Marcelo Justo/UOL

Para cada objetivo existe um coaching diferente. Mas tamanha oferta pode não atender bem todas as demandas

Qual é o seu sonho? Aumentar seu reconhecimento profissional ou encontrar seu propósito na vida? As respostas para essa pergunta podem ser muitas. Mas independentemente de qual seja o pódio almejado, é fato que grande parte das pessoas carrega consigo uma vontade de conseguir algo que ainda não se tem ou tornar-se alguém que ainda não é.

E querem isso para já! Com o objetivo de alcançar metas de maneira mais rápida e focada, muitas pessoas têm recorrido ao auxílio do coaching. Essa é uma metodologia de autodesenvolvimento, na qual um profissional chamado de coach trabalha em conjunto com o seu cliente, o coachee. O objetivo é contribuir para que o cliente alcance transformações de natureza emocional e comportamental que possibilitem a realização de metas capazes de melhorar seu desempenho tanto em âmbito pessoal quanto profissional.

Hoje vemos coaches focados em diversos segmentos: carreira, vida amorosa, emagrecimento... Tem até coaching de vida! Como vivemos em uma era de imediatismos, quem tem um sonho tem pressa. E os coaches surgem em um contexto de um mundo globalizado, competitivo e conectado, que parece não ter lugar para quem ainda não sabe onde quer chegar.

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Mas afinal, o que os coaches fazem?

De acordo com o livro "Como o coaching funciona" (Editora Qualitymark), escrito por Joseph O´Connor e Andréa Lages, o coaching é uma metodologia que envolve duas pessoas com o intuito de crescer e aprender psicologicamente. Os profissionais trabalham com dinâmicas que visam ajudar pessoas a descobrirem suas forças e maximizarem seus potenciais a fim de alcançarem o que desejam.

Isso começa com um primeiro encontro para conhecer o coachee e saber quais são seus objetivos. O profissional fará perguntas ao entrevistado a fim de identificar seus potenciais, crenças limitantes, bloqueios e dificuldades. Em seguida, o coach vai explicar como funciona o trabalho, que haverá tarefas para o cliente realizar, metas a serem atingidas e feedbacks sobre a performance.

Antes de iniciar o processo coaching, no entanto é necessário que o profissional avalie se o cliente está apto a se submeter a essa dinâmica. "Não são todas as pessoas que estão preparadas para o coaching. Se o indivíduo apresentar sinais de problemas emocionais, estiver em um momento delicado da vida ou não souber lidar bem com feedbacks e pressão, não é indicado que ele passe pelo processo", alerta Flora Victoria, fundadora da SBC (Sociedade Brasileira de Coaching) e presidente da SBCOACHING Training.

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O problema da banalização

Vivemos um período em há uma lógica de competitividade entre os trabalhadores, o que estabelece uma necessidade de aprimoramento das habilidades de cada um. Christian Dunker, psicólogo, psicanalista e professor titular da USP (Universidade de São Paulo) explica que nesse momento (que começou na década de 1970 nos Estados Unidos) houve uma estimulação pela performance e eficiência, na qual quem se destacasse mais obtinha bonificações.

Isso tornou o mercado vantajoso para profissionais que atuavam no desenvolvimento de pessoas. De acordo com Dunker, o coach surge como uma das soluções para essa nova lógica, uma vez que passa a ser entendido que o sucesso ou fracasso de uma pessoa —não apenas em âmbito empresarial, mas como um todo — é responsabilidade do indivíduo. O que é um ponto sensível, pois caso algo não saia como esperado, pode ser um tombo muito grande, acarretando em problemas emocionais.

Com a popularização da profissão de coach, houve um crescimento de pessoas ofertando esse tipo de serviço. No entanto, muitas pessoas têm feito um mau uso da profissão. A questão é que no meio de termos como "mudança de mindset", "seja um campeão" e "mude sua vida agora mesmo" nem sempre é fácil distinguir quais profissionais são confiáveis.

Essa situação é pontuada inclusive pelos profissionais da área. Na pesquisa divulgada pela International Coach Federation em 2016, um dos principais obstáculos para a profissão seria a inserção de indivíduos não qualificados que se apresentam como profissionais de coaching.

Podemos resolver tudo com metas?

A prática do coaching tem como um de seus pilares a realização de um objetivo do cliente. Para alcançá-lo são determinadas diversas metas. Do ponto de vista desses profissionais, isso é algo intrínseco ao ser humano. "É necessário que as pessoas tenham metas. Se não fazemos isso, somos infelizes. A área acadêmica estuda o florescimento humano, no qual para que ele consiga explorar o seu potencial é necessário se engajar em algo e realizar metas", considera Victoria.

Dan Josua, psicólogo, mestre em psicologia clínica pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) e blogueiro do VivaBem, aponta que nem todas as questões podem ser colocadas em metas. "Se eu tenho como objetivo ser um bom pai, em qual momento eu sei que conclui essa tarefa? Acredito que a cada segundo seja possível fazer coisas que me levem a esse objetivo, mas isso é abstrato e não é possível de calcular", explica.

Na visão de Dunker, transformar tudo em prática pode ser potencialmente explosivo, uma vez que o coach não tem embasamento para fazer a crítica do que é subjetivo. "Existem demandas que não podem ser realizadas, porque existe uma função psíquica nelas, elas são importantes para que as pessoas continuem sonhando com elas".

Por outro lado, na visão de Dora Tognolli, membro da SBPSP (Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo), a busca pela realização de objetivos pode justamente mostrar que está difícil atingir as metas e não adoecer. "O coaching tende a trabalhar a pessoa para fora, enquanto psicólogos e psicanalistas trabalham com o autoconhecimento, que leva em conta as complexidades. Além disso, muita vezes, a prática de coaching pode alertar o sujeito de que algo não vai bem dentro dele, e que suas angústias precisam ser escutada e que não se aquietam diante de meros sucessos externos. É comum que o coaching desemboque numa psicoterapia, que propiciará ao sujeito entrar em contato com seu mundo interno", pontua.

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Quando procurar um coach

A busca pelo coaching pode ser feita quando há um objetivo específico, por exemplo, alçar novos desafios dentro da profissão. "Vejo valor na prática quando é aplicada por uma pessoa que entende e tem vasta experiência na cultura organizacional", explica Dunker.

O coaching pode ser feito no momento em que se tem um objetivo que não gere sofrimento. Também pode ser buscado quando se tem uma meta e tem-se igualmente disponibilidade para fazer algumas mudanças na rotina que não prejudiquem o dia a dia. Por exemplo, fazer um coach de carreira ou de estilo de vida quando se tem um período do dia livre para realizar as atividades e refletir a respeito.

A função do coach é focar nos aspectos positivos e nas oportunidades. As questões pessoais devem ser tratadas por um psicólogo ou psiquiatra, mesmo que o coaching seja psicólogo Flora Victoria, coach e fundadora da SBC

E principalmente é possível procurar um coach quando se está disposto a lidar e aprender com as dificuldades. Afinal, pode ser doloroso descobrir que mais do que certezas, ter sonhos traz dúvidas.

Como saber se estou escolhendo um bom coach?

Marcus Baptista, vice-presidente do IFC (International Coaching Federation do Brasil) explica que uma pessoa que quer realizar um coaching precisa pesquisar sobre o histórico do profissional. Não é errado perguntar quantas horas de prática ele tem, bem como em quais instituições ele realizou sua formação.

Um caminho é buscar por profissionais em instituições reconhecidas, como a International Coach Federation e a Sociedade Brasileira de Coaching. Além disso, no momento de realizar a primeira conversa com o coach, é importante tentar entender qual a metodologia que ele trabalha, quais são as metas que você pode realizar.

"Os coaches não são deuses, eles não levam as pessoas onde elas querem. Eles levam onde a pessoa consegue chegar e é papel do indivíduo se responsabilizar por sua história", diz Baptista. Portanto, se o coach vier com soluções prontas e prometendo resultados milagrosos, talvez esse profissional não domine as competências necessárias para realizar esse trabalho.

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