Topo

Estádio vazio, silêncio ensurdecedor nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020

O Coliseu de Los Angeles, nas Olimpíadas-1984: acústica perfeita Imagem: David Madison/Getty Images

Denise Mirás

Colaboração para o UOL, em São Paulo

31/07/2021 04h00

O atletismo é considerado a alma dos Jogos Olímpicos. Por isso, parece que assistimos a um filme, ao olhar pela tevê as arquibancadas completamente vazias do Estádio Nacional de Tóquio. No cinema, seria um filme pós-catástrofe; na vida real, seguimos em meio à catástrofe. Colocaram até uns salpicados de colorido nas cadeiras, numa tentativa - talvez - de disfarçar a falta das pessoas. A esse vazio visual se soma o silêncio. Tudo ao contrário. Os Jogos de Tóquio-2020 ficaram sem alma, então? A alegria virou do avesso. Dá tristeza de olhar.

Ainda bem que as câmeras estão absurdamente poderosas. Há muito tempo deixaram o limite do close, para mostrar até pontos de cirurgias. Pingos de chuva. E a emoção esquadrinhada dos atletas também ninguém tira. Seja pela vitória ou pela derrota, sentimos com eles.

Relacionadas

Saudades das aglomerações

Mas estádio lotado de atletismo arrepia até antes das provas começarem. A chegada das multidões e barulhentas, famílias inteiras, torcidas uniformizadas orgulhosas de símbolos de seus países, os lugares sendo ocupados aos poucos. É um pré-espetáculo. No Rio-2016, apareceram fantasias, blocos de carnaval, passistas, barulho de batuque, cantoria, gritaria e burburinho. Muita gente embalada por cervejinhas e uns quitutes caprichados comprados nas casas do entorno, gringos lambuzados com churrasquinhos e pasteis, gingando sem querer com pernas trocadas pelas caipirinhas.

O canadense Ben Johnson nos Jogos Olímpicos de Seul-1988, nos 100m livre Imagem: Mike Powell/Getty Images

Los Angeles-1984 revelou uma santa ingenuidade dos norte-americanos. Já na cerimônia de abertura havia revista contra possíveis terroristas, mas os seguranças nem prestavam atenção nos cadeirantes e acompanhantes. Depois, nos dias de atletismo, conseguiam reter mochilas e pastinhas tipo "007" (que ainda existiam...) num amontoado à frente dos portões, mas nem imaginavam pessoas entrando pelo ginásio de boxe, onde não havia a tal revista e dava direto para dentro do atletismo.

Mas aquele Coliseu de Los Angeles, que já havia sido usado nas Olimpíadas-1932, guardava uma recepção extraordinária para os brasileiros. Joaquim Cruz, na prova dos 80m (duas voltas na pista), era acompanhado por um som de espanto que vinha das arquibancadas. A acústica do estádio fez a prova ficar mais linda, como se as passadas do meio-fundista fossem acompanhadas de uma trilha sonora em estéreo gigantesco, até o ouro e a bandeirinha brasileira enfiada na mão do vencedor, conforme o combinado, pelo vizinho de prédio.

Para cima, para o alto

Para se chegar ao Estádio Olímpico de Montjuic, de Barcelona-1992, no alto do morro, era preciso atravessar multidões. Na rua, nos táxis, os catalães sabiam de tudo, comentavam tudo de cada prova e cada atleta das provas, quando o atletismo começo. A subida era ladeada por um show de chafarizes em jogos de luz, com música clássica. O estádio mesmo, coloridíssimo, agitadíssimo retratava o clima de todo que foram essas Olimpíadas.

Se o Coliseu de Los Angeles tinha uma acústica incrível, o Estádio Olímpico de Londres-2012 era incrível por sua visibilidade, mesmo com pouca angulação das arquibancadas ao contrário - quase "deitadas". Por onde se andasse, rodando pelas fileiras ou subindo e descendo degraus, a visão para as provas era extraordinária (buscando o nome do arquiteto... são dois: Rod Sheard e Philip Johnson).

E quando um estádio inteiro está lá para acompanhar superestrelas, como Usain Bolt em sua despedida no Rio-2016, e Ben Johnson - depois banido por doping, como foi em Seul-88? Estádio lotadaço! Parte da boa história dessa prova dos 100m eu conto: atravessei uma janelinha que dava para o fosso dos fotógrafos e vi a prova do rés do chão, com as passadas do canadense no nível dos meus olhos, olhando para trás antes da linha de chegada, milênios à frente dos outros. Depois conto por que fui parar lá.

O queniano Eliud Kipchoge, no Estádio lotado com o atletismo, nos Jogos do Rio-2016 Imagem: Matthias Hangst/Getty Images

Comunicar erro

Comunique à Redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

Estádio vazio, silêncio ensurdecedor nos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 - UOL

Obs: Link e título da página são enviados automaticamente ao UOL

Ao prosseguir você concorda com nossa Política de Privacidade


Olimpíadas 2020