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Ele pôs Bale para jogar com uma perna só. E moldou o maior ídolo de Gales

Paula Almeida

Do UOL, em Londres (ING)

16/10/2015 06h00

“Aqui em Gales, nós gostamos mais de rúgbi. Mas por causa do Bale, hoje o estádio lota para ver a seleção de futebol”. Quase sempre, as palavras de um taxista traduzem bem o sentimento de uma cidade ou até de um país. Esse não é diferente. O motorista em Cardiff é um dos fãs do atacante do Real Madrid, o grande ídolo atual do pequeno país britânico. “Ele é um jogador espetacular”.

Embora o altíssimo valor de sua transferência do Tottenham para o Real Madrid nunca tenha sido compreendido, Bale é venerado pelos galeses. A admiração pelo jogador, que já vinha desde os tempos de Southampton e que só foi ameaçada quando ele se dispôs a defender o Reino Unido na Olimpíada de Londres-2012, chegou ao ápice nesta semana, quando Bale conduziu Gales à classificação para a Eurocopa 2016.

Provavelmente, porém, tanto sucesso não seria possível se não fosse por um professor de educação física dos tempos de estudante na Whitchurch High School: Gwyn Morris.

“O sinal tocou, entrem nas salas de aula”, grita ele com sua voz potente. Em seguida, vem um sorriso afetuoso e um elogio sussurrado apontado a um dos alunos. “Aquele é um excelente jogador de futebol. Foi procurado por um clube, mas o negócio não deu certo por causa do tipo físico dele”. O carinho disfarçado de rigidez e amparado pela disciplina é a marca de Morris, que hoje coordena o departamento de esportes da escola e que direcionou os caminhos de Bale e outros futuros atletas profissionais do país.

“Eles tinham dedicação, comprometimento e atitude, e eu acho que essas são as três coisas mais importantes que se deve ter em qualquer esporte. Eles estabeleceram objetivos bem altos, e eles sabiam que só alcançariam ainda jovens se eles se sacrificassem”, lembra Morris, que chegou a proibir Bale de chutar e lançar com a perna esquerda em algumas atividades para obrigá-lo a exercitar a direita, mais fraca.

“Vou te dar um cenário diferente. Você tem um jogador de tênis que tem um ótimo forehand, mas tem um péssimo backhand. Você vai ter que melhorar o backhand. É o mesmo princípio, é o que fazemos todos os dias das semanas. Você precisa manter as suas qualidades, melhorar os seus defeitos”, explica o professor. “Então, é verdade, mas pelo menos assim ele deixava outras pessoas tocarem na bola”, completa Morris, aos risos, referindo-se à superioridade de Bale em relação aos companheiros da época.

Craque juvenil de futebol, o camisa 11 do Real Madrid também era bom em outras modalidades, sobretudo o atletismo. A forma como utilizava todos os esportes para moldar da melhor maneira sua forma física ainda serve de exemplo para os novos alunos da Whitchurch. Mas nem todas as suas habilidades levavam alguma vantagem na hora de dobrar Morris. O professor só abriu exceção para Bale uma vez.

“Lembro de uma vez em que o Gareth veio se desculpar comigo e disse que não poderia participar de um jogo pela escola. Nós tínhamos um jogo naquele fim de semana. Ele sempre jogava, mas naquele disse que não poderia. Perguntei por quê, e ele respondeu ‘Tenho um jogo pelo Southampton, é a final juvenil da Copa da Liga Inglesa’. É um torneio de jovens do qual o Beckham já foi campeão com o Manchester United. Então eu permiti que ele faltasse ao jogo da escola naquele dia, mas foi excepcionalmente”.

Apesar da fama multiplicada e da distância por morar na Espanha, Bale ainda comparece a eventos na Whitchurch quando solicitado. Da última vez, empolgou os alunos ao levar camisas do Real Madrid e lembrar dos tempos de garoto. Mas é outro grande ídolo do esporte de Gales que mantém as raízes fincadas em Cardiff e na tradicional escola do bairro: Sam Warburton.

O capitão da seleção galesa de rúgbi fez parte da mesma turma de Bale. Eram amigos e compartilhavam entre eles duas características: o dom para esportes e o jeito calado.

“Eles faziam parte de um grupo muito bom de jovens, por volta dos 13 anos. Um grupo de diferentes esportes de onde saíram quatro atletas que depois fizeram parte de seleções. Era um grupo de jovens muito talentosos, e eu tenho orgulho de todos eles”, diz Morris. “E é fantástico quando você vê jogadores desse nível levarem Gales à Eurocopa de futebol e às quartas de final da Copa do Mundo de rúgbi”.

Gwyn Morris fala com mais propriedade sobre Sam. O antigo pupilo é hoje um amigo com quem debate sobre rúgbi, esporte do qual o professor também é árbitro - inclusive participará do jogo entre Irlanda e Argentina pelas quartas de final da Copa do Mundo. E ele lembra com bom humor da vez em que deixou um jogador de seleção no banco de reservas.

“Sam certa vez foi capitão do time de Gales na Copa do Mundo sub-19. E quando voltou, nós tínhamos uma final de campeonato na escola, e nós o deixamos no banco de reservas. Ele não ficou nervoso, não ficou zangado, porque ele sabia que jogar pela escola era diferente de jogar pela seleção”, explica. “Aí ele entrou para os 20 minutos finais. E fez um ótimo trabalho”.

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