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'Vítima de violência doméstica, fiquei paralítica. Recuperada, serei mãe'

Bruna Marsanovic foi vítima de violência doméstica e nunca quis ser mãe, mas acabou engravidando e não vê a hora de abraçar o filho Imagem: Acervo pessoal

Bruna Marsanovic em depoimento a Rafaela Polo

De Universa, São Paulo

08/05/2022 16h11

"Mesmo antes de me tornar deficiente, após ser arremessada de uma altura de 12 metros pela janela do meu ex, após um espancamento, eu já sabia que não queria ter filhos. Amo crianças, mas é muita responsabilidade, algo que não achava que era para mim.

Mas a vida me mostrou que a gente não manda em nada. No mês da troca do meu contraceptivo, engravidei. Hoje, não vejo a hora de segurar meu filho nos braços.

Em dezembro de 2015, quando eu pedi para terminar o namoro com meu parceiro da época, ele não aceitou. Me espancou até me deixar em coma. Um dos socos na cabeça que tomei foi muito forte, e fiquei desacordada. Não feliz, ele ainda me arremessou de uma altura de 12 metros. Foi isso que me deixou em uma cadeira de rodas.

Ele era uma pessoa violenta, e minha mãe me alertou sobre isso várias vezes. Quando vemos as matérias na TV de mulheres que voltam com seus agressores, sem conseguir se desprender, não entendemos o que elas passam, só quando isso acontece com a gente.

Esses homens conseguem fazer uma manipulação tão grande em nosso psicológico que é surreal. Eles entram em nossa mente de um jeito que não tem explicação e nos fazem sentir culpa por atitudes que eles tiveram.

O meu agressor foi preso um mês após o crime e segue assim. Eu fiquei três meses internada. Os médicos desenganaram a minha mãe, falaram que não tinha mais nada que poderia ser feito, que eu ficaria em estado vegetativo e só estava viva por estar conectada a aparelhos. Mas ela é uma mulher de muita fé. Conversou com o plano espiritual e, aos poucos, fui voltando.

Quando soube que ficaria em uma cadeira de rodas e que havia perdido a mobilidade da minha mão do lado direito, não senti nenhuma revolta ou sentimento ruim. Sou uma mulher de fé e pensei que se Deus tinha um propósito. Nada acontece em vão. Para mim era bola para a frente.

Na reabilitação, conheci outras histórias de pessoas com deficiência. Vi que dava para viver bem e com qualidade de vida na minha cadeira. Nunca questionei Deus ou me lamentei. Não tenho orgulho de como acabei assim, mas tenho muito carinho pela possibilidade de ter voltado para a minha família e de viver em ótimas condições, lúcida e capaz de lutar para dar voz àqueles que não tem. Digo até que tenho uma qualidade de vida melhor hoje do que quando eu andava.

Claro que depois do que aconteceu eu não queria mais ter relacionamentos. Eu ia para baladas, shows, dava uns beijos aqui e ali, fazia minhas coisas na minha intimidade e seguia a vida. Até que conheci uma pessoa que mudou isso. Nós fomos morar juntos, e ele é superparceiro. Tudo deu certo entre nós.

Sempre deixei bem claro para ele que não queria ter filhos. Eu sempre cuidei e me preveni, mas quando fui para a cadeira não pude mais tomar pílula, por causa do risco de trombose. Sempre usei camisinha. Coloquei um implante que tinha duração de três anos, mas, na hora de repor, a ginecologista me falou que as regras tinham mudado e que eu precisaria de um relatório de uma assistente social comprovando minha vulnerabilidade. É um tratamento muito caro que é oferecido pelo SUS [Sistema Único de Saúde], então passou a ter essa exigência.

No mesmo mês em que tirei o implante do braço eu engravidei. Percebi que minha menstruação estava atrasada, mas achei que era por causa da retirada, e estava com umas dores tipo cólicas intestinais. Resolvi comprar um teste bem baratinho só para ver. A linha de gravidez ficou bem fraquinha. Então comprei outro, mais caro. O resultado foi que eu estava com mais de três semanas de gestação.

Tomei um susto. Fiquei pensando: 'E agora?'. Mas, se antes eu não queria filho, hoje em dia não vejo a hora de segurar o Ian, que deve chegar no final de julho. Acabo de completar 28 semanas de gestação.

Bruna Marsanovic está grávida de 28 semanas Imagem: Acervo pessoal

Existem muitos tabus em relação a mulher deficiente física e gravidez. Me perguntam até como eu engravidei. Tenho uma vida sexual ativa, sabe? Não sou menos mulher porque estou na cadeira.

Eu tinha muitas dúvidas. A ginecologista me falou que não tinha nada específico com que eu precisava me preocupar que outras mães também não passavam. Falou sobre as mudanças do corpo e a possibilidade de uma diabetes gestacional.

Meu parceiro ficou muito feliz com a notícia da gestação. Ele beija e abraça a minha barriga, fica conversando com o bebê só para vê-lo chutar. Está no céu porque vai se tornar pai.

Já avisei que quero ter parto normal, porque a minha lesão permite que isso aconteça. Vamos ver como as coisas vão até lá, como o bebê estará, e os exames. Estou muito ansiosa para a chegada do Ian. Só não montei o quarto ainda, porque minha mãe pediu para eu esperar o chá de bebê e não comprar nada repetido."

Bruna Marsanovic, 27 anos, atleta, São Paulo (SP)

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