que planeja, para a semana de 18 a 25 de janeiro de 2020, quando ocorre o Fórum Econômico Mundial, em Davos, protestos contra a desigualdade em países como África do Sul, Índia, Quênia, Reino Unido, Zâmbia, Filipinas, México e Holanda. A Fight Inequality Alliance é uma iniciativa surgida no Reino Unido e que reúne ONGs, sindicatos, feministas, ativistas dos direitos humanos, ambientalistas e outros grupos da sociedade civil para combater a desigualdade social.

Populismo, protestos e pobreza

Diversas análises, como as do economista Branko Milanovic, autor do livro "Global Inequality", têm atribuído a onda de extrema-direita que se espalha pelo globo à crescente desigualdade social e ao empobrecimento da classe-média (especialmente em países desenvolvidos). O medo de cair na miséria teria impulsionado os trabalhadores a elegeram

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, em conversa com o presidente dos EUA, Donald Trump Imagem: Erin Schaff/Reuters
Trump, Boris Johnson e a votarem no Brexit. O economista francês Thomas Piketty, autor do best-seller "O Capital do Século XXI" (Intrínseca), lançou um novo livro este ano ("Capital e Ideologia") em que propõe que o mundo supere o hipercapitalismo para reduzir desigualdades e impedir "as narrativas do avanço identitário, do avanço xenófobo", como declarou em uma entrevista à agência AFP.

Enquanto o descontentamento com a desigualdade tem empurrado muitos europeus e americanos (e brasileiros) a apostarem no populismo de direita, a insatisfação com a desigualdade social levou milhares de jovens chilenos às ruas a partir de outubro. O que começou como um protesto contra um aumento de 30 pesos nas passagens de Metrô, acabou se tornando uma revolta popular no país sul-americano, que tem uma economia rica, mas muito desigual e onde a maior parte dos serviços (como as universidades e aposentadorias) foram privatizados. Os protestos chegaram a levar 15% da população de Santiago, capital do Chile, às ruas, e fizeram o presidente Sebastian Piñera anunciar um pacote social para tentar aplacar a fúria popular.

Se você esteve vivo e online em 2019, é difícil que não tenha assistido ao flashmob criado pelas feministas chilenas do coletivo La Tesis protestando contra o machismo, a cultura de estupro e a repressão violenta aos manifestantes chilenos exercida pelo governo do nosso vizinho. O viral "Un violador en tu camino" (Um estuprador em seu caminho) se espalhou pelo mundo e foi inspirado nas palavras da antropóloga feminista Rita Segado.

Feministas chilenas protestando contra o machismo, a cultura de estupro e a repressão Imagem: Reprodução/Twitter

Quando a meta da startup é reduzir a desigualdade

Voltando à clássica canção do grupo As meninas que citamos no começo deste texto, lembramos do pré-refrão que diz: "Quero me livrar dessa situação precária onde o rico fica cada vez mais rico e o pobre cada vez mais pobre." Parece clichê em forma de axé, mas não podemos esquecer que todo clichê surge de uma verdade universal. Se o Brasil viu a desigualdade e a miséria voltarem a crescer em 2019, o número de milionários no país também cresceu quase 20%, segundo o Global Wealth Report, divulgado pelo Credit Suisse em outubro deste ano. A concentração de dinheiro na mão de poucos fica mais chocante quando descobrimos, por meio do mesmo relatório, que neste ano o Brasil teve o segundo maior crescimento de ultra-ricos do mundo (atrás apenas dos EUA). Ultra-ricos são pessoas com patrimônios acima de US$ 50 milhões.

Com objetivo de combater essa concentração de muito dinheiro na mão de poucos e de distribuir melhor as riquezas no país, um grupo de sete empreendedores, com idades entre 24 e 27 anos, criou no Recife a Vendaval Catalisadora de Impacto Social. "A Vendaval atua nos processos de captação de recursos financeiros e humanos, no fortalecimento organizacional e em serviços de comunicação", afirmou Flavius Falcão, sócio-fundador da Vendaval, a Ecoa. 20 projetos já foram catalisados pela startup, que opera no azul e usa toda sua receita para remunerar os colaboradores e manter o projeto.

"Os recursos ainda ficam mais no Sul e Sudeste. As pessoas, quando chegam aqui na região, ficam impressionadas com a quantidade de iniciativas de combate à desigualdade, mas a realidade é que precisam de mais suporte financeiro, e é nisso que queremos ajudar", conta Tereza Vasconcelos, que também é sócia-fundadora da Vendaval.

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