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"Aborto não passa", diz jornalista que investigou bancada evangélica

2017: deputados federais da bancada evangélica participam de culto em um dos plenários da Camara dos Deputados no Congresso Nacional Imagem: Lalo de Almeida/ Folhapress

Natacha Cortêz

Da Universa

24/05/2018 04h00

Foi em 2015, poucos meses antes do impeachment da presidente Dilma Rousseff, que a jornalista Andrea Dip presenciou seu primeiro culto religioso no Congresso Nacional. Na ocasião, “Eduardo Cunha era a estrela, Bíblia em punho, ao lado de uma famosa cantora gospel e seu marido - um jogador de futebol”, descreve ela nas primeiras páginas do livro-reportagem que lança agora, “Em nome de quem? A bancada evangélica e seu projeto de poder” (ed. Civilização Brasileira).

As pesquisas para a obra começaram mesmo lá atrás, há três anos, quando Andrea escrevia outra reportagem, que investigou os “pastores” do Congresso para a Agência Pública, onde trabalha. Desde aquele culto, ela bateu à porta dos gabinetes de cada um dos deputados e senadores em exercício entre 2015 e 2018, ainda que “nem sempre bem recebida”, visitou igrejas - sobretudo as Neopentecostais -, se encontrou fiéis e conversou com estudiosos especialistas no polêmico casamento “religião e política”. Tudo para tentar responder em nome de quem (ou o que) os representantes religiosos na política trabalham.

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Desde 2015, a jornalista Andrea Dip investiga os representantes evangélicos no Congresso Ncaional Imagem: Arquivo pessoal

Universa: Afinal, o que querem os políticos evangélicos?
Andrea Dip: Não há uma resposta única para essa pergunta, uma verdade absoluta ou um objetivo que seja comum a todos os políticos evangélicos. Mas, a partir da atuação da bancada no Congresso, nos estados e nos municípios do país nas últimas legislaturas, é possível dizer que há um projeto de poder em curso, com eixos bastante marcados. E os políticos evangélicos têm sido atores importantes, quando não, protagonistas.

No livro, você diz que existe relação entre a bancada evangélica e o congelamento de pautas como descriminalização do aborto e direitos LGBTQ. Como se dá essa relação?
Os parlamentares evangélicos estão no Congresso não só como políticos, eles também têm a missão de defender princípios e valores. Por exemplo: a defesa da vida desde a concepção e a noção de que a família tradicional é composta apenas por homem, mulher e filhos. Só entre 2014 e 2017 29 Projetos de Lei contra a diversidade de gênero e direitos LGBTQ estiveram em tramitação no Congresso. Já contra os direitos reprodutivos das mulheres, foram 26. Estamos diante do Congresso mais conservador eleito desde 1964.

Capa de "Em nome de quem?", que pode ser comprado por R$ 34,90 Imagem: Divulgação

Dá para dizer que aborto é um tema evitado entre eles então?
Esse tema não tem discussão, não tem acordo. Aborto é uma pauta que une a bancada evangélica inteira. Ela vai combater a questão sempre que preciso. E mais, eles não só não vão deixar o tema passar como vão escrever Projetos de Lei para retroceder direitos reprodutivos já garantidos.

Além das pautas “morais”, você identificou outros interesses desses políticos que te pareceram perigosos?
Sim. A manutenção de privilégios, como a isenção tributária e concessões de TVs e rádios, por exemplo. São 35 Projetos de Lei, em tramitação entre 2014 e 2017, defendendo benefícios econômicos e fiscais a Igrejas e seus membros.

Quais são os números de Deus no Congresso Nacional? Existe um levantamento que lista esses políticos?
Christina Vital, antropóloga da UFF, diz que existem hoje entre 80 e 90 parlamentares evangélicos vinculados à Frente Parlamentar Evangélica. No livro, cito todos eles e as igrejas às quais eles pertencem. Cito também quem são os deputados da FPE com processo no STF.

Para além das motivações jornalísticas, você teve motivações pessoais para investigar a bancada evangélica?
Pessoalmente, tenho alguma familiaridade com o assunto. Minha família é evangélica. Quer dizer, agora não é mais. Mas por muito tempo a maior parte dos meu parentes foi. Inclusive meus pais. Então até minha adolescência [hoje Andrea tem 36 anos] frequentei a igreja evangélica com eles. Por isso, nada daquilo pra mim era estranho. Os termos, o jeito de pensar as coisas, eu conhecia. Daí já veio muito do meu interesse em investigar os evangélicos na política.

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