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Rifa de carros: influencers usam redes para lucrar com sorteios ilegais

Youtuber Luan, do canal PetrolHead, anunciou que vai sortear seu VW Up TSI preparado entre os inscritos; prática é clandestina, segundo Ministério da Economia Imagem: Reprodução

Alessandro Reis

Do UOL, em São Paulo (SP)

17/04/2020 04h00

Eduardo Razuk, do canal Backstage, não é o único a lucrar e ganhar audiência com sorteios de carros - a prática é ilegal, de acordo com o Ministério da Economia, responsável por regrar e fiscalizar loterias e jogos de azar no País.

Basta uma rápida pesquisa no Youtube, no Instagram e no Facebook para constatar que outros influenciadores digitais têm lançado mão desse expediente.

Além deles, colecionadores de carros antigos e vendedores profissionais de veículos têm recorrido à prática, utilizando as redes sociais como ferramenta para viabilizar as rifas - efetuadas mediante a venda de cotas com preço fixo.

Alguns desses "influencers", com milhares de seguidores, anunciam os sorteios nas redes e direcionam o anúncio a sites especializados nos sorteios - nos quais, em geral, o pagamento dos números a serem sorteados é feito mediante transferência bancária, diretamente para a conta pessoa física dos vendedores.

Outros realizam o sorteio nas próprias plataformas sociais onde postam seus vídeos.

O canal do Youtube "PetrolHead" é um exemplo semelhante ao de Razuk: Luan, o dono da publicação, faz preparação de veículos, dentre eles um VW Up TSI que pretende rifar para, segundo ele, custear outros projetos que gerem conteúdo e atraiam mais seguidores.

De acordo com Luan, o sorteio, que ainda não foi realizado, vai contemplar o ganhador com o carro, enquanto o segundo colocado levará R$ 30 mil e o terceiro, um iPhone.

Procurado pela reportagem por e-mail, Luan ainda não respondeu. Seu canal tem cerca de 140 mil inscritos.

Alto faturamento

"Vendedor Sincero" anuncia rifa de BMW e moto aquática; cotas superam em quase R$ 40 mil valor de mercado Imagem: Reprodução

A prática de rifas também é adotada pelo canal "Vendedor Sincero", cuja conta no Facebook somava ontem mais de 480 mil "curtidas".

Em postagem realizada no último dia 11, com mais de 1,5 mil interações, o vendedor de carros Alessandro Moura anuncia o sorteio de um "kit completo de ostentação", composto por um BMW 316i 2014 e uma moto aquática Yamaha FZS do mesmo ano.

O carro custa cerca de R$ 69 mil na Tabela Fipe, enquanto um exemplar da moto aquática de mesmo ano e modelo tem anúncios por aproximadamente R$ 50 mil em sites de classificados. Somados, os preços chegam a R$ 119 mil.

A rifa do referido "kit" está disponível no site "Rifandos", onde são oferecidas mil cotas de R$ 150 cada. Quando todos os números forem comercializados, o sorteio terá arrecadado R$ 150 mil. Ou seja, pouco mais de R$ 30 mil acima do valor de mercado dos veículos.

Procurado pela reportagem, Moura diz que as rifas que promove "não têm nada a ver com superfaturamento" e que o lucro é direcionado para custear despesas e também para doações. Também conhecido como Alle Moura, ele trabalha em uma loja de automóveis de Araranguá (SC).

"Meu forte é venda de veículos, essa 'ação entre amigos' foi a pedido dos meus clientes. Surgiu com o intuito de poder vender algumas mercadorias que não estavam vendendo na loja", afirma.

Moura, no entanto, diz ter lido a reportagem sobre as rifas ilegais de Razuk publicada por UOL Carros e relatou que não irá mais realizar nem divulgá-las.

"Até então, não sabia que não era permitido esse tipo de ação. Certamente não iremos mais promover". Ontem à noite, o vídeo anunciando o sorteio do sedã e da moto aquática continuava no ar em sua página no Facebook.

Já o Youtuber Rodrigo Platinum, do Espírito Santo, também é vendedor profissional.

Aproximadamente a cada mês, sorteia um carro no seu canal, que tem mais de 440 mil inscritos. A mais recente rifa foi de um Nissan Sentra CVT 2009, com cotas de R$ 25 cada. No vídeo em que ele anuncia o sorteio, não informa a quantidade de cotas e afirma que ele mesmo coloca os nomes dos participantes em uma urna para então determinar o ganhador. Um Sentra do mesmo ano pode ser adquirido por cerca de R$ 25 mil.

"Quero que participem aqueles que gostam do meu trabalho e confiam em mim. Caso contrário, nem precisa assistir ao vídeo", diz na postagem. Escrevemos para o e-mail informado no canal, porém não recebemos retorno até o momento.

Site Autosorte oferece venda de cotas; dinheiro é transferido diretamente para a conta do "vendedor" Imagem: Reprodução

Existem outros exemplos, como a Autosorte, cuja página no Instagram foi retirada do ar ontem, após contato de UOL Carros, quando acumulava pouco mais de 900 inscritos. O site da empresa continuava ontem ativo, trazendo rifas de carros antigos como um Volkswagen Gol GTI 1989 por mil cotas de R$ 50 - ou R$ 50 mil.

Um GTI pode ser encontrado em classificados por preços entre pouco mais de R$ 30 mil e cerca de R$ 60 mil - porém, esse modelo específico, dependendo do estado de conservação e da originalidade, tem exemplares que já passaram de R$ 100 mil no mercado brasileiro. Também tentamos contato no número de WhatsApp informado pela empresa, que não respondeu.

Sorteio, só para filantropia ou sem venda de cotas

Segundo o Ministério da Economia, ainda que o dinheiro da rifa sirva para bancar projetos de veículos ou seja total ou parcialmente direcionado para caridade, a prática é considerada clandestina e irregular. A legislação permite sorteios e rifas com venda de cotas apenas para instituições filantrópicas e mediante autorização especial - nesse caso, os sorteios devem ser realizados necessariamente via Loteria Federal.

De acordo com o órgão, "a exploração de bingos, loterias e sorteios é atividade ilegal e constitui contravenção penal", além de ser um "serviço público exclusivo da União".

Por meio de nota enviada à reportagem, o ministério diz que, se houver comprovação de prejuízos a qualquer participante, poderá ser configurado ilícito penal ou, "no mínimo", lesão ao consumidor. "A atividade ilegal não contempla quaisquer garantias ao público participante de maneira a prevenir as mais variadas formas de manipulação ou fraudes de resultados", complementa o órgão.

Por sua vez, o advogado Acácio Miranda, mestre em direito penal internacional pela Universidade de Granada (Espanha), vai na mesma linha e diz que rifa, loteria e bingo são considerados jogos de azar - cuja realização é uma exclusividade do governo federal.

"Rifa envolve a venda de números para os participantes concorrerem a um prêmio. Promoção de shopping, por exemplo, é diferente. Trata-se de um incentivo à venda de produtos, no qual não há arrecadação de dinheiro decorrente do sorteio", avalia.

Redes não dizem se conteúdo será removido

Página no Instagram do site de rifas de carros Autosorte saiu ontem do ar após contato da reportagem Imagem: Reprodução

Entramos em contato com o Google, dono do Youtube, com o qual compartilhamos os links de postagens de rifas automotivas e questionamos se elas infringem os termos de uso da plataforma.

"Qualquer usuário que acredite ter encontrado uma violação de nossas políticas pode fazer uma denúncia e nossa equipe fará a análise do vídeo", diz a empresa.

"Quando não há violação à política de uso do produto, a decisão final sobre a necessidade de remoção do conteúdo cabe ao Poder Judiciário, de acordo com o que estabelece o Marco Civil da Internet", complementa.

Também fizemos os mesmos questionamentos ao Facebook e ao Instagram e ambas empresas preferiram não se manifestar.

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