O que você quer ser quando crescer?

Crianças com câncer contam o que pretendem fazer no futuro

Luiza Vidal (texto) e Paulo Borgia (fotos)

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Ainda criança, aprendemos que ficar doente é algo normal: o tão comum resfriado e as viroses estão aí para provar.

Mas, quando somos pequenos, não imaginamos lidar com algo mais grave. O diagnóstico de um câncer nos primeiros anos de vida pode ser assustador, sobretudo para os pais ou cuidadores.

Para além de cirurgias, picadas no braço, quimioterapias e a perda dos cabelos, crianças e adolescentes com câncer brincam, estudam, choram, pensam no futuro (ainda que com muita indecisão) e sonham - principalmente com o dia em que estarão curados.

VivaBem conversou com crianças e adolescentes que são atendidos no Hospital do Graacc, em São Paulo, para saber o que eles pensam sobre o futuro. A pergunta principal foi: "O que você quer ser quando crescer?"

Luísa, 3, quer ser veterinária

Comunicativa e animada, Luisa Neder é o xodozinho da brinquedoteca do Graacc, onde chegou em 2022, já diagnosticada com leucemia linfoide aguda. A menina não para quieta um segundo: brinca e conversa com todo mundo que está ali. Mãe e filha tiveram que deixar Teixeira de Freitas, na Bahia, para iniciar o tratamento em São Paulo.

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Antes, Lulu falava para a mãe, Érica, que queria ser médica quando crescesse. Mas quando perguntamos de novo, a resposta mudou: "Quando estiver curada, vou ser veterinária para cuidar dos bichinhos", contou empolgada. O bicho que ela quer cuidar? Sapos - apesar de sonhar em ter seu próprio cachorrinho de estimação.

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Thayla, 11, quer ser pediatra ou psicóloga

Thayla de Assis adora conversar. Fala bem, é comunicativa e já pensou muito no futuro. "Sempre sonhei em ser médica, mas ainda estou indecisa", diz. A dúvida é em qual área seguir: pediatria ou psicologia.

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"Geralmente, as psicólogas fazem brincadeiras e ficam conversando com as crianças, perguntando se está tudo bem", conta. "Na pediatria é legal porque você cuida de crianças que precisam de ajuda", diz.

Thayla trata um tumor na região do nervo óptico desde março deste ano. A família, que vem para as consultas de Rio das Pedras (SP) até São Paulo com a van da prefeitura, descobriu o câncer depois que a menina apresentou problemas na vista - não enxerga direito mesmo com óculos. No dia da reportagem, ela só conseguia ver alguns vultos.

A parte boa é que, depois da cirurgia e algumas sessões de quimioterapia, Thayla deve ter 80% da visão de volta. Isso é ótimo porque, além de conversar, a menina adora ler livros, como as histórias da "Turma da Mônica Jovem". Outra notícia boa: o tumor praticamente já sumiu.

Joaquim, 8, quer jogar bola

Joaquim Ladeira sentia fortes dores de cabeça entre julho e setembro de 2022, quando descobriu o meduloblastoma, tipo grave de tumor cerebral que afeta principalmente as crianças. O menino fez cirurgia para remoção do tumor e, agora, segue com sessões de quimioterapia no Graacc.

Envergonhado, no dia em que perguntamos o que pensa em ser quando crescer, ele disse que não sabia. Estava cansado, só queria ir logo para casa. Já no dia em que fez poses para o fotógrafo, mudou de ideia: pegou uma bola e começou a jogar futebol. "Sou palmeirense, mas também corintiano."

Lorena, 5, quer ser diretora de escola

Lorena de Jesus tinha febre alta e manchas roxas no corpo. A mãe levou a filha ao médico e, em pouco tempo, descobriu que ela tinha LLA, um dos tipos de leucemia mais comuns na infância. "Foi muito difícil no começo", conta Cleovania, mãe da menina.

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Há mais de 8 meses sendo atendida pelo Graacc, Lorena esperava ansiosa pela alta do hospital. Sobre o futuro, a menina levou um tempo para responder o que queria ser quando crescer. Pensou bem e disse: "Diretora de escola". O motivo é que ela adora a diretora da escola dela.

Breno, 11, quer trabalhar com futebol

Breno Azevedo começou a ter vários sintomas antes de descobrir o linfoma de Hodgkin, tipo de câncer que ataca as células do sistema linfático. O garoto tinha caroços no pescoço, perda de apetite e sudorese noturna. Até o diagnóstico fechar, a mãe dele, Kedma, foi a diversos hospitais, pois todos diziam que "não era nada".

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Breno está em tratamento no Graacc desde o final de 2022. Apaixonado pelo universo do futebol, ele tem vários sonhos: ser jogador, jornalista esportivo ou gamer (de futebol, é claro): "Sabe aqueles gamers, streamers que jogam enquanto falam sobre futebol?", perguntou. "Tipo Casimiro", explica.

Yasmin, 6, quer ser "doutora de animais"

Yasmin Padilha veio de Mato Grosso do Sul para tratar um câncer comum na infância: o tumor de Wilms, que atinge os rins. A garota esperou um ano até receber a tão esperada alta do Graacc.

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Simpática e sorridente, Yasmin quer ser "doutora dos animais": "Quero ser veterinária para cuidar dos animais, dos cachorrinhos, que são fofos, e de qualquer outro animal", conta.

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Ana Clara, 16, quer ser empresária

Ana Clara Fernandes, 16, já passou da metade do tratamento do linfoma de Hodgkin, que envolve seis sessões de quimioterapia, no total. "Já saiu bastante", conta. Diferente das crianças entrevistadas aqui, ela não passa pela brinquedoteca do Graacc.

Quando crescer, quer ser empresária (ainda não sabe de qual área), mas seu sonho de verdade mesmo é conhecer o ídolo: "Tenho vontade de ir ao show do Justin Bieber. Estou esperando ele vir", fala, rindo.

Mais de 400 mil crianças e adolescentes, com idades entre 0 e 19 anos, são diagnosticadas com câncer em todo o mundo, de acordo com a OMS. A doença é uma das principais causas de morte entre crianças e adolescentes globalmente.

Segundo estimativa do Inca, entre 2023 e 2025 ocorrerão, a cada ano, 7.930 novos casos de câncer em crianças e jovens de até 19 anos no Brasil. Em países de alta renda, mais de 80% das crianças com câncer são curadas. No entanto, de acordo com a Opas, nos países de baixa e média renda, o número cai para 20%.

O cenário precisa mudar, pois o impacto do câncer infantil gera anos de vida perdidos, maiores desigualdades e dificuldades econômicas.

Publicado em 17 de agosto de 2023.

Reportagem: Luiza Vidal | Fotos: Paulo Borgia | Edição: Bárbara Paludeti | Design: Guilherme Zamarioli | Direção de arte: René Cardillo e Gisele Pungan