Novo normal?

Após fracasso na Liga dos Campeões, Messi e Ronaldo vão se tornar coadjuvantes no futebol mundial?

Do UOL, em São Paulo, Rio e Porto Alegre* Montagem sobre fotos de Nicolò Campo/LightRocket via Getty Images e Manu Fernandez / POOL / AFP

Eles têm praticamente se revezado no topo da lista de melhores jogadores do mundo nos últimos onze anos. A rivalidade que mantêm entre si expandiu os limites conhecidos do esporte. Seus dribles viraram gols, que viraram vitórias, que viraram títulos, que se traduzem em uma hegemonia poucas vezes vista na história dos esportes coletivos. Muitos acham que Lionel Messi é melhor; muitos acham que Cristiano Ronaldo é melhor. Mas todos concordam que os dois atingiram um patamar único, acima dos outros.

É possível agradecer por estar vivendo na mesma época de dois dos maiores jogadores de futebol que já existiram. Uma época em que suas jogadas são filmadas de todos os ângulos possíveis, registradas para a eternidade. Uma época que, talvez, tenha chegado ao fim.

A Liga dos Campeões que acabou ontem (23), com um avassalador Bayern de Munique campeão após vitória sobre o PSG, foi a primeira desde 2005 sem Cristiano nem Messi ao menos nas semifinais. Os quatro gols de Ronaldo e os três de Messi os deixaram pela primeira vez em doze anos longe do topo da artilharia do torneio. Suas estatísticas individuais pioraram, e o fracasso coletivo na Champions levou os dois a repensarem onde e como passarão os últimos anos de suas carreiras.

Enquanto Messi e Ronaldo buscam uma reinvenção, outros nomes nomes disputam o protagonismo dos novos tempos. Mesmo sem a taça da Champions, Neymar e Mbappé lideram a corrida, além de jovens como Haaland e Vinícius Jr, são candidatos a dominantes da nova era. Pela primeira vez em muito tempo, o português e o argentino entram como azarões na eleição de melhor do mundo da Fifa deste ano. A enorme possibilidade de não levarem o troféu reforça o sinal do fim do reinado da dupla.

Montagem sobre fotos de Nicolò Campo/LightRocket via Getty Images e Manu Fernandez / POOL / AFP
Valerio Pennicino

Estão muito acima de "meros mortais", mas produção caiu

O debate se a dupla de extraterrestres ainda está em nível alto só existe porque eles mesmos elevaram, e muito, o nível de exigência. Messi, por exemplo, balançou as redes 31 vezes e teve sua pior temporada como artilheiro desde 2007/08, quando anotou 16 gols.

O mesmo havia acontecido com Cristiano Ronaldo no ano passado, quando anotou 28 gols e teve a pior marca desde 2008/09, quando fez 26. A temporada 2018/2019 foi a primeira do português em seu novo clube, a Juventus. O período de adaptação cobrou um preço e, depois dele, o craque já conseguiu voltar a ter números mais expressivos.

Mesmo assim, em comparação com o histórico deles mesmos, a situação está bem diferente. E essa é justamente a brecha que os demais concorrentes estavam esperando por muitos anos. É possível estourar a bolha Messi-Ronaldo e agarrar o troféu de melhor do mundo? Modric mostrou em 2018 que o sonho pode ser real.

Alguns jogadores estão no páreo e têm números até melhores que a dupla. É o caso de Lewandowski, que soma 55 gols na temporada. Com o cancelamento do Campeonato Francês, Neymar e Mbappé ficam atrás em termos de quantidade, mas têm média de participações em gols altíssima e são fortes candidatos

UEFA/Handout via Xinhua

Temporada de vacas magras e quase em branco

Acostumados a disputar (e ganhar) títulos, Messi e Cristiano Ronaldo foram mais econômicos na temporada recém-encerrada. O argentino passou em branco pela primeira vez desde 2014. Desde que estreou pelo Barcelona, Messi já ergueu 34 troféus, com média de mais de dois por temporada.

Cristiano Ronaldo até deu volta olímpica na temporada, ao ser campeão do Italiano, mas viveu uma situação atípica em relação às últimas quatro temporadas, período em que foi campeão dez vezes — o português soma 30 títulos por clubes na carreira.

REUTERS/Massimo Pinca

Queda dá início a rumores sobre futuro

Para Messi, a queda nas quartas de final da Champions veio junto com uma goleada acachapante. Além de ser a pior derrota da história do Barcelona, o 8 a 2 para o Bayern pode ter dado início a uma profunda reformulação no clube, com a possível saída de medalhões como o capitão Gerard Piqué.

Uma frustração semelhante se abateu sobre Ronaldo depois que a Juventus foi eliminada pelo Lyon, ainda nas oitavas da Champions. Nem mesmo seus dois gols foram capazes de reverter a derrota dentro de casa sofrida ainda antes da pandemia.

As eliminações precoces deram início a uma série de rumores sobre o futuro da dupla. De acordo com a imprensa espanhola, há quem diga que argentino não pretende seguir com seu contrato, válido até 2021, e já procura um novo clube. Ainda não há informação consolidada sobre o futuro de Messi.

O novo técnico Ronald Koeman teve uma reunião com o argentino para passar seu projeto. O Barcelona entende que ele será o pilar da nova equipe. Phillipe Coutinho, emprestado ao Bayern, pode retornar à Catalunha, e Lautaro Martinez pode ser contratado.

Cristiano Ronaldo, por outro lado, tem contrato com a Juventus até o fim de 2022 e não há nenhum sinal de ruptura, pelo contrário. A Juventus segue apostando no português e fará uma reestruturação com a chegada do novo técnico Andrea Pirlo. Matuidi já deixou o elenco e deve puxar outros nomes como Khedira e Higuaín. A ideia é ser uma potencia mundial e não apenas na Itália.

Mesmo que não mudem de camisa, Messi e Ronaldo precisarão de um projeto mais competitivo, que lhes permita a chance de conquistar a Europa outra vez. Seria uma forma de voltar a se aproximar da "orelhuda". Com os títulos do Liverpool em 2019 e Bayern neste ano, a Champions chegou a um hiato de dois anos sem ser conquistada por Messi ou Ronaldo. Isso só tinha acontecido antes nos títulos de 2012 (Chelsea) e 2013 (Bayern).

Ivan Sekretarev/AP

Dupla não tem mais seus bons companheiros

Desde que despontaram, Messi e Cristiano sempre estiveram rodeados de talentos, companheiros cujas parcerias fizeram seu futebol florescer. As quatro taças da Champions que Messi levantou só foram possíveis graças à inspiração de profissionais como Xavi, Iniesta, Neymar, Daniel Alves e Pep Guardiola, só para citar alguns que não atuam mais ao lado do argentino.

No Barcelona dos últimos dois anos, a renovação não veio. A incapacidade de reagir diante de um adversário mais qualificado ficou clara ainda no intervalo da derrota para o Bayern, quando Messi foi visto desolado no vestiário.

A mesma solidão criativa vive Cristiano, que sempre foi capaz de tabelar com parceiros de alto nível, como Marcelo, Modric, Casemiro Kroos, além de ter conquistados três títulos da Champions sob o comando de Zinedine Zidane. Na Juventus, o nível dos companheiros e o desempenho coletivo caíram. Aos 35 anos, mesmo brilhando em momentos cruciais, o português não conseguiu conduzir o time para voos maiores.

Reuters/John Sibley Reuters/John Sibley

Rafael Oliveira: "Messi ainda é o melhor do mundo e da geração"

"Vejo a mudança mais como consequência da transformação do prêmio da Fifa, que deixou de ser uma avaliação individual e passou a ser consequência de títulos conquistados. De forma geral, ainda considero Messi o melhor do mundo e da geração. E Cristiano Ronaldo segue tendo números impressionantes como uma máquina de resolver partidas. O que mudou recentemente foi a relação de forças entre os clubes, com um cenário mais aberto na Champions, que condiciona a premiação e chegou a ter seis títulos de Real Madrid e Barcelona no espaço de oito anos.

A questão de justiça depende muito da avaliação dos critérios. Baseado nos critérios recentes (que visam recompensar destaques entre os principais campeões), tende a seguir a lógica. O voto em Modric em 2018 teve mais a ver com o fator cansaço da polarização. Tanto que forçaram a barra encontrando um símbolo duplo (Champions e Copa do Mundo de 2018). Dentro dos critérios, me parece que 2020 terá uma escolha mais justa e feliz que 2018. Mas discuto o caminho de tais prêmios. Só a sensação de que o vencedor depende do campeão da Champions já estabelece uma relação de causa e efeito que foge do princípio de avaliação da temporada. Transforma em algo mais frio e objetivo. Em um ano atípico como 2020, até tudo bem. Não me agrada como conceito, mas não será injusto."

Rafael Oliveira é colunista do UOL Esporte.

Rafael Reis: "Nem as esposas dariam o prêmio de melhor do mundo a eles"

"Messi e Cristiano Ronaldo são os melhores jogadores de futebol do século e, provavelmente, continuarão sendo ainda por muito tempo. Eles ainda são os jogadores de maior potencial em atividade. Mas, por causa do peso da idade, já não conseguem mais atingir nem 80% do que são capazes com uma boa frequência. Quando flertam com suas melhores formas, chegam a um nível que os outros não conseguem atingir. Mas isso é cada vez mais raro. Por isso, estão virando 'mortais' nessas premiações.

Desta vez, nem as esposas e os filhos de Messi e Cristiano Ronaldo teriam a cara de pau de dar o prêmio de melhor do mundo para algum deles. Por tudo que aconteceu ao longo da temporada, eles ficaram alguns degraus abaixo dos principais candidatos a vencer a eleição da Fifa. O cenário é bem diferente de 2018, quando, pela Liga dos Campeões que fez, CR7 poderia (e talvez até deveria) ter desbancado Modric. Mas isso não significa que o mundo do futebol tenha cansado deles. Ainda que a idade pese, se eles voltarem a ser os 'melhores do ano', podem sim ainda engrandecer seus troféus de melhores do planeta."

Rafael Reis é colunista do UOL Esporte.

Julio Gomes: "Acabou a era Messi-Cristiano Ronaldo"

Como não poderia deixar de ser, os dois já entraram há alguns anos na fase descendente da carreira. Como são excepcionais, dos melhores da história, seguem fazendo muita coisa importante, muitos gols etc. Mas muito longe de ainda serem indiscutivelmente os melhores. Hoje, já há jogadores mais novos que mostram mais capacidade física para decidir, além de muita técnica. Acabou a era Messi-Cristiano Ronaldo. Pode haver algum repique de algum deles, mas o domínio acabou.

Messi e Cristiano ganharam algum prêmio a mais do que deveriam pelo nome que carregam e o domínio que criaram. Em 2010, teve gente com temporada mais relevante que a de Messi. Em 2013, o mesmo serve para CR7. A partir de 2018, começa a ficar claro que a diferença deles para o resto estava diminuindo. Acho que a escolha de Modric foi exagerada, mas poderia ter sido Griezmann. Em 2019, Van Dijk. Em 2020, já fica claro que eles não são mais os dois melhores. Não acho que o futebol tenha cansado deles, apenas que a fila, um dia, ia ter que andar.

Julio Gomrs é colunista do UOL Esporte.

Quem pode tirar o reinado de Messi e Cristiano

  • Mason Greenwood (18 anos)

    Promessa do Manchester United, Mason Greenwood viveu uma temporada de afirmação. No segundo ano aproveitado pelo técnico Ole Gunnar Solskjaer, virou titular do time e disputou 49 jogos, marcando 17 gols. Rápido, habilidoso e com faro do gol, tem tudo para seguir crescendo e postular coisas grandes na carreira.

    Imagem: Divulgação/Site oficial do Manchester United
  • Erling Haaland (20 anos)

    Haaland em ação parece ter mais do que 20 anos. O centroavante é dono de uma tranquilidade fora do comum na frente do gol rival. Com muita força e um poder de conclusão impressionante, despontou nesta temporada. Começou pelo RB Salzburg, pelo qual marcou 28 gols em 22 jogos, e não se assustou ao assumir o comando de ataque do Borussia Dortmund, marcando 16 gols em 18 partidas.

    Imagem: Chris Brunskill/Fantasista/Getty Images
  • Vinícius Júnior (20 anos)

    Vinícius Júnior ocupou rapidamente espaço relevante no Real Madrid. Virou titular do time, chegou a colocar Hazard no banco, e depois atuar junto com ele na linha de frente, abastecendo Benzema. A já conhecida habilidade combinada com mais força física e velocidade o colocaram como destaque já neste momento, e com uma projeção de futuro ainda melhor. Foram 38 jogos e cinco gols na temporada.

    Imagem: JOHN THYS / AFP
  • Ansu Fati (17 anos)

    Ansu Fati está em sua primeira temporada no principal do Barcelona. Mas já foi o suficiente para gerar grande expectativa. Os bons jogos o fizeram passar na frente de Dembélé -- que se recuperou de lesão -- e Griezzmann na disputa por vaga no time. Primeira opção na equipe que não terminou bem a temporada, ele fez oito gols em 33 jogos e deixou sentimento de que pode ter voos maiores em breve.

    Imagem: PAU BARRENA / AFP
  • Phil Foden (20 anos)

    Queridinho de Guardiola no meio-campo do Manchester City, Foden ganhou espaço e se candidatou a ser um dos principais atletas do futuro. O armador dinâmico pode atuar aberto ou centralizado e tem capacidade de drible, criação e construção na mesma medida. Adepto do jogo coletivo, marcou oito gols em 38 jogos nesta temporada.

    Imagem: Matt McNulty/Manchester City FC via Getty Images
  • Jadon Sancho (20 anos)

    Sancho já é realidade. Entre todos os jovens que lutam para disputar o posto de Messi e Cristiano no futuro, o inglês do Borussia Dortmund talvez seja o mais pronto. Atacante de lado de campo, rápido e driblador, ele marcou 22 gols em 40 jogos. No fim da temporada passou por alguns problemas e foi cobrado pelo comportamento fora de campo.

    Imagem: Joachim Bywaletz/Xinhua
  • João Félix (20 anos)

    Pode se dizer que João Félix é promessa há mais tempo. Em julho do ano passado, quebrou recordes de valor de transferência ao ser contratado pelo Atlético de Madri por 126 milhões de euros (R$ 830,6 milhões na cotação atual). Mas a primeira temporada na Espanha não foi exatamente a melhor. Com apenas nove gols em 36 partidas ele busca recuperar status.

    Imagem: Julian Finney - UEFA
  • Rodrygo (19 anos)

    Companheiro de Vinícius Júnior no Real Madrid, Rodrygo também carrega a mesma quantia de esperança de ser um dos melhores do mundo no futuro. A exemplo do colega que passou pelo Flamengo, o ex-santista prima pela qualidade técnica e habilidade. É rápido e inteligente para concluir jogadas e procurar companheiros. Pelo time principal, disputou 26 jogos e marcou sete gols.

    Imagem: Europa Press Sports/Europa Press via Getty Images
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