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Fim do carro popular: por que montadoras estão matando opções mais baratas

Chevrolet Joy se despediu em 2022; custo para adaptar Onix 'antigo' às regras do Proconve L7 tornou compacto inviável no País Imagem: Marcos Camargo/UOL

Alessandro Reis

Do UOL, em São Paulo (SP)

05/01/2022 17h52Atualizada em 07/01/2022 08h40

Devido a fatores como alta no dólar e no custo de matérias-primas, associados à escassez de componentes que tem paralisado fábricas ao redor do mundo, 2021 registrou uma disparada nunca vista nos preços de veículos novos e usados. Especificamente no Brasil, opções zero-quilômetro mais em conta facilmente superam a faixa de R$ 70 mil, dependendo do modelo pretendido.

O aumento expressivo no custo para aquisição de automóveis, especialmente aqueles recém saídos da linha de produção, faz a expressão carro popular perder todo o sentido - uma vez que os valores cobrados estão muito longe das condições financeiras da maioria dos brasileiros. Ao mesmo tempo, nos últimos meses, versões de entrada, em tese mais acessíveis ao consumidor, deixaram de ser oferecidas em nosso País.

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Neste início de 2022, a Fiat tirou de linha a configuração Easy do Mobi, a mais simples do subcompacto e um dos veículos mais em conta do mercado. Com preço sugerido de R$ 57.890, ela já não era barata e seu adeus fez com que o hatch parta agora de R$ 59.190. Além disso, a Chevrolet acaba de descontinuar os modelos Joy e Joy Plus, que seguiam à venda como alternativas mais baratas e menos modernas à nova geração do campeão de vendas Onix.

A dupla seguirá em produção na unidade de São Caetano do Sul (SP), contudo somente para abastecer outros mercados.

É verdade que os exemplos citados não se enquadram nos novos limites de emissões estabelecidos pelo Proconve L7, que passou a vigorar em janeiro no Brasil e também aposentou outros veículos. Especialistas consultados por UOL Carros ponderam que esses e outros carros poderiam ter sido adaptados para sobreviver. Contudo, o investimento para tal seria inviável do ponto de vista mercadológico, já que os populares citados há muito tempo já não eram rentáveis para as respectivas montadoras.

'Carro popular dá prejuízo'

Mobi Easy, versão mais simples do subcompacto da Fiat, foi descontinuada pela montadora no início de 2022 Imagem: Divulgação

Segundo consultores do setor automotivo, a nova regulamentação apenas antecipou mortes que já eram inevitáveis e confirma a tendência de oferta de veículos cada vez mais tecnológicos, equipados e caros no mercado brasileiro - acentuada durante a pandemia, na qual a aquecida demanda por carros novos tem sido muito superior à sua disponibilidade nas concessionárias, - consequência dos problemas na produção.

"Não tem jeito. A combinação de alta demanda com pouca oferta tradicionalmente faz com que a indústria elimine os veículos que proporcionam margem baixa e foque automóveis com maior valor agregado, muito mais rentáveis", pondera Flavio Padovan, sócio da consultoria MRD Consulting.

Ex-executivo de montadoras como Ford, Volkswagen e Jaguar Land Rover, Padovan destaca que os compactos básicos "geralmente" dão prejuízo às montadoras e sua função principal é manter as fábricas operando, de forma a não agravar o rombo nas contas - linhas de montagem ociosas, explica, são outra fonte de prejuízos.

Por conta da falta de componentes, especialmente os semicondutores fundamentais para o funcionamento da parte eletrônica dos carros, as marcas têm priorizado a fabricação de automóveis mais caros quando há disponibilidade de peças.

Carros melhores, preços mais altos

Ricardo Bacellar, sócio fundador da Bacellar Advisory Boards e conselheiro da SAE Brasil, pontua que chamar um carro de popular no Brasil é quase "ofensivo" atualmente, já que a renda média não tem acompanhado a escalada nos preços. O ex-executivo da KPMG Brasil acrescenta que, mesmo após o término dos efeitos da pandemia no mercado, o custo da produção de veículos continuará subindo.

"Os carros têm incorporado um volume cada vez maior de exigências regulatórias relacionadas a emissões, eficiência energética e itens de segurança. Isso requer investimentos crescentes em tecnologia e significa que o tempo do automóvel 'pelado', 'pé de boi', ficou no passado", pondera o consultor.

Para Bacellar, os compactos de entrada ainda dominam a lista dos mais vendidos no País, comprovando sua relevância no mercado e respectiva sobrevida por muito mais anos. Ao mesmo tempo, esses modelos já estão e ficarão ainda mais caros e equipados.

"O Chevrolet Onix é a prova disso. Após ficar cinco meses sem ser produzido no ano passado, apresentou recuperação espetacular no segundo semestre, ao passo que a versão Joy, mais simples e baseada na geração antiga, foi descontinuada por conta das baixas vendas, associadas aos elevados investimentos necessários para enquadrá-los na nova legislação".

'Veículo pelado não faz mais sentido'

Sandero (foto) e Logan não deverão ganhar nova geração no Brasil; Renault prefere focar SUVs, mais rentáveis Imagem: Divulgação

Cassio Pagliarini, da Bright Consulting, concorda com o colega ao dizer que já não faz mais sentido oferecer um veículo sem itens básicos de conforto e tecnologia, justamente devido ao custo maior para fabricá-lo.

"Para vender carro básico, este teria de ser muito mais barato do que é atualmente. Com a alta nos preços, os clientes também ficaram mais exigentes. Hoje, não abrem mão de equipamentos como direção assistida, ar-condicionado, travas e vidros elétricos e algum nível de conectividade. Como a qualidade dos automóveis subiu bastante, devido ao acréscimo de itens tecnológicos obrigatórios, a diferença no custo entre um exemplar 'pelado' e outro um pouco mais equipado ficou pequena".

Com passagens por empresas como Hyundai e Ford, o consultor salienta que essa é a principal razão para o atual sucesso dos SUVs.

"Já que a pessoa vai gastar uma soma considerável, ela dá preferência a veículos que trazem uma percepção de maior valor agregado. Os SUVs oferecem posição de dirigir elevada, maior vão livre do solo e outras qualidades que fazem o consumidor se dispor a pagar mais por esse tipo de automóvel".

Não por acaso, no fim de 2021 a Renault anunciou que vai focar seus investimentos no Brasil para desenvolver e lançar utilitários esportivos, sinalizando que Sandero e Logan não deverão ganhar nova geração no País - os compactos foram renovados recentemente na Europa, onde são vendidos pela subsidiária romena Dacia.

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